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A proibição do fishing no marketing de conteúdos jurídicos. Provimento 205/21

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Atualizado às 08:35

Conforme nossos escritos, a OAB avançou muito no tema publicidade e marketing jurídico na advocacia, principalmente com a entrada em vigor do Provimento 205/21, conforme bem demonstrado no artigo conjunto "Marketing jurídico e o processo disciplinar na OAB", escrito com a advogada especialista na matéria Professora Juliana Pacheco (clique aqui para ler).

O provimento é estruturado a partir do artigo 2º, que conceitua diversos termos inseridos pela norma no ordenamento jurídico do sistema OAB:

"Art. 2º Para fins deste provimento devem ser observados os seguintes conceitos:

I - Marketing jurídico: Especialização do marketing destinada aos profissionais da área jurídica, consistente na utilização de estratégias planejadas para alcançar objetivos do exercício da advocacia;

II - Marketing de conteúdos jurídicos: estratégia de marketing que se utiliza da criação e da divulgação de conteúdos jurídicos, disponibilizados por meio de ferramentas de comunicação, voltada para informar o público e para a consolidação profissional do(a) advogado(a) ou escritório de advocacia;

III - Publicidade: meio pelo qual se tornam públicas as informações a respeito de pessoas, ideias, serviços ou produtos, utilizando os meios de comunicação disponíveis, desde que não vedados pelo Código de Ética e Disciplina da Advocacia;

IV - Publicidade profissional: meio utilizado para tornar pública as informações atinentes ao exercício profissional, bem como os dados do perfil da pessoa física ou jurídica inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, utilizando os meios de comunicação disponíveis, desde que não vedados pelo Código de Ética e Disciplina da Advocacia;

V - Publicidade de conteúdos jurídicos: divulgação destinada a levar ao conhecimento do público conteúdos jurídicos;

VI - Publicidade ativa: divulgação capaz de atingir número indeterminado de pessoas, mesmo que elas não tenham buscado informações acerca do anunciante ou dos temas anunciados;

VII - Publicidade passiva: divulgação capaz de atingir somente público certo que tenha buscado informações acerca do anunciante ou dos temas anunciados, bem como por aqueles que concordem previamente com o recebimento do anúncio;

VIII - Captação de clientela: para fins deste provimento, é a utilização de mecanismos de marketing que, de forma ativa, independentemente do resultado obtido, se destinam a angariar clientes pela indução à contratação dos serviços ou estímulo do litígio, sem prejuízo do estabelecido no Código de Ética e Disciplina e regramentos próprios.

Após realizar a classificação acima, a norma passa a descrever o que é permitido ou proibido à advocacia, exatamente à luz desses novos conceitos.

O artigo 4º, foco do presente estudo, trata da hipótese do artigo 2º, inciso II, ou seja, o marketing de conteúdos jurídicos, que poderá ser realizado com as seguintes balizas: "poderá ser utilizada a publicidade ativa ou passiva, desde que não esteja incutida a mercantilização, a captação de clientela ou o emprego excessivo de recursos financeiros, sendo admitida a utilização de anúncios, pagos ou não, nos meios de comunicação, exceto nos meios vedados pelo art. 40 do Código de Ética e Disciplina e desde que respeitados os limites impostos pelo inciso V do mesmo artigo e pelo Anexo Único deste provimento".

Ao final, o Provimento contém seu anexo único, que dispõe que a criação de conteúdos deve "ser orientada pelo caráter técnico informativo, sem divulgação de resultados concretos obtidos, clientes, valores ou gratuidade".

A fusão das normas permissivas acima leva o exegeta à seguinte conclusão: é possível ao advogado se utilizar do marketing de conteúdos jurídicos via da divulgação em ferramentas de comunicação - preponderantemente na atualidade pelas redes sociais - desde que tal estratégia seja voltada para informar o público e para sua consolidação profissional ou de seu escritório, ou seja, não há, em absoluto, qualquer traço de angariamento ou captação de clientes. É ato de construção de autoridade e nada mais.

Esse ato de marketing de conteúdos jurídicos via de publicidade ativa ou passiva, poderá ser realizado até mesmo com anúncios pagos, todavia, não poderão esses conteúdos conter nem mesmo de forma subliminar a intenção de mercantilização do trabalho ou captação de clientela, vedados também a divulgação de resultados obtidos, clientes, valores ou gratuidade.

Pois bem, inarredável assumir que a inserção no micro ordenamento jurídico do sistema OAB de norma legal com tamanha riqueza de conteúdos e novos conceitos, teve como consequência direta o surgimento de novas interpretações decorrentes da hermenêutica jurídica, inclusive com o nascimento de novos conceitos, que vão além daqueles inseridos no próprio Provimento.

Nesse sentido, nasce aqui o conceito de fishing, que é exatamente a conduta do advogado que, na exploração do marketing de conteúdos jurídicos, extravasa os limites permissivos da norma para praticar, ainda que de forma dissimulada, ato de captação de clientela.

Esse ato, embora discreto, dissimulado e proibido pela norma, tem sido recorrente nas redes sociais e quase sempre realizado sobre o mesmo molde, ou seja, o(a) advogado(a) expõe o tema jurídico de interesse comum e, ao final, oferta seus serviços para atrair o potencial cliente com uma frase discretamente colocada: " ­- quer saber mais sobre o assunto? Entre em contado que iremos ajudá-lo", ou algo análogo.

Vale anotar que em momento algum o Provimento n.º 205/2021 ou o Código de Ética e Disciplina autorizam referida conduta, que é sim uma forma discreta de atrair o potencial cliente, de chamar sua atenção, ou seja, inequivocamente o ato tem o interesse de "fisgar" a atenção do potencial cliente, atraindo-o à esfera de atuação do profissional, ou seja, é ato de captação de clientela, expressamente proibido por todas as normas que regulam a matéria.

Nesse sentido, o próprio Provimento conceitua em seu artigo 2º, inciso VIII a captação de clientela, destacando ser aquela prática destinada a atrair clientes pela indução à contratação dos serviços. O conceito é aberto e genérico, exatamente porque o legislador administrativo tinha como escopo tornar a norma ampla para comportar toda e qualquer conduta com tal finalidade, ainda que velada ou dissimulada.

Da mesma forma, o artigo 39 do novo Código de Ética e Disciplina, a recente Resolução 02/15, proclama: "A publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão."

De forma idêntica, prevê o artigo 34, inciso IV da Lei Federal 8.906/94, tratar-se de falta disciplinar o ato de "angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros".

Em conclusão, muito embora o Provimento 205/21 seja elogiosa norma de auxílio à advocacia nesses tempos difíceis da explosão do número de advogados no país, assim como tenha caráter permissivo, não alterou em definitivo a reprovação de qualquer prática - ainda que dissimulada - de captação de clientela, aí incluído o fishing.

Aliás, contrariamente, o Provimento faz questão de ratificar expressamente essa proibição, reforçando conceitos que já faziam parte da Lei 8.906/94 e do Código de Ética e Disciplina da OAB. 

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