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Dano moral e ingestão de corpo estranho

terça-feira, 16 de novembro de 2021

Atualizado às 09:01

A Emenda Constitucional 64/10, acrescentou ao art. 6º da Constituição Federal o direito humano à alimentação adequada (DHAA), já contemplado no art. 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

Em linhas gerais, o DHAA deve ser entendido como a garantia fundamental do indivíduo à alimentação saudável, de qualidade, em quantidade satisfatória, de maneira perdurável e assídua e sustentável, compreendendo o que se entende por segurança alimentar e nutricional.

No âmbito infraconstitucional, o DHAA é regulado pela lei 11.346/06, que criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, dispondo que "a alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população" (art. 2º, caput)  e "a segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis" (art. 3º).

Na seara do Direito do Consumidor, a sistemática trazida pelo CDC também preconiza o respeito ao DHAA, uma vez que protege o consumidor contra produtos que coloquem em risco sua segurança e, consequentemente, sua vida, saúde, integridade física e psíquica (art. 6º, I e 8º, caput) e atribui ao fornecedor a responsabilidade objetiva, ou seja, independentemente de dolo ou culpa, pela reparação dos danos causados ao consumidor pelo defeito do produto que não oferece a segurança que dele se espera (art. 12, caput e § 1º, II).

A violação ao DHAA nas relações de consumo, verifica-se, comumente, pela presença de corpo estranho em produtos alimentícios. Inegável, no caso, a violação aos direitos básicos do consumidor à segurança, saúde e vida e a configuração de responsabilidade do fornecedor pela reparação dos danos causados. A controvérsia da temática residia na necessidade de efetiva ingestão do corpo estranho para a caracterização do dano moral.

Isso porque havia divergência de entendimento entre a Terceira e a Quarta Turma do STJ. Esta última restringe o cabimento da compensação por dano moral ao consumidor apenas nos casos em que o corpo estranho tenha sido efetivamente ingerido.

Por maioria de votos, ao julgar o Resp 1.899.304-SP1, a Segunda Seção do Superior Tribunal pacificou o entendimento no sentido de que: "Em ambas as hipóteses, afinal, está presente a situação de insalubridade oferecedora de risco à saúde ou à integridade física e psíquica do consumidor, apenas variando, em uma e outra, o grau de risco a que exposto o indivíduo, risco esse que, inclusive, pode vir a se materializar e agravar, ainda mais, o dano sofrido pelo consumidor". Ou seja, o dano moral é devido ao consumidor independentemente de sua ingestão, sendo-a relevante apenas para fins de quantificação do valor da indenização.

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1 STJ - REsp: 1899304 SP 2020/0260682-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 25/08/2021, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 04/10/2021