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Conversa Constitucional nº 3

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Atualizado às 08:09

Opinião: O fim do poder e a atuação judicial

Os fatos recentes da política brasileira mostram a marca desse século: o fim do poder; não em sua essência, mas na forma pela qual ele é exercido. Em março, o juiz Federal Itagiba Catta Preta suspendeu a nomeação do ex-presidente Lula para a Casa Civil. Um advogado havia feito o pedido numa ação popular. Em seguida, a juíza Federal Solange Salgado suspendeu o decreto presidencial de nomeação, para o Ministério da Justiça, de Wellington César. Dessa vez, foi um deputado Federal quem havia ajuizado a ação popular. O substituto, Eugênio Aragão, subprocurador-Geral da República, não teve melhor sorte. A juíza Federal Luciana Raquel, atendendo ao pedido feito por um cidadão em mais uma ação popular, suspendeu sua nomeação. É uma tendência. O intelectual venezuelano radicado nos Estados Unidos, Moisés Naím, em sua obra O Fim do Poder (Leya), recorda que "desde a eclosão da crise de 2008, aumentou o número de governos derrubados, gabinetes desfeitos, coalizões desgarradas, ministros demitidos e chefes de partido antes intocáveis que de repente viram-se forçados a renunciar" (p. 44). Na Tailândia, ao final de 2008, a Corte Constitucional dissolveu o partido que governava e que fora acusado de fraude eleitoral. Isso pôs fim à agitação popular e abriu espaço para um governo de coalizão. No Brasil, o pluralismo político, um dos fundamentos da República (art. 1º, V), abraça o pluripartidarismo (art. 17), resultando nos 35 partidos registrados no TSE. Tamanha complexidade também é vista na Índia, um gigante que, nas eleições de 2009, viu as cadeiras do parlamento serem divididas com 35 partidos. Nenhum deles obtém maioria absoluta desde 1984. "Maiorias absolutas estão em queda no mundo inteiro", alerta Moisés Naím, lembrando que, na Índia, a Suprema Corte aproveitou o vazio de poder fruto da medonha coalizão do primeiro-ministro Manmohan Singh e passou a controlar mais as ações estatais, chegando a investigar as nomeações presidenciais (p. 132). No Brasil, o pedido de impeachment contra a presidente Dilma foi formulado por cidadãos. A conclusão é que, agora, o poder é mais fácil de alcançar, mais complicado de exercer e mais provável de perder. E, no meio disso, está, sempre, o Judiciário. Quem se recusar a compreender isso não manterá o poder em suas mãos por muito tempo. A presidente Dilma está aí para provar isso. Aliás, já não está mais.

Água mole em pedra dura

O ministro Luís Roberto Barroso, imbuído de ideias de racionalização dos trabalhos da Suprema Corte e de uma cultura de valorização dos precedentes, está prestes a ganhar um aliado. Na sessão do Pleno na quarta-feira, o ministro Marco Aurélio registrou: 'Presidente, tenho refletido muito sobre a teoria dos precedentes, muito embora o nosso sistema seja do civil law. Isso, até mesmo diante de algumas vozes desse plenário. E dizem que eu sou muito rebelde quanto aos pronunciamentos do Supremo. Nem tanto assim!". Posteriormente, dirigindo-se diretamente ao ministro Barroso, o ministro Marco Aurélio arrematou: "É pena Vossa Excelência não ter ouvido eu dizer que estou refletindo sobre a teoria dos precedentes". Da união vem a força, sem dúvida.

Plenário Virtual Tributário

O Plenário Virtual conta com três votos (ministros Teori Zavascki, Edson Fachin e Celso de Mello) recusando a natureza constitucional na disputa quanto à incidência de IRPJ e de CSLL sobre os valores relativos aos créditos escriturais apurados no regime não cumulativo da contribuição ao PIS e à COFINS. Trata-se do ARE 957.842/AL, cujo relator, o min. Teori Zavascki, anotou: "não há matéria constitucional a ser analisada. Isso porque o Tribunal de origem decidiu a controvérsia (...) tão somente a partir da interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais pertinentes". A votação quanto ao reconhecimento, ou não, da repercussão geral, segue até dia 25/8.

Substituição de leading case sobre ICMS de empresa optante pelo Simples Nacional, em diferencial de alíquota

O ministro Edson Fachin substituiu o RE 632.783/RO, da D'grife Comércio de Importação e Exportação Ltda, pelo RE 970.822/RS, da BP Comasa Comércio de Tecidos Ltda, para ser o leading case da repercussão geral sobre a cobrança do ICMS de empresa optante pelo Simples Nacional, na modalidade de cálculo diferencial de alíquota. O ministro contava com outros dois recursos vindos do Rio Grande do Sul para possível substituição: (i) o RE 970.819/RS, da Dismaco Distribuidora Médica Ltda - ME; (ii) e o RE 970.821/RS, de Jefferson Schneider de Barros & CIA Ltda - ME. A substituição é fruto de um equívoco anterior. É que o RE 632.783/RO tratava da substituição tributária, isto é, da possibilidade de impor-se ao optante do Simples Nacional o recolhimento da exação devida em momento anterior da cadeia produtiva, mesmo com nova retenção do ICMS no bojo do recolhimento nos termos do referido modelo simplificador e sem a possibilidade de uso dos créditos resultantes da operação. Contudo, a tese reconhecida pelo Plenário Virtual calca-se na necessidade de, em operações interestaduais, o optante do Simples Nacional, independentemente da destinação da mercadoria, recolher a diferença entre a alíquota interna e a internacional. Esta, passa a ser tratada no RE 970.822/RS. A tese conta com a participação dos seguintes amici curiae: Estado de SP; ABAPLAT - Associação Brasileira de Assessoria e Planejamento Tributário, Fiscal e Proteção aos Direitos do Consumidor e do Contribuinte; e FECOMÉRCIO/RS.

Federalismo e telecomunicação

A ACEL, ao lado da Abrafix, ajuizou seis ADIs contra leis estaduais que, no seu entender, violam a competência legisferante da União. São elas: (i) ADI 5568 (min. Teori Zavascki), contra a lei 10.572/2015, da Paraíba, que determina a obrigatoriedade de envio de contratos de adesão das empresas de telecomunicações para os consumidores por meio de carta registrada. Leia a inicial; (ii) ADI 5569 (min. Rosa Weber), contra a lei 4.824/2016, de Mato Grosso do Sul, que obriga as empresas prestadoras de serviços de internet móvel e de banda larga, na modalidade pós-paga, a apresentar ao consumidor, na fatura mensal, gráficos que informem a velocidade diária média de envio e recebimento de dados. Leia a inicial; (iii) ADI 5570 (min. Celso de Mello), contra a lei 15.637/2015, de Pernambuco, que obriga os estabelecimentos comerciais que vendem chips e aparelhos celulares a disponibilizar para o consumidor um mapa demonstrativo de qualidade do sinal por município. Leia a inicial; (iv) ADI 5572 (min. Teori Zavascki), contra a lei 18.572/2016, do Paraná, que obriga as empresas prestadoras de serviços de internet a apresentar ao consumidor, na fatura mensal, gráficos que informem a velocidade diária média de envio e recebimento de dados entregues no mês. Leia a inicial; (v) ADI 5574/PB (min. Edson Fachin), contra a lei 10.519/2015, da Paraíba, que determina o Bloqueio da Identidade Internacional do Equipamento Móvel - IMEI em até 24 horas. Leia a inicial; (vi) ADI 5575/PB (min. Luiz Fux), contra a lei 10.513/2015, da Paraíba, que dispõe sobre mensagem de advertência da operadora de telefonia fixa e celular, no âmbito do Estado da Paraíba, nas chamadas telefônicas originadas para outras operadoras. Leia a inicial. As ADIs pedem a concessão de cautelar para suspender as leis questionadas.

Destaque da semana

Em razão do julgamento, pelo STF, dos recursos extraordinários sobre a competência da Câmara de Vereadores para julgar contas de prefeitos, alguns casos tributários terminaram não sendo chamados. O primeiro foi o RE 592.891/SP (min. Rosa Weber) discutindo se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção. Após o voto da ministra Rosa Weber (relatora), negando provimento ao recurso, no que foi acompanhada pelos ministros Edson Fachin e Roberto Barroso, por argumentos distintos, pediu vista o ministro Teori Zavascki. Declarou suspeição o ministro Luiz Fux. Também não foi chamado o RE 651.703/PR (min. Luiz Fux), cuja tese, com repercussão geral, é saber se incide ISS sobre as atividades desenvolvidas por operadoras de planos de saúde. Nesse caso, após o voto do relator, negando provimento ao recurso, pediu vista dos autos o ministro Marco Aurélio.

Tá na pauta

Consta como sexto item da pauta da sessão plenária do dia 17/8 (quarta-feira), o RE 688.223/PR (min. Luiz Fux), com repercussão geral, visando definir se é constitucional a incidência de ISS sobre contratos de licenciamento ou de cessão de programas de computador (software) desenvolvidos para clientes de forma personalizada. Dia seguinte, 18/8 (quinta-feira), estão pautados como quarto item os EDs no RE 599.362/RJ (min. Dias Toffoli), com repercussão geral, opostos em face de acórdão que, por unanimidade, declarou a incidência da contribuição ao PIS/PASEP sobre os atos (negócios jurídicos) praticados pela cooperativa com terceiros tomadores de serviço.

Análise

O PSB ajuizou, dia 7/6/2016, a ADI 5543, em face do ministro da Saúde e da ANVISA, sob a relatoria do ministro Edson Fachin. A ADI contesta o art. 64, IV, da portaria 158/2016 do Ministério da Saúde e o art. 25, XXX, "d", da resolução da Diretoria Colegiada - RDC 034/2014 da ANVISA. Esses dispositivos consideram homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes como inaptos temporários para a doação de sangue pelo período de 12 meses contados a partir da última relação sexual. Como cidadã constitucional que é, a nossa jovem pesquisadora Jéssica Guedes, acadêmica de Direito do IDP, divide impressões sobre o caso num consistente material. Leia aqui.

Global Constitutionalism

A Suprema Corte dos Estados Unidos suspendeu uma decisão judicial que determinava ao Conselho Escolar do município de Gloucester que permitisse que Gavin Grimm, de 17 anos, usasse o banheiro compatível com a sua identidade de gênero. A Suprema Corte definirá se o caso é consistente o suficiente para ser julgado. Pela decisão, o Conselho Escolar da Virgínia fica autorizado a impedir um transgênero de usar o banheiro dos garotos quando o período escolar se iniciar, próximo mês. Grimm, que nasceu com toda a anatomia feminina, mas se identifica como garoto, teve a permissão de usar o banheiro masculino por algumas semanas em 2014. Contudo, após a reclamação de pais e mães de alunos, o Conselho Escolar decidiu adotar a política segundo a qual os estudantes devem utilizar o banheiro que corresponda ao gênero biológico, ou um banheiro individual destinado a qualquer gênero. Na mesma semana, na Alemanha, um painel de magistrados do Tribunal Federal de Justiça rejeitou a adoção de "inter" como sendo um terceiro gênero. O painel definiu que a legislação alemã não permite uma terceira opção de gênero como "inter" ou "diverso" na certidão de nascimento. O grupo Terceira Opção (Third Option) prometeu levar a questão para a Corte Constitucional em setembro. No Brasil, uma aluna conseguiu na Justiça o direito de ser chamada pelo nome social em cerimônia de colação de grau. Após iniciativa da Comissão de Diversidade Sexual da OAB/DF, a liminar foi deferida pelo juiz Federal substituto Eduardo Santos da Rocha Penteado, da 14ª vara do DF. A aluna relatou que, em setembro de 2015, assumiu sua identidade de gênero (transexual feminino) e iniciou os procedimentos médicos e psicológicos para adequação. Por fim, no STF, pende de julgamento o RE 845.779/SC (min. Roberto Barroso), que visa saber se uma pessoa pode ou não ser tratada socialmente como se pertencesse a sexo diverso do qual se identifica e se apresenta publicamente. O tema e suas nuances, como se vê, são universais.

Eventos

Dia 15/8 (quinta-feira), às 10h, o ministro Edson Fachin ministrará a conferência "Federalismo Cooperativo e Jurisdição Constitucional" no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFPR. Dia seguinte, 16/8 (terça-feira), das 9h30 às 12h, ocorrerá na Sala das Sessões da 1ª Turma do STF a conferência "Eficácia dos Direitos Fundamentais em Relação aos Particulares: A jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal do Caso Lüth ao caso Flashmob". A conferencista será Sibylle Kessal-Wulf, ministra do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha. O ministro Dias Toffoli presidirá a mesa. É um evento de inverno.

Obiter Dictum

No julgamento dos recursos extraordinários sobre a competência das câmaras de vereadores para julgar contas de prefeitos, o ministro Gilmar Mendes se pôs a criticar a ampliação do alcance da inelegibilidade de políticos. "Logo mais estarão tornando inelegível o filiado ao Corinthians", comentou. Quando viu o ministro Barroso perguntar sobre o Santos Futebol Clube, o ministro Gilmar, santista de carteirinha, não titubeou: "Não, não! O Santos, não".