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O guia definitivo para o fim do mundo

terça-feira, 24 de agosto de 2021

Atualizado às 08:19

Nesta semana, resolvi exercer o poder da minha imaginação para rascunhar o futuro dos direitos fundamentais, caso tudo dê errado. Se o futuro for distópico, como o nosso momento atual leva a crer, com a humanidade rejeitando um avanço moral significativo, que minimamente acompanhe as descobertas tecnológicas, como será o mundo?

Tentarei não ser tão óbvio, porque, por exemplo, todos sabemos que o fim do mundo envolverá doses cavalares de neoconstitucionalismo, como representação da hermenêutica do desespero. Também sabemos que o apocalipse ocorrerá, quando o jargão jurídico se alastrar pela sociedade, com as pessoas falando verbi gratia e provendo recursos no café da manhã.

A questão desconhecida é: quais as forças, que atuando em conjunto, podem fazer com que o papel final do capitalismo seja o fim da humanidade, provocando um silêncio absoluto? Eu não quero soar apocalíptico. Sei que vivemos apenas um momento histórico transitório, em que um vírus desconhecido mata uma geração, enquanto assistimos jogos de futebol, curtimos festas e preenchemos o instagram com felicidades compradas, parcelando a alma em 12 vezes sem juros.

Afinal, a depressão hoje é um espetáculo e o Direito Constitucional tem uma função claríssima: vender direitos fundamentais. Nós, constitucionalistas, temos a função de fazer o marketing existencial. Somos os ilusionistas. Os ventríloquos dos direitos. Fazemos eles parecerem reais para distrair a mente da humanidade, em sua peregrinação em direção ao caos.

Imagino quatro crises impulsionando a nossa distopia - climática, política, econômica e existencial.

A crise climática é a morte. Ela é o introitus do réquiem. Pode ser que não seja possível reverter os danos ambientais, fazendo com que os nossos esforços sejam em vão. As crises biológicas nada mais seriam do que desdobramentos de um meio ambiente em extinção. A nossa gula colocaria a Terra de joelhos. A morte do Direito Ambiental.

A guerra é a crise política. Diante da esperança combalida, a polarização se intensificaria, com os idiotas tomando as suas certezas como espadas. A busca pela verdade ou pela razoabilidade não faria mais sentido. As impressões, subjetividades e prazeres seriam rainhas. A humanidade condicionaria a amizade ao alinhamento político absoluto, radicalizando a imbecilidade humana. A morte do Direito Constitucional.

A crise econômica é a fome. Sem conseguir harmonia política, um polo trancaria a pauta do outro. Preferindo o monopólio da razão e, reféns do seu eleitorado, os políticos deixariam de aprovar pautas emergenciais, extremando o populismo e derrubando a economia e o trabalho. A morte do Direito Previdenciário.

Por fim, a minha especialidade: a crise existencial como peste. O separatismo dos sexos. Homens e mulheres se dividiriam em partidos opostos. O amor líquido gradualmente se transformaria em cultura da prostituição. As famílias sucumbiriam. O desejo humano seria um fogo em extinção, caminhando de aplicativo em aplicativo, acorrentados em um ciclo sem fim de dopamina. Os homens tomariam o seu próprio caminho, enquanto as mulheres defenderiam os direitos do fim do mundo. O amor se tornaria um mito. Uma espécie de força ancestral perdida. Ele seria proibido. Escreveríamos livros sustentando o quanto ele era opressivo. Os sexos seriam extintos em nome da ditadura dos gêneros. A morte do Direito de Família.

Sejam bem-vindos ao fim do mundo. Mas fiquem tranquilos, no final, haverá pronomes neutros para todos. 

*Escrevi este texto em 32 minutos, ouvindo o Réquiem de Antonín Dvorák em B? minor, Op. 89, B. 165