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Louvar Deus ou Louvar a Deus?

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Atualizado em 13 de setembro de 2022 12:55

Um leitor envia a seguinte  mensagem ao Gramatigalhas:

"Prezado Dr. José Maria da Costa, existe explicação para a utilização dos verbos como transitivos indiretos, sempre que o objeto é Deus? 'Louvar a Deus', 'amar a Deus', 'adorar a Deus', etc.? Muito obrigado!".

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1) Um leitor pergunta se existe explicação para emprego de verbos como transitivos indiretos sempre que o objeto é Deus, como nos seguintes exemplos: Louvar a Deus, amar a Deus e adorar a Deus?

2) Antes de entrar no mérito da questão, vamos considerar dois exemplos: a) "O juiz silenciou"; b) "O juiz quebrou o sigilo bancário".

3) No primeiro exemplo - "O juiz silenciou" - vê-se que o sujeito é o juiz, enquanto o verbo indica a ação de silenciar. Já no segundo exemplo - "O juiz quebrou o sigilo bancário" - tem-se por sujeito o juiz, enquanto o verbo indica a ação de quebrar.

4) Ora, no primeiro caso, quando se diz o sujeito (o juiz) mais o verbo (silenciou), verifica-se que, numa análise bastante rudimentar e própria para o que aqui é necessário, a ação estanca no verbo, não passa (ou não transita) para além dele. Por isso se diz que se está diante de um verbo intransitivo.

5) Já no segundo caso, quando se diz o sujeito (o juiz) mais o verbo (quebrou), também em análise bastante simplista, nota-se que a ação passa, vai (ou transita) para além do verbo. Por isso se diz que se está diante de um verbo transitivo.

6) Adicione-se um terceiro exemplo: "O documento pertence aos autos". Nele se tem o sujeito (o juiz) e um verbo (pertence), cuja ação também passa (ou transita) para além do verbo, de modo que também aqui se está diante de um verbo transitivo.

7) Considere-se, em seguida, novamente, o primeiro dos exemplos com verbo transitivo: "O juiz quebrou o sigilo bancário". Uma análise visual mostra que o complemento, que é o alvo (ou objeto) da ação de quebrar, está sem preposição obrigatória. O raciocínio a ser feito é que quem quebra, quebra algo (exige complemento sem preposição obrigatória). E se conclui que a ação de quebrar passa diretamente para o complemento (ou alvo ou objeto), isto é, sem auxílio obrigatório de preposição.

8) Em tal caso, extraem-se duas conclusões de extrema importância: a) O que se tem é um verbo transitivo direto; b) O complemento desse verbo, por sua vez, denomina-se objeto direto.

9) Considere-se, em seguida, o segundo dos exemplos com verbo transitivo: "O documento pertence aos autos". Uma atenta observação mostra que o complemento, que é o destinatário (ou objeto) da ação de pertencer, está com preposição obrigatória. O raciocínio a ser feito é que o que pertence, pertence a algo ou a alguém. E se conclui que a ação de pertencer passa indiretamente para o complemento (ou destinatário ou objeto), isto é, com o auxílio obrigatório de preposição.

10) E aqui também se extraem duas conclusões de extrema importância: a) Tem-se, no caso, um verbo transitivo indireto; b) O complemento, por sua vez, denomina-se objeto indireto.

11) De modo específico para o caso da consulta, anote-se que determinados verbos normalmente transitivos diretos às vezes aparecem completados por objetos diretos preposicionados, e isso, dentre outras, pelas seguintes razões: a) Por reverência e respeito: "Ele ama a Deus sobre todas as coisas"; b) Quando se trata de pronome oblíquo tônico: "Nem ele entende a nós, nem nós a ele"; c) Para evitar confusão de sentido, principalmente em casos de inversão dos termos da oração: "A Abel matou Caim".

12) Vejam-se as seguintes conclusões para casos dessa natureza: a) Mesmo com objetos diretos preposicionados, os verbos continuam transitivos diretos, de modo que não passam a ser transitivos indiretos; b) Reforce-se que o complemento é objeto direto preposicionado, e não objeto indireto.

13) Para quem tem dificuldade exatamente para reconhecer qual há de ser a transitividade de um verbo em tal caso, é bom lembrar, em termos bem práticos, que o verbo transitivo direto normalmente admite passagem para a voz passiva, enquanto o transitivo indireto, por via de regra, não a admite.

14) Assim, o exemplo "O juiz quebrou o sigilo bancário" admite transformação para "O sigilo bancário foi quebrado pelo juiz". Já o exemplo "O documento pertence aos autos" não admite passagem para a voz passiva, o que é sinal inconfundível de que pertencer não é transitivo direto.

15) Vamos formular exemplos com os casos da consulta: a) "Nós louvamos a Deus" (voz ativa); b) "Deus é louvado por nós" (voz passiva); c) "Os homens amam a Deus?" (voz ativa); d) "Deus é amado pelos homens?"; e) "Eles adoravam verdadeiramente a Deus"; f) "Deus era adorado verdadeiramente por eles".