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Agora é lei: Estatuto da Pessoa com Câncer

domingo, 28 de novembro de 2021

Atualizado em 26 de novembro de 2021 10:27

A lei, desde o seu nascedouro - oportunidade em que são travadas as pertinentes discussões a respeito das questões relevantes para seus destinatários - traz, de forma cogente e com validade erga omnes, uma normatização para que seja criteriosamente seguida pela comunidade. A sociedade civilizada necessita não só de preceitos éticos regulatórios para uma harmônica convivência social, como, também, de regulamentar direitos previstos na Lei Maior para que sejam proclamados com a eficácia necessária.

Assim, na maioria dos casos, a lei, como instrumento regulatório, lança uma tutela primária sobre todas as pessoas, conferindo-lhes direitos concretos e difusos condizentes com os parâmetros da dignidade humana, um dos fundamentos da Constituição Federal. Na sequência, em se tratando de casos especiais que exigem uma atuação diferenciada, com maiores cuidados ainda, estreita o canal protetivo e nele insere uma nova legislação específica para atendimento de casos excepcionais, sem ferir a isonomia consagrada constitucionalmente. Quer dizer, na igualdade entre as pessoas, terão prioridade aquelas que necessitam de atendimento e acolhimento preferencial, em razão de uma vulnerabilidade momentânea ou não.

Tal espírito norteou a lei 14.238/21, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Câncer e que tem como finalidade específica assegurar e promover, em condições de igualdade, o acesso ao tratamento da pessoa com câncer, garantindo-lhe a sua inclusão social e necessária proteção no âmbito das políticas públicas de prevenção e combate à doença. Para tanto, a novatio legis assim definiu: "Considera-se pessoa com câncer aquela que tenha o regular diagnóstico, nos termos de relatório elaborado por médico devidamente inscrito no conselho profissional, acompanhado pelos laudos e exames diagnósticos complementares necessários para a correta caracterização da doença".

É interessante observar que a terminologia Estatuto passou a frequentar a legislação pátria após a Constituição Federal de 1988, que sedimentou a extensa via dos direitos e garantias individuais e coletivos. Basta ver, dentre outros, o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/1990), Estatuto da Pessoa com Deficiência (lei 13.146/2015) e Estatuto do Idoso (lei 10.741/2003). Referida denominação, por si só, deixa entender que pretende regulamentar direitos de um determinado agrupamento social para que todas as pessoas que o integram possam receber, em igualdades de condições, o tratamento adequado em razão de uma moléstia comum.

Dentre os objetivos propostos podem ser mencionados: diagnóstico precoce e confiável da doença, quando ainda há grande possibilidade para um tratamento exitoso; acesso do paciente ao tratamento recomendado pelo protocolo médico; assistência social e jurídica; transparência das informações dos órgãos encarregados pelo atendimento, com acompanhamento dos processos, prazos e fluxos, indicando a sustentabilidade do tratamento; estímulo à prevenção e humanização da atenção aos pacientes e familiares, e garantia do tratamento adequado, nos termos das leis 8.080, de 19 de setembro de 1990, e 12.732, de 22 de novembro de 2012.

Como é sabido, pelo alcance da lei 12.732/2012, o paciente com câncer, assim diagnosticado pelo SUS, deve receber o primeiro tratamento da doença no prazo de 60 dias, a partir da emissão do laudo patológico ou em prazo menor, conforme a necessidade terapêutica do caso, registrada em prontuário único. Portaria posterior do Ministério da Saúde (nº 1.220/2014) mitigou a interpretação da Lei dos 60 dias e passou a considerar o prazo a partir da data do diagnóstico da doença no exame (laudo patológico). Quer dizer, a data da assinatura do laudo patológico apontará o termo inicial para a contagem do prazo de 60 dias, obrigando os gestores públicos a tal determinação.

A lei 13.896/2019, que entrou em vigência no dia 28/4/2020, por sua vez, com a intepretação mais adequada e consentânea com um diagnóstico mais célere que, além de diminuir os custos, irá proporcionar melhores condições de sucesso do tratamento, estabeleceu o prazo máximo de 30 dias para a confirmação da doença, in verbis: "Nos casos em que a principal hipótese diagnóstica seja a neoplasia maligna, os exames necessários devem ser realizados no prazo máximo de 30 (trinta) dias, mediante solicitação fundamentada do médico responsável".

Outra inovação da lei é voltada para as crianças e adolescentes com câncer ou até mesmo com suspeita, que terão garantidos o tratamento universal e atendimento integral, em todas as fases. A própria lei delimitou a conceituação de atendimento integral como sendo aquele realizado nos diversos níveis de complexidade e hierarquia, bem como nas diversas especialidades médicas, de acordo com as necessidades de saúde da pessoa com câncer, incluídos assistência médica e de fármacos, assistência psicológica, atendimentos especializados e, sempre que possível, atendimento e internação domiciliares.

Pode se dizer que a lei atendeu os reclamos da população brasileira em conferir a proteção necessária para o doente com câncer, além de, com base na recomendada medicina humanizada, introduziu atendimento multidisciplinar e cuidados paliativos ao paciente, extensivos aos familiares.