Reflexões sobre a SAF, o clubismo e o futuro dos grandes times
quarta-feira, 10 de dezembro de 2025
Atualizado às 09:49
Ao final de 2023, ano em que alguns projetos relevantes de SAFs começavam a engatinhar, analistas afirmavam que o modelo fracassara, por conta dos resultados, sobretudo, de três deles: Botafogo, Cruzeiro e Bahia.
A posição foi imediatamente rechaçada neste espaço e as justificativas pareciam óbvias: apesar de o Botafogo SAF ter liderado a maior parte do campeonato, a 5ª posição, para quem, dois anos antes, estava na Série B, sinalizava uma perspectiva de mudança estrutural relevante; enquanto isso, a proposta dos acionistas da SAF do Cruzeiro contemplava um ano difícil, após subir da Série B para A, mas já projetava uma evolução para o ano seguinte, consistente na participação em uma decisão de copa e um melhor desempenho na Série A. Já o Bahia SAF, com seu poderoso controlador, que pouco falou - e ainda pouco fala -, e recebeu insensatas críticas (por quase o time ter sido rebaixado, posição em que esteve, aliás, em 2022), passava por um processo de compreensão e adaptação do ambiente brasileiro, que logo se reverteria.
Em 2024, o Botafogo SAF atingiu marcas improváveis, em tão curto prazo, com a conquista do brasileiro e do mais importante título de sua história, a Libertadores da América. A SAF do Cruzeiro alcançou a 9ª colocação na Série A e voltou a uma final internacional, na Copa Sul-Americana. E o Bahia SAF reencontrou a mesma Libertadores após 35 anos de ausência.
Neste ano de 2025, a SAF do Cruzeiro atingiu a terceira posição na tabela final. O Botafogo SAF, com a 5ª posição, garantiu sua terceira participação consecutiva na Libertadores da América e o Bahia SAF, pela primeira vez em sua história, disputará essa competição duas vezes seguidas.
As três SAFs passaram por experiências distintas ao longo de, até aqui, suas curtas jornadas.
O Botafogo SAF, após extrema exposição midiática de seu acionista controlador e de movimentos empresariais e esportivos polêmicos, envolveu-se em uma batalha judicial transnacional. A SAF do Cruzeiro mudou de mãos e passou a ser controlada e gerida por um empresário e torcedor emblemático, que tem recursos e fluxo para investir, reinvestir, tomar riscos, corrigir rotas e mirar em alvos grandiosos. O Bahia SAF, por fim, parece conviver com um modelo estável, como nenhum outro, capaz de projetar movimentos e resultados e, quem sabe, surpreender o país com ambições maiores, muito maiores do que se pode supor.
A novidade, no ambiente da SAF, pode ser, conforme notícias veiculadas pela imprensa1, o projeto do Fluminense, já abordado neste espaço2, cujas características únicas o habilitarão aos mais altos voos na hierarquia nacional e latino-americana. Além dele, o ressurgimento do Athlético Paranaense, time que jamais deveria ter caído, e que deverá voltar mais cascudo e, ao que notícias de imprensa também apontam, tende a caminhar para a formação de uma SAF também especial, por conta da solidez de sua estrutura patrimonial e financeira.
Esses times deverão se juntar, se confirmados os projetos, à SAF do Galo, que passa por crise econômica, mas encontrará, com apoio de seus controladores, saída, de modo planejado, para seus desafios; à SAF do Vasco, também em crise, mas que também poderá decolar quando resolver seus imbróglios jurídico-societários; à SAF do Coritiba, que será testada em 2026, como resultado dos esforços pioneiros de um fundo "faria limer"; e ao único clube-empresa na Série A, o Red Bull Bragantino, que convive com uma situação peculiar: ótima estrutura, salários de jogadores em dia, localizado em cidade que oferece boa qualidade de vida, mas que parece ainda lutar contra um possível acomodamento decorrente da ausência de torcida e da pressão externa por resultados.
No curto prazo, apostando-se na implementação de algumas SAFs e na estabilização de outras - que conviverão, sem dúvidas, com baixas em suas trajetórias, porém, com melhores condições para enfrentamento de obstáculos -, como poderão os demais times tradicionais em crise, com grandes torcidas, que insistem no modelo associativo, competir com SAFs capitalizadas, bem administradas, sem conflitos políticos e estáveis nos planos societário e organizacional?
Sem falar na dificuldade - ou quase inviabilidade - de competir com os dois clubes que, em passado recente, descolaram-se dos demais, inclusive das SAFs: o Flamengo e o Palmeiras.
São Paulo, Corinthians, Santos, Grêmio e Internacional encontram-se, pois, em uma encruzilhada histórica, quase mortal. Salvaram-se todos em 2025, mas até quando se sustentarão, por conta de suas torcidas e das glórias do passado, com endividamentos impraticáveis e ineficiências inerentes ao clubismo?
Não há mais tempo, pelas características do mercado do futebol, para que resgates parcimoniosos como o do Flamengo - operado no caso, a partir do início da década passada -, ocorram. O dinamismo das relações e a evolução das receitas dos protagonistas, que progridem geometricamente, não respeitam a evolução aritmética das associações, submetidas a políticas degenerativas.
Mesmo assim, que ninguém se surpreenda se algum dirigente de grande clube, em crise, olhar para o Mirassol e indicá-lo como prova de que ainda há salvação no clubismo.
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