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Escola de mediação de portas abertas

quinta-feira, 27 de abril de 2023

Atualizado em 28 de abril de 2023 07:17

Em 20 de dezembro de 2022 foi criada oficialmente a primeira Escola de Mediação do país pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. É a EMEDI, Escola de Mediação do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, estruturada no âmbito do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC/RJ). A escola está sendo organizada administrativamente, para que possa iniciar o mais breve possível as suas funções, já que conta com uma demanda reprimida de diversos cursos fundamentais exigidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tanto para a formação de conciliadores e mediadores judiciais, quanto para o oferecimento de cursos de extensão em vários níveis.

Trata-se de um sonho antigo de todos aqueles que lidam com os meios autocompositivos de solução de conflitos e verificam que, apesar de já se ter obtido várias conquistas, como se percebe, por exemplo, na atuação comprometida e dedicada dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs), ainda há muito a caminhar para a implementação real de um ambiente múltiplo para tratar os conflitos. Era urgente, para tanto, ter um espaço dedicado de forma exclusiva, com visão sistêmica e com toda profundidade ao tema. Esse sonho se torna realidade com a EMEDI.

No Rio de Janeiro, as diversas capacitações sobre a matéria aconteciam de forma esporádica na Escola da Magistratura (EMERJ) ou através da escola de servidores (ESAJ). Tais escolas, importantíssimas nesse percurso, têm, no entanto, outros objetivos e metas. Desse modo, diante da necessidade de ampliação desse campo multiportas, - onde se reconhece que há diversos métodos possíveis para a solução de cada conflito e que há nuances do caso concreto que fazem cada meio ser mais ou menos adequado ao caso -, as necessidades pedagógicas dessa área extravasaram os limites e já não cabem como mera parte dentro de outra estrutura formal.

Além disso, a dimensão tradicional do Direito já não é suficiente para responder aos anseios e necessidades de uma sociedade tão rápida e complexa como a nossa. É preciso avançar na direção de um direito sócionormativo, que reconhece um protagonismo da sociedade como destinatária de toda a estrutura do Poder Judiciário. O pluralismo jurídico é um caminho sem volta e a formação tradicional do Direito deixa hoje seus operadores desguarnecidos de caminhos para soluções justas em muitos casos que são trazidos ao cotidiano forense. Além disso, em um grande número de situações belicosas, sequer se consegue o acesso real à justiça e o conflito se perpetua no seio da sociedade, causando desequilíbrio e dor.

Esse, aliás, um conceito que precisamos renovar em nossos manuais e em nossas mentes: o acesso à justiça não significa acesso ao Poder Judiciário, mas acesso a uma forma adequada de solução daquela controvérsia.

Há muito a ser feito. Portas foram abertas. Portas foram destrancadas. Portas foram derrubadas. O horizonte à frente é de muito trabalho e tudo isso passa pela capacitação, pela formação e pela especialização. Só um ambiente de estudos, pesquisas e treinamentos poderá propiciar que esse solo fértil possa ser fecundado e garanta uma colheita ainda mais consistente em termos de justiça e paz.

Não há dúvidas sobre a adoção de um sistema multiportas pelo sistema processual pátrio, pelo qual a função jurisdicional deixa de ser "a" via para resolução de demandas, passando a estar ao lado de tantos outros mecanismos que servem, cada um com suas características, a resolver conflitos. Assim, temos a mediação, a arbitragem, a conciliação, a justiça restaurativa, os desenhos de sistemas, só para enumerar alguns.

Além disso, em um sistema multiportas, o próprio processo judicial precisa ser tratado, pois padece de algumas enfermidades estruturais que, muitas vezes, fazem com que seus objetivos não consigam ser alcançados.

O próprio código de processo civil de 2015 já avançou muito nesse sentido, com a previsão do sistema de concertação processual e os negócios jurídicos processuais atípicos. Agora, passados 7 anos da vigência do código, percebe-se que ainda é pequena a aplicação dos referidos institutos, se comparado com suas potencialidades, muito pelo despreparo dos profissionais do Direito que não conseguiram ainda se capacitar adequadamente para que os novos institutos possam fazer diferença no processo judicial de cada dia.

O processo judicial é muito bom, mas precisa e pode ser ainda melhor. Há casos em que ele é a melhor porta, mas, por vezes, essa porta está um tanto emperrada e precisamos dessa renovação para que a prestação jurisdicional cumpra os anseios sociais e constitucionais.

De outro lado, o avanço dos meios tecnológicos - que já amplia possibilidades há anos, mas que foi acelerado pelas necessidades trazidas com a pandemia de 2020 -, permitem que hoje essa estrutura de novas tecnologias e inteligência artificial esteja à disposição de todos. De fato, se esse acesso tecnológico ainda não ocorre individualmente, precisa estar disponibilizado pela Casa da Justiça. A tecnologia é neutra e cabe a nós direcionarmos para seu melhor uso. No caso, para reduzir conflitos, desigualdades, falta de acesso, para simplificar linguagem que impeça denominadores comuns.

Somem-se a isso os estudos de análise econômica do direito que indicam o quanto os meios adequados de solução de conflitos podem ser salutares para o desenvolvimento de novas culturas menos onerosas e mais eficientes na solução das questões controvertidas.

O momento é propício. As condições ideais estão fervilhando. É chegado então o momento de uma investida pedagógica a partir da qual se possa estruturar uma rede capacitada para aplicar o sistema multiportas, onde profissionais de outros saberes, advogados, procuradores, defensores públicos, membros do Ministério Público, servidores e magistrados estejam aptos e seguros na aplicação das melhores estratégias, mas onde, também, as próprias partes envolvidas possam entender e se empoderar de sua autonomia individual na condução de seus conflitos.

A atuação da EMEDI irá no mínimo tempo possível até a base, levando a mediação às escolas, às organizações, prevenindo conflitos, verdadeiramente fazendo mudanças e propondo modificações geracionais na educação. Inicialmente, logo no primeiro semestre de atuação, a expectativa é que possamos aplicar cursos de Capacitação de Magistrados na Formação de Mediadores e Conciliadores Judiciais; Formação de Conciliadores Judiciais, para atendimento nas serventias judiciais; formação de Expositores de Oficinas de Parentalidade; formação de Mediadores Comunitários; formação de Mediadores para atender a diversos convênios com órgãos públicos e privados. Além desses, estão previstos ainda nesse primeiro bloco cursos de extensão em  Mediação de Conflitos, Comunicação - escuta ativa - respeito e consenso, Formação em Prevenção de Conflitos, cursos sobre as Casas de Família e Gestão Processual Consensual.

Se em um primeiro momento a questão dos meios adequados de solução de conflitos era interesse de alguns poucos, hoje sua utilidade é para todos. Já não há dúvidas sobre o quanto esses mecanismos trazem respostas mais assertivas. A dúvida ainda é: como fazer? Para isso serve a EMEDI. A proposta é de uma escola eficiente e democrática, baseada na simplicidade e que responda às políticas públicas de consensualidade.

Sendo assim, se o momento é de novas portas, a EMEDI está com as suas abertas,  franqueadas a quem se interessar, para que a sociedade possa ser mais pacífica, resolutiva e inclusiva. Tenham na EMEDI uma nova Casa, uma Escola de todos e para todos!