COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas >
  3. Política, Direito & Economia NA REAL >
  4. Política & Economia NA REAL n° 41

Política & Economia NA REAL n° 41

terça-feira, 3 de março de 2009

Atualizado em 2 de março de 2009 17:57

Terça-feira, 3 de março de 2009 - nº 41

A crise se aprofunda

Há sólidas razões para que se possa concluir que o alastramento da crise internacional prosseguirá e de forma ainda mais acentuada nos próximos meses. Embora muitos teçam opiniões que dão cores menos pesadas à atual situação, o fato é que não existe nenhuma evidência objetiva para que se possa fundamentar uma opinião mais favorável em relação ao seu desenvolvimento. Eis as razões que suportam a nossa opinião:

(1) O pacote de estímulo econômico promovido pelo governo de Obama nos EUA e aprovado há duas semanas pelo Congresso norte-americano é claramente insuficiente para cumprir os dois papéis aos quais se destina, a saber, (i) relançar as bases de um consumo sustentado e (ii) sanar o setor financeiro do país;

(2) No que se refere ao setor financeiro, a estatização do Citigroup é apenas uma evidência (importante) do que está a acontecer. Os bancos americanos estão literalmente quebrados e absolutamente incapacitados de prover crédito novo e sadio para os consumidores. Mais bancos devem ser liquidados ou estatizados;

(3) Ao redor do mundo, especialmente nos países europeus, o que se vê é que a irresponsabilidade no setor financeiro seguiu os mesmos padrões americanos. Na Inglaterra, apenas para citar o caso mais grave, o sistema está quebrado e ainda está em fase inicial a contaminação do setor real, sobretudo os grandes provedores de ofertas de emprego, como é o caso da construção civil;

(4) Os países com melhor desempenho em termos de atividade econômica, como o Brasil, a Índia e, sobretudo, a China, ainda estão iniciando o processo de desaceleração mais forte de suas economias. Isto deve agravar ainda mais a situação da economia mundial. Se a China foi argumento para tanto otimismo no passado recente, por que o inverso não seria verdadeiro ?;

(5) O protecionismo vai ser um dos maiores riscos desta crise. Os países, por razões políticas domésticas, estão a traçar estratégias para proteger as suas respectivas economias (e empregos). No conjunto da economia mundial estas estratégias se constituem em verdadeiras tragédias, pois reduzem a atividade global já deprimida e, ademais, podem concorrer para um processo de desvalorizações cambiais altamente perigosas;

(6) A debilidade econômica crescente no mundo retira dos Estados a principal capacidade política e econômica do momento que a de constituir déficits para estimular o emprego, o consumo e o investimento. Menor atividade econômica implica em menor arrecadação, logo em maiores déficits, fato este que aumenta a desconfiança dos agentes em relação ao futuro - a solvência das dívidas públicas passa a ser questionada. O comportamento especulativo do mercado de metais se deve a este fator;

(7) Ainda não estão produzidos todos os efeitos políticos da atual crise, ou seja, o aumento do desemprego e a recessão vão aumentar a pressão sobre os governos e, por conseguinte, haverá maior instabilidade política.

Brasil cada vez mais afetado

Embora tenhamos de reconhecer por razões objetivas (boa posição externa, menor nível de exposição ao comércio exterior, baixa inflação e relativo controle das contas fiscais) que o Brasil está melhor posicionado para enfrentar a crise mundial, é evidente que o país será afetado pelo agravamento dos fundamentos das economias dos países centrais. Neste sentido, ainda estamos vivendo os primeiros efeitos desta má contaminação. Ou seja, a onda negativa externa ainda vai bater mais fortemente em nosso país. As ondas de demissões ainda não são dramáticas, mas tendem a se tornar mais graves. A popularidade do presidente Lula, um recorde da República, é um fator favorável para enfrentar os tempos duros que se aproximam. Todavia, sabe-se que este capital nem é infinito e nem é emprestado sem contrapartida. Assim, as principais macrotendências da política e da economia brasileira nos próximos meses podem ser previstas (sem pretensões proféticas) da seguinte maneira:

(1) A desaceleração da economia brasileira se dará ao longo de todo o ano de 2009 e não apenas em um ou dois trimestres;

(2) Tal desaceleração tem substancial probabilidade de adentrar o ano eleitoral de 2010;

(3) Os gastos governamentais não serão capazes de evitar este processo contínuo de desaceleração, embora possa minimizá-lo. Há que se notar que, da mesma forma como ocorre nas principais economias mundiais, a disponibilidade fiscal para bancar políticas anticíclicas está por se reduzir velozmente. Adicionalmente, não se conhece o volume verdadeiro gasto pelo setor público nas políticas para combater a desaceleração econômica, especialmente em função da falta de transparência dos bancos públicos brasileiros, como é o caso do BNDES;

(4) O desemprego está em fase inicial e os seus efeitos sobre a confiança do consumidor serão crescentes e hão de deteriorar o crédito e o consumo. Além da política, é claro;

(5) A inflação está relativamente controlada, mas a sua tendência será basicamente definida pelos movimentos da taxa de câmbio. Do lado doméstico não há pressões substantivas, mas do lado externo há tanta incerteza que prever a taxa de câmbio, coisa que era tarefa dificílima, passou a ser impossível;

(6) O investimento vai cair sistematicamente. Seja do setor externo, por razões óbvias, seja pela falta de confiança dos capitalistas nativos. O PAC minimiza os efeitos, mas não muito;

Como se vê, as tendências acima desfiladas podem ser contestadas no que tange ao seu grau de intensidade. Negá-las, contudo, é quase uma irresponsabilidade. A hora é grave e é muito melhor que sejamos cientes deste fato do que surpreendidos por eles. Quem sabe a consciência nos leve a pressionar pela mudança de rota em tais tendências. De nosso lado vale a máxima de que se os fatos mudam, nós mudamos de opinião. Por dever de ofício, inclusive. Mas, até agora é o que temos a dizer.

____________

Uma caixa preta...

São louváveis, já dissemos, os esforços do governo para ajudar a conter os efeitos mais daninhos da crise na economia nacional. Porém, por uma série de razões - o atarantamento de alguns dos responsáveis pela elaboração das medidas, injunções político-eleitorais que impedem a tomada de certas posições, a falta de uma visão global do problema - o governo está "chegando atrasado a algumas bolas" e pode estar comprometendo seriamente a recuperação mais rápida da economia brasileira. Preocupa em especial a deterioração das contas públicas. De um lado, corretamente, ele incentiva certos investimentos e dá isenções ficais para manter setores em atividades. Só que isso tem um custo fiscal, como relatamos acima, não mensurado perfeitamente. Mas se somarmos as renúncias já anunciadas - IPI dos carros, IR das pessoas físicas entre outros - temos mais de R$ 18 bilhões de reais. O encantado pacote imobiliário poderá incluir um subsídio de R$ 8 bilhões. Os subsídios novos do BNDES, com os R$ 100 bilhões adicionais, somarão R$ 4 bilhões. Somente isso, por baixo, leva R$ 300 bilhões.

...e um buraco negro

Ainda no item despesas, como já relatamos em colunas anteriores, o crescimento é exponencial: prevê-se um aumento real este ano entre 8 a 10%, puxado principalmente pelos efeitos do aumento do salário mínimo muito acima da inflação e dos reajustes generosos concedidos aos funcionários públicos. A arrecadação está caindo - diminuiu um pouco mais de 7% em janeiro deste ano em relação a janeiro do ano passado. E não há movimentos para cortes de despesas de custeio. O ministério do Planejamento está revisando o Orçamento, com dificuldades para fechar a contabilidade diante das limitações político-eleitorais impostas pelo calendário sucessório de 2010 do presidente e as exigências dos partidos aliados. É uma equação explosiva.

Investimentos financeiros : investir pensando no pior

No momento em que se compara a Grande Depressão dos anos 30 com a atual conjuntura é irresponsável dizer que há razões para se aumentar o risco dos investimentos. Existem, infelizmente, muitos analistas e "pregadores" ao redor do globo construindo teses em favor dos ativos de risco. É bom rememorar os nossos leitores que foram a maioria destes "analistas" os principais responsáveis por esta crise. A irresponsabilidade foi a marca mais importante do mercado financeiro nestas duas últimas décadas. Neste item não temos de provar nada: basta dar uma olhada nos escândalos financeiros em todo o globo. Dito isto, queremos reforçar o que já dissemos nas nossas últimas colunas. Estamos, infelizmente, muito pessimistas em relação ao futuro da economia mundial. É bom que se diga que não informamos os nossos leitores sobre o nosso pessimismo em função de qualquer traço negativo ou depressivo na psicologia destes colunistas. Apenas estamos sendo fiéis à nossa análise mais sincera e profissional. Em janeiro estávamos mais otimistas, conforme sinalizamos nas nossas primeiras colunas do ano. Em meados daquele mês mudamos de opinião e passamos a acreditar na piora dos mercados mundiais e suas consequências sobre o nosso país. O principal fato para nos afastar de qualquer otimismo no momento é a decepção com o pacote de estímulo econômico de Obama. Como dissemos em várias notas, este é insuficiente e não ataca a forte crise do sistema financeiro de forma eficaz. Assim, de forma breve, eis as nossas opiniões, na nota abaixo, sobre o desempenho dos principais segmentos do mercado financeiro.

Hora da renda fixa apesar da queda da Selic

Algumas recomendações básicas para os investimentos pessoais:

(1) Mantenha suas posições cambiais. Se o real se valorizar de forma mais acentuada aumente tais posições;

(2) A taxa de juros básica deve continuar caindo. Melhor os prefixados aos pós-fixados. Prefira os CDBs aos fundos. Pagam mais e não têm taxa de administração e de desempenho. Na próxima reunião do COPOM, acreditamos numa queda de 1% na taxa Selic. Pode ser mais;

(3) Os metais preciosos, sobretudo o ouro, vão continuar valorizados, podendo subir ainda mais. Mantenha a posição. Na queda eventual, aumente tais posições;

(4) A bolsa brasileira (e quase todas no mundo) deve sofrer desvalorizações nominais e em termos de dólar nos próximos meses. Os resultados corporativos devem ser decrescentes e a queda das commodities lá fora influenciará ainda mais este processo;

(5) Fuja dos fundos de derivativos (multimercados, hedge funds, etc.). É simples: o risco destes fundos é bem maior, falta-lhes transparência (apesar da situação no Brasil ser bem melhor que no resto do mundo) e o retorno destes instrumentos não compensa os riscos. Tome cuidado especialmente com os "gênios" que comandam estes fundos. Vários estão indo para a cadeia em certas partes do mundo.

Discussão tola

Dentro de mais alguns dias o IBGE deve divulgar o primeiro balanço do comportamento do PIB brasileiro no último trimestre do ano. Não há dúvidas, será negativo. Começará então uma discussão interminável sobre se o Brasil entrará, nos três primeiros meses do ano, em "recessão". Uma filustria da teoria econômica que define recessão como dois trimestres seguidos com o PIB negativo. É desviar a atenção do debate. Quem está perdendo o emprego não usa esta régua e este compasso. Uma economia que vinha crescendo a um ritmo de quase 6% passar para algo próximo de zero é brutal. Melhor seria mais ação.

São todos iguais ?

Na defesa que apresentou contra a representação do DEM e do PSDB, acusando o governo de usar a reunião de prefeitos em Brasília para fazer campanha eleitoral para a ministra Dilma Roussef, o advogado-geral da União, José Antonio Tofolli, incluiu o argumento de que o governador José Serra fez o mesmo com os prefeitos e secretários da Saúde em SP. E, de fato, fez mesmo. Mas um erro não justifica o outro. Os dois deveriam ser admoestados pela justiça eleitoral. Por que o governo, em vez de justificar seu mal feito (que vai prosseguir, escancaradamente) não instrui os partidos aliados para contestarem as ações tucanas nos tribunais ? Simples, a justiça pode agir e impor limites a esta desbragada campanha, com amparo de recursos públicos, que já pulula no país. Lula e Dilma estão transformando Brasília numa cidade dormitório. Aécio vai sair pelo país afora em pregação eleitoral e quer levar Serra a tiracolo. E, com a crise econômica, não se pode dizer que não haja o que fazer. Agora, imaginem se a justiça eleitoral se manifesta. Melhor é não mexer. Na oposição, muita gente condenou a representação do DEM e do PSDB por essa razão. Depois, a classe política fica indignada quando a população coloca todos os gatos no mesmo saco.

O silêncio de Ciro

Quem, em Brasília, conhece o temperamento e os humores do deputado Ciro Gomes diz que se aparecer alguém disposto a "ouvir" o silêncio do ex-ministro e quase eterno candidato a presidente da República, poderá colher uma explosão da alguns megatons. E desta vez os explosivos mais potentes não seriam endereçados aos ex-parceiros e agora adversários do tucanato.

Medo de competir - 1

Ainda em plena ressaca carnavalesca, numa daquelas coincidências comuns no setor público, o governo editou uma norma proibindo as redes comerciais e emissoras públicas estaduais oferecerem multiprogramação nos canais digitais. O sistema nipo-brasileiro permite, tecnicamente, que num único canal a emissora mostre simultaneamente quatro programas diferentes. As grandes redes de televisão eram contra essa possibilidade, alegando questões comerciais: mais programação para o mesmo volume de anúncios. Portanto, é uma "proibição" que agradou aos principais interditados e reduziu a possibilidade de aumento da competição e o direito do consumidor brasileiro de ter mais ofertas. Quando da escolha do padrão de televisão digital para o Brasil, vencido pelos japoneses contra os modelos europeu e americano, a posição das emissoras nacionais foi a favor do sistema nipônico exatamente para manter o atual status. Ganharam a disputa com o apoio decisivo do ministério das Comunicações e da Anatel.

Medo de competir - 2

Para resolver a questão do ponto adicional da tevê por assinatura, a Anatel já adiou por seis vezes suas reuniões para reestudar o assunto e não conseguiu se definir. Em outro caso, o da compra da Brasil Telecom pela Oi ela agiu em tempo recorde. Quando o interesse das empresas está em jogo (vida a história também da multiprogramação) as autoridades não vacilam muito.

Amar é...

Chega a ser comovente a paixão dos partidos políticos e das centrais sindicais pelos fundos de pensão da empresas estatais. A "gamação" do PMDB pelo Real Grandeza, de Furnas, não é caso isolado. Qual seria a razão para tanto amor? Há empresários também que gostam mais dos fundos desses fundos do que de suas próprias empresas. Quem quiser mais detalhes procure desde os ramos de telefonia a shopping centers... Dá boas histórias e amores bandidos.