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Porandubas nº 251

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Atualizado às 08:04

"A Mineirice"

Começo, hoje, com mais uma historinha de José Maria de Alkmin, ministro da Fazenda, pinçada do livro "A Mineirice", que o amigo, historiador, pesquisador e contador de "causos", José Flávio Abelha, me manda. As frases, entremeadas na Coluna, também são do livro.

Quer ir à lua ? Diga a data

Um correligionário de Bocaiúva fica meio lelé-da-cuca e surge, sem eira nem beira, no gabinete do ministro, ainda no Rio de Janeiro, onde lhe pede uma inusitada colaboração.

- Dr. Zé Maria, eu quero ir à lua e preciso da ajuda do senhor, diz o visitante.

- Isto não é problema, diz Alkmin, dando asas à imaginação do conterrâneo. Dou-lhe o apoio, de ministro e correligionário. Existe um pequeno e contornável problema, que é de definição, e só depende do amigo.
E Alkmin continua:

- Você sabe que há quatro luas: nova, crescente, minguante e cheia. Agora, compete a você escolher qual das luas o nobre amigo deseja visitar, pois o apoio está dado.

Diante de um atônito conterrâneo, o ministro levanta-se da poltrona, estende a mão para a despedida e afirma, olhando no fundo dos olhos do eleitor:

- Me procure, novamente, quando definir !

1º Biênio na Câmara

O primeiro imbróglio a ser administrado pelo vice-presidente eleito, Michel Temer, será a presidência da Câmara no primeiro biênio. Henrique Alves, líder do PMDB, disputa o cargo com Cândido Vaccarezza, líder do Governo naquela Casa. A tradição é a seguinte : quem dispõe da maior bancada pode reivindicar o comando da Câmara. O PMDB, por muito tempo, tinha essa condição. No pleito deste ano, o PT passou o PMDB : 89 a 79. Mas o PMDB, anos atrás, mesmo na ponta do ranking, cedeu a vaga ao PT. A condição era a de assumir a presidência no biênio seguinte. Houve um acordo de cavalheiros. Cumprido religiosamente. Pode o acordo ser repetido em 2011 ?

Vamos ver

O primeiro biênio é o que impõe maiores desafios. As articulações são mais intensas, as disputas mais ferrenhas. Henrique Alves aspira, há tempos, presidir a Câmara. Trata-se do deputado com o maior número de mandatos : começará o 11º mandato em 2011. Pode ceder essa ambição a Vaccarezza ? Sim. Vai depender das negociações entre os dois partidos, abarcando o número e a qualidade dos ministérios e outros postos na administração federal. O PT exibe um bom argumento : o Senado já será comandado pelo PMDB, pois ali a tradição assegura o comando ao partido com maior bancada. Henrique poderia ser motivado por um detalhe : se topar ser presidente no 2º biênio, ganharia a condição para reeleição no 1º biênio da legislatura a começar em 2013. É vantagem ?

Mas e o governo do RN ?

Este consultor coloca o argumento ao crivo de Vaccarezza com o arremate : o 2º biênio é bem mais interessante que o primeiro. O líder do governo concorda, mas acha que Henrique prefere o primeiro para preparar caminho na direção do governo do Estado em 2014. Replico : ora, mais uma razão pela opção ao 2º biênio. Estaria mais próximo ao embate eleitoral de 2014. E jogo outro condimento na conversa : Henrique só enfrentaria esse desafio caso a governadora Rosalba Ciarlini não estivesse bem na avaliação popular. Pelo que entendo de política do Rio Grande do Norte, ela fará uma administração muito colada nas demandas populares. Talvez seja por isso mesmo que Henrique queira emplacar logo, logo, a presidência da Câmara.

Temer, o árbitro

Michel Temer terá, portanto, a missão de unir os contrários, juntar as partes para evitar atritos ao Todo, as bases do governo. Além de questões inerentes ao PMDB, será uma ponte sólida do novo governo para chegar ao Congresso. Michel conhece os conjuntos parlamentares, se fez respeitar e conversa bem com todas as alas. Terá, claro, dificuldades mas aplainará terreno para que a presidente Dilma não tenha grandes dores de cabeça. A temporada de pleitos por espaços e cargos será tortuosa. O atual presidente da Câmara, escolhido como coordenador político da transição, já começou a exercitar as habilidades de articulador e harmonizador das disputas partidárias.

O que tira o sono do candidato eleito é o olhar do suplente. (Hélio Garcia)

Dilma, a identidade

O maior desafio da presidente Dilma, no primeiro momento, é a construção da Identidade. Trata-se de criar um conceito, entendido como a maneira de agir, o estilo de comando, o modo de atender as demandas, o sentido da autoridade, as características que a diferenciarão do governo Lula. É evidente que, para alcançar essa meta, Luiz Inácio terá de recolher sua condição de Senhor dos Senhores. Precisa ficar na sombra, sob pena de ofuscar o brilho de sua pupila. Quando for consultado, claro, deverá dar palpites, sugestões, sinalizar ajustes, apontar caminhos. A interferência de Lula na administração seria péssima para ele e para a nova governante.

Político é dividido em duas partes. Uma trabalha para ser eleito. A outra trabalha para conseguir um cargo público se for derrotado. (Zenun)

Criatura contra o criador ?

Não se espere que a criatura se volte contra o criador, como muitos procuram argumentar, lembrando os casos de Fleury contra Quércia e Pitta contra Maluf. O PT, tenho sempre dito, é mais que um partido. É uma religião. E se alguém, por mais poderoso que seja, se dispuser a trair o partido, estará traindo seus dogmas, suas normas, seus princípios. Seria um suicídio. Dilma não cairia jamais nessa besteira. Seria marginalizada não apenas pelo PT mas por outros aliados.

O verbo VOTAR só é verdadeiramente regular quando o eleitor é nosso. (Tancredo Neves)

E Lula, o que fará ?

Lula não se afastará da política. Seu habitat é o palanque, sua voz é a corneta de mobilização e seu prazer é o convívio com a massa, donde extrai a vitamina que oxigena seu espírito. Correrá mundo, como um caixeiro-viajante, propagando o bem que fazem seus programas sociais, a partir do Bolsa-Família. A África será o continente onde quer plantar algumas sementes. Mas seu foco continuará a ser os fundões do país, onde criou raízes desde os tempos das caravanas da Cidadania. Por isso, não se descartam novas viagens de Lula pelo território, agora sob o argumento de avaliar a seara plantada. Nisso é um craque. Entre viagens, aqui e alhures, palestras e encontros, Luiz Inácio disporá de tempo para reorientar rumos do PT e harmonizar as alas, que vivem em dissensão. O terceiro olho - o do meio da testa - contemplará horizontes mais largos.

E Serra, o que fará ?

José Serra, por sua vez, dispõe de um capital que tende a se esvair ao longo do tempo. No curto prazo, suas ações são muito valorizadas. Basta anotar que a população se dividiu quase meio a meio, com parcela ponderável adquirindo suas ações. O ex-governador, porém, amarga duas derrotas à presidência e, diferente de Lula (que também as experimentou) não tem o carisma deste. E nem a proteção do cobertor social costurado pelo lulismo. Teria à disposição daqui a 2 anos o amplo espaço da prefeitura de São Paulo. Seria certamente forte candidato, ancorado no recall da candidatura presidencial.

Muita campanha eleitoral se parece com sauna: depois de calorão vem uma ducha fria. (Zenun)

Até logo, até quando ?

Tal opção, porém, soaria como um passo atrás. Como soa estranho o anúncio de que poderá vir a ser secretário de Alckmin. O "até logo" com que agradeceu aos eleitores pode ser entendido como "voltarei assim que for possível". A visibilidade de árvore mais alta na floresta tucana faz sombra ao florescimento de novos exemplares. Seu desafio é o de se encaixar no projeto de renovação do PSDB. O partido está a exigir uma reaprendizagem na forma de fazer oposição. Precisa chegar às massas, coisa que nunca conseguiu.

E Marina, o que fará ?

Marina saiu bem na radiografia eleitoral. Poderá desempenhar o papel de indutora de novos ideários, a partir do engajamento de conjuntos médios formadores de opinião e da mobilização de segmentos jovens. Dispõe ela de boa reserva de carisma, acentuado por sua estética que evoca Gandhi. Sua ação poderá ser amplificada por núcleos da intelligentzia e setores engajados à causa ambiental. Identifica-se, ainda, com a bandeira ética, que se apresenta como símbolo da louvação nacional. A ex-senadora terá sempre boa acolhida nos palcos das grandes metrópoles. Dúvida : manterá a visibilidade ? Guilherme Leal, seu companheiro de chapa, empresário rico, vai continuar bancando os holofotes de Marina ?

Candidato que, antes da eleição, pensa que já está eleito, não é político. É poeta ! (Tancredo Neves)

PSB e Campos

Eduardo Campos faz um movimento na direção de Aécio Neves. Prestem atenção nesse rapaz. Foi consagrado na reeleição ao governo de Pernambuco. O PSB, que dirige, fez 6 governadores. Cid Gomes, o governador do Ceará, seu correligionário no PSB, lançou Aécio Neves para a presidência do Senado. Um arremesso fora de propósito, eis que na Câmara Alta preza-se muito a liturgia do poder. E a liturgia reza : quem tiver a maior bancada, leva a presidência. Sabedor disso, Aécio já anunciou que não é candidato. Mas, o ato de lançamento de seu nome por alguém do PSB é sinal de aproximação e identificação de interesses. Tudo com vistas a 2014.

Novo Código Eleitoral

Participei da Audiência Pública, promovida pelo TER/SP, para debater o Código Eleitoral e propor seu aperfeiçoamento. Estas audiências são patrocinadas pelo Senado, que formou um Grupo de Trabalho, presidido pelo ministro José Antonio Dias Toffoli, do STF. Falei sobre os desvios, ilegalidades e contrafações da campanha, destacando : a escolha de candidatos pelos partidos (sem nenhum critério), o formato defasado/saturado da propaganda eleitoral, a prevalência do marketing nas campanhas, as diferenças metodológicas e os erros das pesquisas, a falta de controle sobre condutas dos agentes públicos. As audiências públicas oferecem contribuições ao Grupo de Trabalho, que apresentará ao Senado o acervo de mudanças e aperfeiçoamentos.

Sobrevivendo

Tancredo Neves foi ex-tudo na política brasileira. Voltando à crista da onda, explica a um correligionário como conseguiu sobreviver após 64 :

- Aceitando o impossível, passando sem o indispensável e suportando o intolerável. Afinal, sou mineiro !

Blocos partidários

A movimentação para formação de blocos partidários começou. Os primeiros ensaios mostram que o PR e o PP podem formar um bloco, somando 82 deputados na Câmara. A estes dois partidos, poderá se somar o PTB, e o bloco chegaria, então, a 103 deputados. O segundo bloco, que está sendo articulado, juntaria PSB, PDT, PC do B e PRB. PT e PMDB, por enquanto, não falam de blocos.

O preço do voto de um eleitor mentiroso é sempre o mais caro. (Augusto Zenun, mineiro, político, industrial e filósofo)

O oxigênio do DEM

O DEM abriga um conjunto de grandes parlamentares, dentre eles, alguns muito aguerridos como Paulo Bornhausen, ACM Neto, o próprio Rodrigo Maia, Ronaldo Caiado etc. Esse grupo encarna um forte ideário. Ademais, o partido acaba de eleger dois governadores, Raimundo Colombo (SC) e Rosalba Ciarlini (RN). E tem um dos mais hábeis quadros da política nacional, um exímio articulador : o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Portanto, trata-se de um partido com muito oxigênio para gastar nos próximos verões e invernos da política. Fala-se em fusão do DEM com o PMDB. Se isso vir a ocorrer, um dia, seria um sopro de renovação no PMDB, que carece de sangue novo. É evidente que essa operação, para ocorrer, precisa levar em conta os interesses e as bandeiras dos dois partidos.

Conselho aos novos governantes

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado aos eleitores. Hoje, volta sua atenção aos novos governantes :

1. Tentem interpretar o sentido do voto e ouçam o clamor das ruas.

2. Procurem sair do ramerrão dos velhos pacotes e procurem inovar nas ideias, no estilo de gestão, na escolha de quadros, na articulação política.

3. Estabeleçam mecanismos eficazes de controle da eficácia governamental, evitando cair nas velhas rotinas da administração pública. Antes de 1º de janeiro, há um bom tempo para buscar a inspiração em modelos e formatos que estão dando certo.

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