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Porandubas nº 521

quarta-feira, 15 de março de 2017

Atualizado às 07:57

Abro a coluna com um dos fundadores da velha UDN.

O poder é como a água

1945. O Brasil inaugura a redemocratização. Hermes Lima, fundador da UDN, deputado constituinte, ex-presidente do STF, foi ao Nordeste conseguir apoio de democratas ilustres para fundar outro partido, o Partido Socialista Brasileiro. Em João Pessoa, procurou Luís de Oliveira:

- Luís, o socialismo é como aqueles gramados dos castelos da Inglaterra. Cada geração dá por eles um pouco de si. Um jardineiro planta, o filho cuida, o neto poda. E vai assim, de geração em geração, até que, um século depois, torna-se o que é.

- Doutor Hermes, me desculpe, mas não vou entrar não. Gosto muito do socialismo, mas vai demorar muito. Eu quero é o poder. E o poder é como água. A gente tem que beber na hora.

(Da verve do amigo Sebastião Nery).

Escola para quê?

O presidente Dutra tinha um auxiliar capixaba, oficial do Exército, gago. Quando Dutra dava uma ordem, ele ficava mais gago ainda. Resolveu dar um jeito de curar a gagueira. Soube que o Méier tinha uma escola para gagos, tocou para lá. O endereço que levou não coincidia. Procurou no bairro todo, nada. Foi ao português da esquina, desses de bigode e tamanco, cara de quem desceu na praça Mauá:

- O sesenhor popopodia me inininformar se aaaqui temtem uma escola para gagagago?

- Mas o senhor já fala gago tão bem, para que quer escola?

(Do acervo do imperdível Sebastião Nery).

Lista de Janot

O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou ao STF 83 pedidos de inquérito e outros 211 para instâncias inferiores, que abrigariam cerca de 400 nomes. É o que se diz. O STF deve ficar com os nomes que têm foro privilegiado e devolver à 1ª instância os outros. Há um clima de expectativas no Planalto Central.

Quanto maior...

A tese que ganha corpo é a de que quanto maior o número de envolvidos, melhor para todos. Porque os efeitos se distribuiriam horizontalmente, os impactos sobre alguns nomes seriam diluídos e amortecidos, e, acima de tudo, porque a montanha de nomes demandaria oitivas e oitivas, provas e contraprovas, fazendo rolar a lista de Janot quilômetros à distância.

Abertura de sigilo

Ganha corpo a quebra de sigilo dos casos que chegarão ao STF nos próximos dias, talvez ainda esta semana. A decisão será do ministro Edson Fachin. A classe política defende a abertura das informações sob o argumento de que, sabendo onde e como estão arrolados, os envolvidos já começariam a prover suas defesas. Com isso, seriam evitados vazamentos, que tendem a ser mais sensacionalistas e a provocar celeuma nos ambientes da representação e do governo.

Janot desperta ira

Janot começa a despertar ira entre seus pares pela sinalização de que gostaria de ganhar mais um mandato na Procuradoria. Há gente na fila que quer tomar seu lugar. A permanência de Janot dependerá de suas próximas decisões? Essa é a pergunta que se apresenta na esfera política. Deixemos a resposta ao crivo dos leitores.

Congresso inerte?

Como as Casas congressuais reagirão à lista de Janot? A tese mais comentada é a de que tenderiam a certa inércia, mostrando desinteresse do corpo parlamentar para as matérias que constam da agenda. Seria isso muito ruim para o Executivo. Os parlamentares gostariam mesmo de agir em sua defesa, o que apontaria para uma pauta que contemplasse seus interesses, como, por exemplo, a anistia ao Caixa 2.

DNA da cultura

A propósito, nos últimos dias tem sido fortalecida a ideia de que o Caixa 2 faz parte do DNA da política nacional. Cresce o número de importantes fontes que deixam o Caixa 2 suavizado. Trata-se de uma ilegalidade, afirmam, mas não necessariamente é o cofre da corrupção. Gilmar Mendes, ministro do STF, e José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça e ex-advogado da ex-presidente Dilma, são duas ilustres figuras que expressam essa visão. Se a tese vingar, parcela ponderável da classe política sairá do caldeirão fervendo para a panela de água morna.

Repatriação

O Senado aprovou o novo projeto de repatriação de recursos. Ele deverá trazer uma boa bolada de dinheiro, algo entre R$ 15 a R$ 20 bilhões. Continuam as restrições à repatriação de recursos de familiares de políticos.

A sequência das reformas

A agenda do Executivo está fechada com esta sequência: primeiro, a PEC do Teto (aprovada); segundo, a reforma educacional com foco no segundo grau (aprovada); terceira, o primeiro momento da reforma trabalhista, com a votação na Câmara do PL 4302 (especialização de serviços/terceirização) e votação do PLC 30 no Senado (mesmo teor). Na Câmara, o presidente Rodrigo Maia quer colocar em pauta dia 21 de março; no Senado, a votação seria logo depois. Na quarta etapa, a segunda parte da reforma trabalhista (PL 6787/16), que tem relatoria do deputado Rogério Marinho. Trata de coisas como o acordado prevalece sobre o legislado e estende os prazos do Trabalho Temporário.

A montanha

Na quinta etapa, os congressistas subirão ao pico da montanha, escalando a Reforma da Previdência. Que será a mais complicada e a que mais recebe críticas da sociedade. Pelo andar da carruagem, o governo deverá ceder em alguns pontos para que o Congresso aprove a reforma possível, não a ideal. A base governista começa a ser instrumentalizada com dados e informações de modo a compreender o corpo das propostas. Essa reforma deverá entrar em pauta em junho ou mesmo julho, antes do recesso. Serão essas as reformas do primeiro semestre.

A grita nas ruas

As ruas certamente se encherão de gente e a grita contra algumas reformas dará o tom ambiental das próximas semanas. As Centrais Sindicais continuarão a fazer barulho. Mas já não possuem o vigor de antigamente. Ademais, nem todas pensam de maneira homogênea. Os ruídos poderão fazer efeito em alguns ouvidos, mas a lógica que orienta as decisões sobre o difícil momento em que vive o país acabará empurrando o conjunto político para a decisão de fazer as reformas.

A cobertura midiática

É visível a divisão entre os jornalistas que acompanham as cenas política e econômica. Há, visivelmente, alguns grupos ditando a expressão: 1) o colunismo político, que assume um posicionamento contrário ao governo, enchendo seus espaços com críticas e denúncias; 2) o colunismo econômico, onde economistas dividem com jornalistas os campos da expressão, ambos, porém, expressando simpatia e apoio às medidas para resgatar a economia; 3) o colunismo partidário, ocupado por um grupo de profissionais e de meios que tomam partido sob o viés partidário; grupo engordado por alguns intelectuais que fazem questão de frequentar listas de apoio; 4) mídias sociais, onde militantes e simpatizantes abrem intensa querela em torno de perfis que admiram e/ou combatem.

O voto no mais próximo

O eleitor aumenta sua desconfiança na política e em seus protagonistas. É o que se infere das pesquisas. E que impacto isso terá nas urnas? Muito. O eleitor tenderá a votar em que está mais próximo dele. A proximidade é, portanto, um vetor a sinalizar tendências. O sistema de voto estará entre essas modalidades: voto em lista fechada e definida pelo partido; sistema misto, com parte de candidatos de uma lista fechada e parte aberta; distritão, em que cada Estado será um distrito, devendo se eleger os mais votados.

Fundo

O Parlamento mostra vontade de abrir um novo fundo partidário, formado com recursos do Estado. A cada real ofertado pela iniciativa privada, haveria correspondência da mesma quantia proveniente de recursos públicos. O objetivo é formar um fundo de R$ 4 a R$ 6 bilhões. Dará muita polêmica essa proposta. E o pior é que o Fundo Partidário continuaria normalmente.

Lula a jato

Lula é rápido e rasteiro nas respostas aos juízes da Lava Jato: é "quase" vítima de um massacre, quer que a Lava Jato vá fundo nas investigações, não tem nada a temer. Ontem, delações apontavam para R$ 23 milhões sendo destinados a ele. Vitimização - eis o escudo de Luís Inácio.

Doria, um obstinado

João Doria é um obstinado. Queria ser prefeito. Poucos acreditavam. Elegeu-se. Disse que iria governar na rua. E está indo. Prometeu acabar com as filas na saúde. Ainda não conseguiu, mas está dando passos avançados. João quer registrar seu nome na história da política como gestor. Podem anotar: vai conseguir. Candidatura em 2018? Minha velha mãe sempre diz: meu filho, nunca diga - desta água não beberei.

Michel, o confessionário

Como o presidente Michel Temer alcança tantas vitórias no Congresso? Com sua habilidade de ouvidor. Trata-se de um perfil afeito aos ouvidos da política. Os parlamentares conversam com ele como se estivessem no confessionário. E depois de dois padres nossos e três ave-marias, saem muito satisfeitos. Michel Temer é um exímio articulador político.

Política como espetáculo I

O discurso estético tem muito a ver com os recursos teatrais. Com efeito, a teatralização é imanente à política. Os atores políticos contemporâneos procuram aperfeiçoar sua performance com recursos técnicos da mídia eletrônica e do teatro. Hitler treinava a voz e os gestos. Mussolini, com sua voz de bronze e máscara imperial, espelhava-se em D'Annunzio, guerreiro-tribuno. A história antiga é cheia de exemplos que mostram os governantes posando de ator, alguns com feições de comediantes, outros encarnando o perfil de estadistas. Luís XIV, conta Schwartzenberg, fazia exibição de danças. O marechal Pétain tomava aulas de dicção para diminuir a timidez. O próprio De Gaulle dizia que "os maiores medem cuidadosamente as suas intervenções, fazendo delas uma arte".

Política como espetáculo II

A política está cada vez mais espetacularizada. Os políticos transformam-se em vedetes, procurando, por todos os meios, suprir a falta de carisma. E se inserem no olimpo da cultura de massas, de que nos fala o sociólogo francês Edgar Morin (Cultura de Massas no século XX). A mídia transforma os olimpianos em vedetes da atualidade, investindo-os de um papel mitológico, mergulhando em suas vidas privadas, extraindo delas a substância humana que propicia os fenômenos psicológicos da projeção e da identificação. Quanto mais alto o cargo, mais espaço na mídia, mais projeção ganha na mente dos espectadores. O charme pessoal de alguns gera um gigantesco processo de identificação. O presidente Kennedy era um exemplo de olimpiano charmoso.

Política como espetáculo III

O vedetismo do poder pode ser explicado pela psicologia. As pessoas percebem no ator político situações afetivas que lhe são próprias. Identificam-se com ele. E se satisfazem. Trata-se do fenômeno de autovalorização por meio de um herói interposto. Freud também explica: "A maioria das pessoas experimenta a imperiosa necessidade de admirar uma autoridade, perante a qual possa inclinar-se e pela qual seja dominada e por vezes maltratada". De outra forma, as pessoas querem acreditar no que vêem, confiando, assim, nos perfis inventados, que procuram representar a realidade. Muitas vezes, têm dificuldades em distinguir o real do falso. Os atores políticos, interpretando intuitivamente essa situação, observando o mundo ao redor, espelham o cotidiano em seus hábitos, modos de agir e até nas vestimentas. Usam a técnica da realidade espelhada.

Getulianas

Getúlio Vargas caprichava nas frases. Eis algumas de sua verve:

- Eu não sou um oportunista. Sou um homem das oportunidades. Se um cavalo passar encilhado na minha frente, eu monto.

- A Constituição é como as virgens. Foi feita para ser violada. (p.s. hoje, uma frase politicamente incorreta)

- Quem não aguenta o trote, não monta o burro.

- Inimigos não sei se os tenho. Mas, se os tiver, não serão jamais tão inimigos que não possam vir a ser amigos.

- A metade dos meus homens de governo não é capaz de nada e a outra metade é capaz de tudo.

- Quase sempre é fácil encontrar a verdade. Difícil é, uma vez encontrada, não fugir dela.

- Eu sempre desconfiei muito daqueles que nunca me pediram nada. Geralmente os que sentam à mesa sem apetite são os que mais comem.

- Os políticos olham muito o passado, se esquecem do presente e, principalmente, do futuro. Mas é perigoso este cacoete, pois quem muito olha para trás acaba torcendo o pescoço.