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Porandubas nº 814

quarta-feira, 26 de julho de 2023

Atualizado às 07:39

Abro com a hilária historinha do amigo Sebastião Nery.

Ô jardineira...

Na cidadezinha do norte do Rio de Janeiro, a procissão de Senhor Morto caminhava lenta e piedosa, na sexta-feira da Paixão, com o povo cantando, de maneira compungida, os hinos sacros. O velho padre na frente, o sacristão ao lado e os fiéis atrás, cantando as músicas que o vigário puxava. De repente um pequeno ônibus, que na região chamam de "jardineira", passou perto e começou a subir a íngreme ladeira da igreja, bem em frente da procissão. No meio da ladeira, a "jardineira" afogou, encrencou, parou, deu aceleradas fortes e inúteis e começou a dar para trás, de costas. Os fiéis não viram, mas o padre, atento, viu. E ficou apavorado. A "jardineira" já despencava numa grande velocidade. O padre gritou:

- Olha a jardineira!

E os fiéis começaram a cantar, em ritmo de samba:

- Ô jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu? Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu.

A "jardineira" descambou ladeira abaixo, até que parou. Não atropelou ninguém. Sob o olhar do Senhor Morto! Mas os fiéis não aguentavam de tanto rir.

Pergunta que não cala

A pergunta continua no ar. Quem mandou matar Marielle Franco? Vou dar a resposta: o Brasil encapuzado. O Brasil do crime organizado. O Brasil dos bandidos das drogas, dos assassinos que comercializam as mortes, dos oportunistas e dos esquemas de apropriação ilícita do dinheiro público. Estourar o Brasil da arbitrariedade é meta impossível, mas diminuir seu tamanho é dever inarredável dos homens públicos e da sociedade organizada, sob pena de vermos cada vez mais fraquejar o ideal da democracia como governo do poder visível.

Malhas da corrupção

A tarefa em desvendar os poderes ocultos e as malhas de corrupção e de violência institucionalizada, que se processa no âmbito político e na esfera dos meios de comunicação, tem sido didática e de alta relevância para a conscientização da sociedade. A estratégia de combate aos poderes invisíveis, voltados para a arbitrariedade e a rapinagem, requer a força da pressão coletiva, mais que simples castigos aos criminosos. Não adianta prender um ou dois. Urge prender todos os integrantes do poder invisível.

A ambição desmesurada

No meu livro Marketing Político e Governamental, cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará, constantemente os que a apóiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder".

O Brasil subterrâneo

Na área do Brasil subterrâneo, são bastante disputados os jogos de interesse entre políticos; entre políticos e grupos econômicos; entre tecnocratas dos governos (Federal, estadual e municipal) e empresários; e facínoras. Os grupos se multiplicam em subgrupos, formando uma esteira que desce do topo até as bases da sociedade, onde nadam os "bagrinhos" levados pela onda dos grandes "tubarões". Na área do Brasil arbitrário e violento, o campeonato é disputado, entre outros, por contingentes marginais das drogas, pelo aparato policial e pelos dois sistemas conjuntamente, que frequentemente jogam no mesmo time. E não se pense que o sistema jurídico está fora disso tudo. Não. A corrupção e a arbitrariedade também imantam perfis de parcelas do sistema judiciário, na forma de decisões injustas, parcialidade em julgamentos, enfraquecimento de posições, atenuação de culpas, vistas grossas a processos, prejulgamentos e desvio de padrões condizentes com a missão da Justiça.

Sentimento de descrença

Os comportamentos tortuosos de representantes e agentes de todos os setores da vida produtiva e do sistema institucional do país acabam estabelecendo uma densa camada de insensibilidade social e fortes manchas nos padrões morais e éticos. Além, é claro, de contribuírem para o estiolamento das instituições nacionais. A escalada do caos resulta na sensação geral de incredibilidade, descrença, frieza, mesmice, eixos da cultura de acomodação que amortece o tecido social. Os súbitos ciclos de sensibilização, fruto de violências explícitas do aparelho policial e de denúncias sobre grandes escândalos, chegam até a criar na sociedade um desejo de participação e um sentimento de indignação.

Lutar pela plena cidadania

Mas os sentimentos de repúdio tendem a cair no vazio, por não encontrarem mecanismos de continuidade capazes de deixar sempre acesa a chama da consciência coletiva. Essa meta só será conseguida quando o mais humilde dos cidadãos decidir abandonar o anonimato das massas para se transformar em agente ativo de sua própria história. Daria ele, assim, um gigantesco passo rumo à plena cidadania.

A conquista da cidadania

O povo, em suas extremas carências, tem dificuldades de exercer sua cidadania. Sua autonomia de decisão é escassa e tênues são suas vontades. Em consequência, submete-se, como entidade passiva, à opressão dos discursos e a uma engenhosidade operacional e técnica que acaba sugando suas emoções. Vota em candidatos salvadores da pátria, confia em promessas e propostas e morre na praia dos desconfortos. Quando se abre a portinha do lamaçal, começa-se a desvendar a identidade cultural da política brasileira e a hipocrisia das elites. Estas são verdadeiramente as fontes do poder corrupto.

Quem acredita em CPI

Instalam-se CPIs, a dos movimentos golpistas de 8 de janeiro, a do MST. Ora, ninguém aposta em seus resultados. É espetáculo. O Congresso quer desfiar o novelo das mazelas? Ora, já sabemos qual sua extensão. Muitos parlamentares são eleitos por meio de uma engrenagem viciada, que não resistiria a um bom código de ética. Não faz bem ao Congresso tirar proveito da crise para melhorar sua imagem, se, em paralelo, ele não tomar decisões a respeito dos mecanismos eleitorais, da reforma partidária e do sistema de representação política.

Mudança? Coisa longínqua

As figuras que comandam o processo político dominam a cena política nacional há bastante tempo. Vejam Arthur Lira. Representa ele mudança? Respira ar novo? O populismo aparece como arma de mistificação das massas e os truques das denúncias funcionam mais como altar de visibilidade do que como ato de patriotismo. Constituem uma espécie de para-choque do grupismo em que se transformou o sistema político. A mudança política é uma meta de longo prazo. Significa reordenamento nas instituições e redefinição de padrões e valores.

Defesa e ataque

"A invencibilidade está na defesa; a possibilidade de vitória, no ataque. Quem se defende mostra que sua força é inadequada; quem ataca, mostra que ela é abundante". (Sun Tzu)

  • Parte II

Raspando o tacho

- Mais uma semana teremos um raio-x completo ou quase? Do caso Marielle Franco.

- Lula deve fazer um tremendo esforço para suportar as dores na bacia. Tenho artrose no joelho, coloquei prótese e sei bem como é viver com essas dores. O mau humor se instala.

- Vem uma reforminha ministerial por aí. Lula vai ser compelido a fazê-la.

- O futebol feminino é um bailado que não se vê no futebol masculino.

- Sonho cheio: Os Bolsonaros querem eleger como senadora/senadores, Michele, Eduardo e Flávio. Três de uma vez.

- Hoje, 26 de julho, é dia de Senhora Santana, a padroeira de minha cidade, Luis Gomes, na tromba do elefante, como é o mapa do RN. Extremo oeste.

- Ouvi de um empresário que Paulo Guedes derrete-se de elogios a Fernando Haddad.

- Continuo achando que Janja faz muito bem ficando perto de Lula. Como Elizabeth Trudeau, não quer ser apenas uma rosa na lapela do marido. (Mãe do atual 1º ministro do Canadá, Justin Trudeau, primeira-dama na época do 1º ministro Pierre Trudeau). A socióloga tem conteúdo.

- Quem está se entusiasmando com a visibilidade em crescimento é o governador Romeu Zema, de Minas Gerais.

- O calor na Europa e EUA bateu na consciência dos sofridos.

- A direita ganha volume em alguns países, nos últimos tempos.

- Transferir a cracolândia dos Campos Elíseos para o Bom Retiro, como chegou a propor Tarcísio de Freitas, o governador de SP, é trocar seis por meia dúzia.

- Em três mandatos, atual governabilidade de Lula é a mais baixa.

- O El Nino é responsável pelas mudanças climáticas. Seca no Norte e chuvas no Sul.

- Biden se arrisca a perder as eleições nos EUA.

Fecho a coluna com pequenas lições de marketing eleitoral.

- Saber ler corretamente o meio ambiente, os novos valores do eleitorado e as motivações de voto.

- Escolher o discurso para o momento adequado.

- Definir segmentos-alvo do eleitorado.

- Selecionar sólidos reforçadores de decisão de voto.

- Descentralizar a campanha para multiplicar pontos de eco e agregar organizações intermediárias.

- Compor programa simples, objetivo, factível.

- Trabalhar com modelos diferenciados de pesquisa.

- Programar ações de surpresa e impacto

- Organizar estrutura adequada e estabelecer cronograma prevendo: lançamento da campanha (junho); crescimento (julho - 1ª quinzena de agosto); consolidação / maturidade (segunda semana agosto - primeira quinzena de setembro); clímax (segunda quinzena de setembro - semana da eleição); declínio (evitar que esta fase ocorra antes da eleição).

- Garantir meios e recursos.