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Porandubas nº 833

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Atualizado às 08:11

Bom Dia. Abro com os "ocro".

"Só quero os ócro"

O oftalmologista Manoel Teixeira de Araújo recebeu a mulher em seu consultório, em São João do Sabugi, para um exame de vista. Convidou a paciente para ler a tabuleta, para a qual apontava: "Por favor, a senhora pode ler estas letras"? Em sua sertaneja ingenuidade, a mulher respondeu com calma e muita convicção: "Doutor, ler mesmo eu não sei não, mas essa menina que tá aqui pode fazer isso por mim. O que eu quero mermo é os ócro. Só os ócro". Divertido causo narrado por Valério Mesquita (RN).

Na primeira Parte da coluna, tento esboçar o perfil do eleitor brasileiro.

Fatores para decisão

Quando um eleitor opta por um candidato, que fatores balizam sua decisão? Esta é uma das mais instigantes questões das campanhas. A resposta abriga componentes relacionados ao conceito representado pelo candidato e ao ambiente social e econômico que cerca os eleitores. No primeiro caso, o eleitor leva em consideração valores como honestidade/seriedade; simplicidade; competência/preparo; capacidade de comunicação; entendimento dos problemas; arrogância/prepotência e simpatia. Sob outra abordagem, o voto quer significar protesto, um castigo aos atuais governantes e a candidatos identificados com eles, vontade de mudar ou mesmo aprovação às ideias dos perfis situacionistas. Neste caso, os pesos da balança assumem o significado de satisfação e insatisfação; ou confiança e desconfiança.

Qual é a prioridade?

A questão seguinte é saber qual a ordem em que o eleitor coloca essas posições na cabeça e por onde começa o processo decisório. Não há uma ordem natural. O eleitor tanto pode começar a decidir por um valor representado pelo candidato - simpatia, preparo, capacidade de comunicação - como pelo cinturão social e econômico que o aperta: carestia, violência, desemprego, insatisfação com os serviços públicos precários etc. Os dois tipos de fatores tendem a formar massas conceituais - boas e ruins - na cabeça do eleitor. A exposição dos candidatos na mídia vai criando impressões no eleitorado. E as impressões serão mais positivas ou mais negativas, de acordo com a capacidade de o candidato formular ideias e apresentar respostas aprovadas ou desaprovadas pelo sistema de cognição dos eleitores.

O bolso e a saúde

E daí, qual a lógica para a priorização que o eleitor confere às propostas de candidatos? Nesse ponto, cabe uma pontuação de natureza psicológica. As pessoas tendem a selecionar coisas (fatos, ideias, eventos, perfis) de acordo com os instintos natos de conservação do indivíduo e preservação da espécie. Ou seja, o discurso mais impactante e atraente é o que dá garantias às pessoas de que elas estarão a salvo, seguras, alimentadas. O discurso voltado ao estômago do eleitor, ao bolso, à saúde é prioritário. Tudo que diz respeito à melhoria das condições de vida desperta a atenção. Depois, as pessoas são atraídas por um discurso mais emotivo, relacionado à solidariedade, ao companheirismo, à vida familiar.

Credibilidade, eis a questão

Esses apelos disparam os mecanismos de escolha. Se a insatisfação social for muito alta, os cidadãos tendem a se abrigar no guarda-chuva de candidatos da oposição. Se candidatos com forte tom mudancista provocarem medo, as pessoas recolhem-se na barreira da cautela, temendo que um candidato impetuoso vire a mesa abruptamente. Assim, mesmo com certa raiva de candidatos apoiados pela situação, os eleitores assumem a atitude dos três macaquinhos: tampam a boca, os ouvidos e olhos e acabam votando em candidatos situacionistas. O maior desafio de um candidato de oposição, dentro dessa lógica, é o de convencer o eleitorado de que garantirá as conquistas dos seus antecessores, promovendo mudanças que melhorarão a vida das pessoas. Simples promessa não adiantará: é preciso comprovar tim-tim por tim-tim como executará as propostas.

Coerência

Por isso mesmo, quando o candidato agrega valores positivos, a capacidade de convencimento do eleitor será maior. Não se trata apenas de fazer marketing, mas de expressar caráter, personalidade, a história do candidato. Uma história amparada na coerência, na experiência, na lealdade, na coragem e determinação de cumprir compromissos. Proposta séria e factível transmitida por candidato desacreditado não colará. Os dois tipos de componentes que determinam as decisões do eleitor - as características pessoais dos candidatos e o quadro de dificuldades da vida cotidiana - caminham juntos, amalgamando o processo de decisões dos cidadãos.

Racionalidade

Os estímulos começam com a apresentação pessoal dos candidatos, a maneira de se expressar, de se vestir. Os cenários aguçam ou atenuam a atenção. A fluidez de comunicação, a linguagem mais solta e coloquial cria um clima de intimidade com o eleitor. As propostas precisam ser objetivas, claras e consistentes. As influências sociais e até as características espaciais e temporais despertam ou aquecem as vontades. O eleitor é uma caixa-preta. O eleitor está cada vez mais desconfiado e crítico. Não quer comprar gato por lebre. Aumentou sua taxa de racionalidade. Desvendar o quê e como pensa é o maior desafio dos candidatos.

Mais ou menos

A tipologia humana essencialmente brasileira se rege por um alfabeto nítido que começa com a parte mais visível, que é a cor da pele. Os morenos e os pardos, que carregam a mistura do sangue do branco colonizador, do negro e do indígena, são a própria expressão da cultura do mais ou menos que sua pele exibe. "Quantas horas trabalha por semana? Mais ou menos 40 horas. É religioso? Sou católico, mas não praticante. Ou, ainda: sou ateu, graças a Deus". Ora, a tendência de querer ficar no meio termo ainda é reforçada pela condição de contemporizador, que transparece nas frequentes locuções "deixar estar para ver como fica", "deixa pra lá", "fulano está empurrando com a barriga".

Dubiedade

Traços de incerteza e dubiedade caracterizam o perfil do eleitor, fruto, aliás, dos elementos de improvisação que se fazem presentes no caráter nacional. Há nisso alguma indicação de displicência? Sem dúvida e este é outro matiz do nosso perfil. As decisões, que identificam uma forte cultura de protelação, são deixadas para a última hora na esteira de um comportamento que se identifica com um misto de lerdeza e negligência, despreocupação e negação de critérios de prioridade. Quem não tem na ponta da língua exemplos de obras mal construídas, trabalhos malfeitos, acabamentos defeituosos, sujeiras nos lugares públicos?

Imediatismo

O brasileiro é imediatista. Tem prazer pelas coisas que lhe trazem conforto ou benefício imediato. Daí não se interessar pela macropolítica, a política dos grandes projetos, das grandes obras que gerarão efeitos benéficos no longo prazo. Mas é exigente em relação às coisas de seu cotidiano: a escola perto da casa, o transporte fácil, a segurança na rua, a comida barata, o emprego perto de casa. Sob tal aspecto, os candidatos terão de contemplar esses contingentes eleitorais - que constituem a grande maioria - com propostas de fácil compreensão e alto impacto para o bolso.

Infiel

O eleitor brasileiro é fiel? No sentido abrangente, mais coletivo, a resposta é não. Há grupamentos fiéis, particularmente entre estratos médios, formadores de opinião, segmentos engajados nos partidos, setores religiosos, imigrantes de sangue anglo-saxão e pequenos núcleos ideológicos. Os grandes contingentes são amorfos, alheios ao cotidiano político e capazes de mudar de posição, de acordo com as circunstâncias e as necessidades mais imediatas. A infidelidade do eleitor tem a ver com a incultura política que semeia florestas de desinteresse pelos espaços nacionais, incluindo os centros mais evoluídos.

Pessimista

Os vetores de decisão do eleitorado são influenciados, ainda, por dois elementos que parecem paradoxais. De um lado, um pessimismo galopante, que se faz presente nas locuções de que o "o país não tem jeito, estamos todos perdidos, não vale a pena lutar por isso etc., etc.". De outro, um otimismo extravagante, que evidencia a superlativa dose emotiva da alma nacional. Nesse sentido, as alavancas de força se apresentam nas festas de época e fora de época, no Carnaval, nas folias cotidianas dos bares e até na esteira da bagunça que, em maior ou menor grau, transparece na fisionomia das cidades, na improvisação dos motoristas de trânsito e na linguagem desabrida das ruas. O pessimismo induz o eleitor a se afastar dos políticos, que, indistintamente, ganham a pecha de "ladrões e corruptos".

Imprecação e exageros

Os perfis populistas e messiânicos é quem levam a melhor, ao sintonizarem a linguagem com a imprecação popular. Não por acaso, o chavão "bandido bom é bandido morto, lugar de bandido é na cadeia", toca forte no coração das massas. Já o otimismo de nuances ufanistas, cuja origem remonta os passos iniciais da descoberta das belezas naturais, da exuberância da flora e da fauna, marca o caráter nacional com os selos da displicência, da sensualidade, do ócio e da pachorra. As grandezas do Brasil afloram e são apresentadas pelas embriagadas quantificações de nossos potenciais: o maior carnaval, o maior São João do mundo, o maior produtor disso e daquilo, as mulatas mais bonitas, as melhores iguarias e algumas maravilhas do mundo.

A busca da catarse

Se o pessimismo é oposicionista, o otimismo tropical é situacionista, ou, em outras palavras, tende a reforçar o status quo. Infere-se, assim, que a crença da vitória do Brasil nas Copas sempre faz a catarse coletiva. E a catarse, com suas vertentes de emoção, vibração, êxtase e felicidade, acaba purgando pecados acumulados. Trata-se de uma formidável estrutura de consolação da sociedade. A consequência se fará presente na maior complacência dos eleitores ao analisarem os quadros de amargura e angústia que os afligem.

  • Parte II

Raspando o tacho

- Javier Milei nomeia a irmã como secretária-Geral da presidência da Argentina. Na verdade, uma espécie de superministra.

- Bolsonaro teria sido impedido de participar da foto oficial de Milei com as autoridades mundiais presentes à posse. É verdade que alguns presidentes vetaram sua presença? Como? Avisando ao cerimonial? Estranho.

- A cratera de Maceió é um gigantesco buraco eleitoral, com impacto nas urnas de 2024.

- Marcelo Alecrim, o super-empreendedor potiguar, foi anunciado pré-candidato à prefeito de Natal em 2024. Este escriba acha que Alecrim preferirá contemplar a cena eleitoral da rede de sua bela casa praiana.

- O prefeito Álvaro Dias, de Natal, é um gestor muito bem avaliado.

- Ronaldo Caiado exibe boa performance em pesquisas do Instituto Paraná Pesquisas. Em um cenário, bate Lula com 40,4% contra 20,9%. Tarcísio de Freitas teria 12,5% e Ciro Gomes 6,2%, Romeu Zema, 4,1%. Se as eleições presidenciais fossem hoje.

- Como Javier Milei governará sem apoio do Congresso? E sem plata?

- Falta coerência ao Brasil em matéria de condenação dos combustíveis fósseis. Então, evite incentivar exploração de novas fronteiras de petróleo.

- Lula foi pego de surpresa com o espetáculo circense de Nicolas Maduro.

- Renan Calheiros denunciou a Braskem: crônica de um desastre anunciado. A cratera em Maceió.

- Pelo que se percebe, Aloysio Mercadante está feliz na presidência do BNDES.

- Como é possível? A pior gestão da improvisada Dilma Rousseff lhe confere o título de economista de 2023? Afinal, quem conferiu este galardão? Entidades que prezam fazer loas?

- Tempos de calor extremos nos esperam no verão.

Fecho a coluna com a mineirice de Zé Abelha.

As três pessoas

No confessionário, Monsenhor era rápido. Não gostava de ouvir muita lengalenga. Ia logo perguntando o suficiente e sapecava a penitência que, sempre, era rezar umas ave-marias em louvor de N. S. do Rosário. Fugindo ao seu estilo, certa feita ele resolve perguntar ao confessando quantos eram os mandamentos da lei de Deus.

- São 10, Monsenhor.

- E quantos são os sacramentos da Santa Madre Igreja?

- São 7, Monsenhor.

- E as pessoas da Santíssima Trindade, quantas são?

- São 3, Monsenhor.

Monsenhor, notando que o confessando só sabia a quantidade, pergunta rápido:

- E quais são essas pessoas?

A resposta encerrou a confissão:

- As três pessoas são o senhor, o Dr. Didico e o Dr. Zé Augusto.

(Historinha contada por José Abelha em A Mineirice).