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O novo entendimento do STF sobre o crime de quadrilha ou bando

O desenrolar da AP 470 vem denotando diversas posições inusitadas de nossa Suprema Corte.

domingo, 9 de março de 2014

Atualizado em 7 de março de 2014 15:55

O desenrolar da Ação Penal 470 (popularmente conhecida como "julgamento do mensalão") vem, continuamente, denotando diversas posições inusitadas de nossa Suprema Corte, com interessante relevo para a mudança da composição deste Tribunal durante o julgamento da ação. Quando proferida a decisão final o leigo em Direito tinha entendimento de que as penas fixadas seriam mantidas, uma vez que não comportava recurso para combatê-las e revisá-las, por se tratar da última instância recursal.

Em relação ao tema sub studio, previsto no "antigo" artigo 288, do Código Penal, tinha-se que era exigida a presença de, no mínimo, quatro pessoas que comungassem da mesma homogeneidade subjetiva com a finalidade de praticar crimes (dando-se grande destaque ao plural - "crimes" - para tipificação da conduta).

No mais, diferenciava-se a quadrilha do bando levando-se em conta o lugar da atuação: na cidade, quadrilha; no campo, bando.

Porém, na ação penal 470, o STF inovou substancialmente em alguns pontos críticos do julgamento. Ao aceitar a interposição dos embargos infringentes, mudou seu entendimento sobre o tema, vez que sua composição já não era a originária e revisou um julgamento já sedimentando pelo Pleno da Corte.

Desta feita, em uma nova análise, o STF passou a exigir que não bastam apenas três pessoas ou mais atuando para cometer crimes. Há, ainda, um plus: uma especificidade da conduta. Conforme a ministra Rosa Weber:

"O ponto central da minha divergência é conceitual. Não basta que mais de três pessoas pratiquem delitos. É necessário mais. É necessária que se faça para a específica prática de crimes. A lei exige que a fé societatis seja afetada pela intenção específica de cometer crimes."

Já os novos ministros entenderam que as condutas dos réus não carregavam conteúdo de reprovação para perturbar a paz pública (bem jurídico tutelado pelo artigo 288, CP), já que houve uma reunião de práticas criminosas diferenciadas que tinham como objetivo a obtenção de vantagens indevidas para interesses específicos dos envolvidos, e não perturbar a paz pública.

Não se pode perder de vista a grande alteração legislativa ocorrida em agosto de 2013: a lei 12.850/13 alterou profundamente o artigo 288, CP, trazendo inclusive um novo nomem iuris para a conduta ali descrita. Sendo assim, a mens legis do artigo 288, CP, tipifica a conduta da associação criminosa (não mais quadrilha ou bando), ampliando seu alcance, vez que exige três ou mais pessoas (ao contrário de antes, quando era exigido mais de três pessoas, ou seja, quatro). Trata-se de crime de concurso necessário e que a organização seja estruturada de forma estratégica, com objetivos próprios e específicos e com a convergência das condutas para atingir os resultados optados. Se o agrupamento formado com a finalidade de praticar ilícitos penais não tiver estabilidade e caráter de permanência será mero concurso de agentes. Pode-se ainda acrescentar que se trata de atividade profissional ordinária, devidamente orquestrada e não um ideário de criminalidade episódica. É bom observar que o crime de formação de quadrilha é formal, autônomo e independe da prática e comprovação de outros delitos e enquadra-se na modalidade de ofensa a paz pública.

Esta nova lei 12.850/13 traz, também, inúmeras disposições fundamentais sobre a nova postura do legislador em tentar combater a associação e, principalmente, a organização criminosa, trazendo inclusive previsão sobre investigações diferenciadas.

Desta forma, caberá ao intérprete verificar a nova posição do STF e conciliá-la com o novo diploma legislativo sobre o tema, sempre se atentando para o fato de que a criminalidade organizada está cada dia mais presente na nossa sociedade, ramificando-se e atuando nas mais diversas áreas, fato que demanda uma atenta e criteriosa aplicação da lei penal.

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* Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, com doutorado e pós-doutorado em Ciências da Saúde. Advogado e reitor da Unorp - Centro Universitário do Norte Paulista.

 

* Antonelli Antonio Moreira Secanho é advogado, bacharel em Direito pela PUC/Campinas e pós-graduação "lato sensu" em Direito Penal e Processual Penal pela PUC/SP.

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