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O segurador sub-rogado não se submete à arbitragem imposta por meio do bill of lading

Exercício de direito próprio em vigência do contrato de seguro, que em nada se confunde com o contrato de transporte.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

Atualizado às 09:00

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Há muito tempo defendo que a cláusula que pretende impor arbitragem, normalmente no exterior, por meio do Bill of Lading1, é abusiva e, portanto, ilegal.

A voluntariedade é pressuposto de validade do compromisso arbitral, imprescindível para que se estabeleça. Ao contrário da jurisdição, que se impõe, a arbitragem tem de ser desejada pelas partes.

Por isso afirmo que a cláusula de tal natureza, constante desse documento que tem natureza de título de crédito e serve de evidência do transporte internacional marítimo de carga, não se subsome à hipótese do art. 485, VII, do Código de Processo Civil2 (que trata da convenção de arbitragem como causa de extinção do Processo).

O contrato de transporte marítimo de carga é essencialmente de adesão, sem que o embarcador e o consignatário da carga possam expressar livremente suas vontades. O transportador impõe o clausulado, unilateralmente.

Tanto é que sequer um instrumento contratual específico existe, sendo este representado, no máximo, por um título de crédito que é conhecido, de longa data, como nota promissória do mar

O dono da carga (embarcador ou consignatário) não pode ser obrigado ao exercício da arbitragem se não concordou, antes, de forma livre e incontroversa, com sua realização.

Mais do que ilegal, a imposição é inconstitucional e imoral.

Inconstitucional porque não existe renúncia tácita de acesso à jurisdição, uma das mais importantes garantias fundamentais; imoral pois se trata de intolerável dirigismo contratual. O armador vale-se da assimetria na relação fática que informa o negócio jurídico.

No que diz respeito ao elemento moral da situação, convém dar uma breve explicação.

A despeito da condição do dono da carga - se pessoa natural ou jurídica, e, se jurídica, de pequeno, grande ou médio porte -, o armador sempre domina a relação jurídica.

O transporte se faz necessário; o modo de contratação é adesivo. Não compete ao dono da carga qualquer alternativa senão aderir ao que o armador manda, até porque deixar de fazer negócio com este não garante que os demais apresentarão mais opções de clausulado. Neste sentido, os conhecimentos de embarque são, em regra, todos iguais.

 

Paulo Henrique Cremoneze

Paulo Henrique Cremoneze

Advogado com atuação em Direito do Seguro e Direito dos Transportes, sócio do escritório Machado, Cremoneze, Lima e Gotas - Advogados Associados, mestre em Direito Internacional Privado pela Universidade Católica de Santos, especialista em Direito do Seguro pela Universidade de Salamanca (Espanha), acadêmico da ANSP - Academia Nacional de Seguros e Previdência, diretor jurídico do CIST - Clube Internacional de Seguro de Transporte, membro efetivo do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo, autor de livros jurídicos e patrono do Tribunal Eclesiástico da Diocese de Santos.

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