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Terceirização do SESMT - Possibilidade ou impossibilidade

Existe risco em caso de discussão judicial envolvendo reconhecimento de vínculo de emprego de integrantes de SESMT terceirizado e, ainda, de autuação e aplicação de penalidade administrativa.

sexta-feira, 26 de março de 2021

Atualizado às 12:19

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Consoante disposições dos artigos 162, alínea "c", e 200, da CLT, o antigo Ministério do Trabalho, atualmente Secretaria do Trabalho vinculada ao Ministério da Economia, é quem tem a prerrogativa para expedir normas a respeito dos serviços especializados em segurança e em medicina do trabalho, bem como para definir a qualificação dos seus integrantes e o regime de trabalho.

Assim, foi editada a portaria 3.214/78, que traz em seu texto as Normas Regulamentadoras, incluindo a NR-4, que versa sobre o denominado SESMT. E, por sua vez, o item 4.4.2, da NR-4, estabelece:

Os profissionais integrantes dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho deverão ser empregados da empresa, salvo os casos previstos nos itens 4.14 e 4.15.

A questão a ser adiante tratada é a de saber se o mencionado item 4.4.2, da norma regulamentadora NR-4, da portaria 3.214/78, foi ou não revogado.

Existem aqueles que defendem que a partir das decisões do Supremo Tribunal Federal, nos autos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 324 e do Recurso Extraordinário 958.252, a terceirização passou a ser lícita em todas as etapas do processo produtivo, sejam elas consideradas meio ou fim.

E essa tese se torna mais forte ao conjugarmos com o conteúdo da lei 13.467/17, vigente a partir de 11/11/17, que alterou a redação do caput do artigo 5-A, da lei 6.019/74, anteriormente incluído pela lei 13.429/17. A redação do artigo 5-A é a seguinte:

Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços relacionados a quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal.

Nessa linha, o que se argumenta é que embora não tenha ocorrido uma revogação expressa, pode ser deduzido que o item 4.4.2, da NR-4, não subsiste devido ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal e das leis nº 13.429 e nº 13.467, ambas de 2017.

Corroborando o articulado, destaca-se a ementa do acórdão proferido pela 2ª turma do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região nos autos do processo 0000131- 87.2019.5.14.0003:

MANDADO DE SEGURANÇA. AUTO DE INFRAÇÃO. SESMT. NECESSIDADE DE CONTRATAÇÃO DIRETA. ITEM 4.4.2 DA NR-4. POSSIBILIDADE DE TERCEIRIZAÇÃO. ART. 4º-A, "CAPUT", DA LEI Nº 6.019/74. NORMA DE HIERARQUIA SUPERIOR E MAIS RECENTE. ANULAÇÃO DA AUTUAÇÃOSEGURANÇA CONCEDIDA. O auto de infração de nº 21.627.401-0 fora lavrado em 3-12-2018 diante da constatação da conduta atribuída à empresa de "deixar de manter serviço especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho" (Id 3274cad - Pág. 2). A legislação prevê apenas que as empresas "estarão obrigadas a manter serviços especializados em segurança e em medicina do trabalho", de acordo com as normas a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho (art. 162 da CLT), o qual, por sua vez, no item 4.4.2 da NR-4, no exercício de seu poder regulamentar, determina, desde 27/10/1983, que "os profissionais integrantes dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho deverão ser empregados da empresa". Todavia, a partir de 11/11/17, quando teve início a vigência da Lei nº 13.467/2017, a qual inseriu o art. 4º-A, "caput", na Lei nº 6.019/1974, tornou-se possível a transferência, por parte de uma determinada empresa, "da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução". Entende-se, pois, que a previsão contida no item 4.4.2 da NR-4, embora não tenha sido expressamente revogada, não mais subsiste por contrariar diretamente o mencionado dispositivo legal e as decisões do STF na ADPF 324 e no RE 958.252. Anota-se que o critério da especialidade, utilizado para a solução de antinomias, segundo o qual uma lei geral não revoga nem modifica uma lei especial e vice-versa (art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 4.657/1942), somente se aplica a normas que possuam a mesma hierarquia. Assim, como a autuação impugnada fora lavrada em 3/12/18, isto é, quando já estava em vigor o mencionado dispositivo e depois de o Supremo Tribunal Federal haver proferido as referidas decisões, com efeitos vinculantes, merece ser concedida a segurança requerida, anulando-se o auto de infração de 21.627.401-0.

Entretanto, existem entendimentos em sentido contrário.

O ponto fundamental da divergência reside no fato de que essa norma - item 4.4.2, da NR-4, está vinculada aos artigos 162 e 200, da CLT, que é uma lei especial, e que não expressamente foi revogada.

Logo, deve prevalecer o seu conteúdo até que tal fato (revogação) venha a ocorrer, até porque, trata-se de norma mais benéfica ao trabalhador.

Na sentença proferida pelo MM. Juiz nos autos do processo indicado acima e de 0000131-87.2019.5.14.0003, embora tenha sido modificada pelo Tribunal, foi fundamentado que:

Mais precisamente, o STF não decidiu que o SESMT pode ser terceirizado, no âmbito das empresas que obrigatoriamente devem constituir e manter internamente tal serviço especializado em engenharia de segurança e medicina do trabalho.

Ou seja, o fato de a empresa impetrante poder terceirizar suas atividades-meio e fim não autoriza terceirizar o SESMT, em razão de que a lei trabalhista lhe obriga a constituí-lo e mantê-lo com técnicos de segurança do trabalho contratados mediante vínculo de emprego, em face do grau de risco de sua atividade (3) e do seu volumoso quadro de pessoal (338 empregados).

Na direção ora apresentada, entende-se que será necessária a alteração do item 4.4.2, da NR-4, por ato governamental, para autorizar a terceirização e evitar discussões sobre o assunto.

Nesse norte, André Menezes Bio, em artigo intitulado "SOBRE A POSSIBILIDADE DE TERCEIRIZAÇÃO DO SESMT", manifesta que o SESMT pode ser terceirizado, mas recomenda cautela até que a modificação normativa ocorra.

Aliás, merece ser salientado que as deliberações a respeito das alterações do texto da NR-4 (SESMT) estão em estudo perante a CTPP (Comissão Tripartite Paritária Permanente)1.

E em notícia no site, publicada em 25/02/2021, consta:

Já a deliberação da NR-4, cujo principal impasse é a possibilidade de terceirização do SESMT, ainda não teve data definida. Todas as referidas normas deverão passar por AIR (Análise de Impacto Regulatório) antes das decisões finais.

A Bancada dos Empregadores defende que, com a decisão do STF que confirmou a validade da terceirização em todas as atividades dentro da empresa (atividades fins), e que tiveram judicializações para permitir a terceirização do SESMT também. Isso se dava sem regulamentação, tendo em vista ser mediante uma decisão judicial.

(...)

A Bancada dos Trabalhadores, no entanto, não aceita a terceirização do SESMT de forma alguma, pois o SESMT, constituído pelo Artigo 162 da CLT, é uma cláusula pétrea, ou seja, norma de ordem pública com o objetivo de manter a SST. A Lei de Terceirização aprovada no Governo Michel Temer, não alterou e nem pode alterar as cláusulas de SST na CLT.

Artigo 162 da CLT trata-se de um instrumento que visa um bem maior e coletivo, sendo inadmissível tratar esta matéria como uma terceirização de atividade meio ou fim, conforme pensa e defende a Bancada Patronal.2

Pelas razões acima, constata-se que o tema é bastante controvertido, sendo fortes os fundamentos jurídicos em ambos os sentidos (de possibilidade ou de impossibilidade de terceirização do SESMT).

Assim, existe risco em caso de discussão judicial envolvendo reconhecimento de vínculo de emprego de integrantes de SESMT terceirizado e, ainda, de autuação e aplicação de penalidade administrativa.

Porém, ao que pensamos, o item 4.4.2, da NR-4, da portaria 3.214/78, foi revogado com a edição da lei 13.467/17, vigente a partir de 11/11/17, que alterou a redação do caput do artigo 5-A, da lei 6.019/74, anteriormente incluído pela lei 13.429/17, o que foi reforçado com as decisões do Supremo Tribunal Federal nos autos da ADPF 324 e no RE 958.252, que permitiram a terceirização em todas as etapas do processo produtivo, sejam elas consideradas meio ou fim.

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Orlando José de Almeida

Orlando José de Almeida

Sócio do escritório Homero Costa Advogados.

Cristina Simões Vieira

Cristina Simões Vieira

Colaboradora do escritório Homero Costa Advogados.

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