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O PL ALESP 504/2020 e a renovação do preconceito e da discriminação contra a comunidade LGBTQIA+

O PL ALESP 504/2020 navega em mares de iniciativas conservadoras, de interesses profundos e ultrapassados.

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Atualizado às 08:49

 (Imagem: Arte Migalhas)
(Imagem: Arte Migalhas)

I. O PL ALESP 504/2020 e seu trâmite em regime de urgência

Será votado amanhã o PL 504/2020 ("PL ALESP 504/2020"), que "dispõe sobre a proibição da publicidade, através de qualquer veículo de comunicação e mídia de material que contenha alusão a preferências sexuais (sic) e movimentos sobre diversidade sexual relacionados a crianças no Estado de São Paulo."

De autoria da deputada estadual Marta Costa (PSD), foi apresentado em 5/8/2020 e logo incluído no "regime de tramitação de urgência" da Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP). Contém apenas três artigos, in verbis:

"Artigo 1º - É vedado em todo o território do Estado de São Paulo, a publicidade, por intermédio de qualquer veículo de comunicação e mídia que contenha alusão a preferências sexuais e movimentos sobre diversidade sexual relacionado a crianças.

Artigo 2º - As infrações ao disposto no artigo primeiro desta Lei serão, a princípio, multa e o fechamento do estabelecimento que atuar na divulgação até a devida adequação ao que dispõe esta lei.

Artigo 3º - Esta Lei entrará em vigor dentro de trinta dias a contar de sua publicação."

Na justificativa para a sua adoção pela ALESP, a deputada Marta Costa (PSD) parte do princípio que "o uso indiscriminado deste tipo de divulgação trariam (sic) real desconforto emocional a inúmeras famílias além de estabelecer prática não adequada a crianças que ainda, sequer possuem, em razão da questão de aprimoramento da leitura (5 a 10 anos), capacidade de discernimento de tais questões." Assim, a intenção declarada é "limitar a veiculação da publicidade que incentive o consumidor do nosso Estado a práticas danosas".

Além de utilizar terminologia inadequada - "preferências sexuais" ou invés de "orientação sexual" - o PL ALESP 504/2020 parte de algumas premissas:

(a) a divulgação de orientação sexual na mídia causa "desconforto emocional a inúmeras famílias além de estabelecer prática não adequada a crianças";

(b) há um uso indiscriminado da divulgação de orientação sexual na mídia;

(c) as regras atuais de publicidade e o trabalho dos órgãos reguladores nesse campo - e.g. SENACON, CONAR, Procons, Ministério Públicos estaduais, etc - não são suficientes; e

(d) é preciso proibir.

Nos termos do regimento interno da ALESP, o PL ALESP 504/2020 esteve em pauta por 5 (cinco) sessões, de 6 a 13 de agosto de 2020 e foi convocada reunião conjunta das Comissões de Constituição, Justiça e Redação, Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais e Finanças, Orçamento e Planejamento.

Foram apresentadas duas emendas. A emenda da deputada estadual Erica Malunguinho (PSOL) buscou aprimorar a sua redação, extirpando os latentes preconceito e discriminação, assim buscando aproveitá-lo para "proteger as crianças de conteúdo de obras e diversões não recomendáveis a determinadas faixas etárias".1 No entanto, a sua emenda não foi aceita, mas sim a emenda da deputada estadual Janaina Paschoal, que tão somente corrigiu a terminologia de "preferências sexuais" no seu teor e nada disse sobre o seu conteúdo preconceituoso e discriminatório.2 3

Tendo como relator designado o deputado estadual Gilmaci Santos (Republicanos), foi exarado, 14/4/2021, o parecer 315/2021, que defendeu a pertinência do PL ALESP 504/2020 - pois "tem como objetivo proteger a infância e a adolescência" - e reafirmou "que o uso indiscriminado do referido material de divulgação pelos veículos de comunicação e mídia, trariam (sic) real desconforto emocional às famílias - além de estabelecer prática não adequada às crianças e adolescentes."

II. O paralelo com legislações conservadores, em especial com a "Lei Federal Russa de Propaganda Gay"

Tanto a autora do PL ALESP 504/2020 como as Comissões de Constituição, Justiça e Redação, Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais e Finanças, Orçamento e Planejamento, que o analisaram, destacaram a seu favor a existência de um suposto clamor internacional por esse tipo de providência. In verbis

"... Há que se ressaltar, ainda, que em vários países a divulgação de qualquer material no sentido do que estabelece este projeto de lei vem sofrendo sérias e adequadas restrições a fim de impedir desconfortos sociais e atribulações de inúmeras famílias e situações evitando, tanto a possibilidade, quanto a inadequada influência na formação de jovens e crianças."

 No entanto, tais exemplos legislativos - na forma e estrutura apresentadas no PL ALESP 504/2020 - só encontram paralelo na Rússia e no Cazaquistão. As iniciativas semelhantes em alguns bolsões conservadores nos Estados Unidos, por exemplo, foram prontamente rejeitadas no parlamento ou revertidas por decisões judiciais. O mesmo se deu com tentativas semelhantes na Europa.

A verdade é que "a mãe de todas a leis de propaganda gay" é a Rússia e a primeira de suas iniciativas entrou em vigor em 2006, na região administrativa região de Ryazan (ou Oblast), a 200 km de Moscou. Ostensivamente focada na "proteção da moralidade das crianças", essa lei proibia "ações públicas destinadas à propaganda de homossexualidade entre menores", com a justificativa de que "homens gays planejam recrutar jovens para se tornarem homossexuais", por meio de anúncios, propagandas ou programas em rádio, televisão e na internet. Posteriormente, em 2008, a lei de Ryazan foi alterada "para tipificar como crime" qualquer participação ou contribuição na "promoção da homossexualidade entre menores".

Em 2013, o governo do presidente Vladimir Putin passou defender que "a proteção da família tradicional era questão de segurança nacional" e que "políticos e estadistas que apoiam a destruição da família deveriam ser marginalizados, amaldiçoados por séculos como os destruidores da família e da raça humana". Nesse contexto, o governo federal conseguiu que os legisladores russos alterassem o Código Russo de Ofensas Administrativas, em 2013, tipificando como crime a "promoção de relações sexuais não tradicionais entre menores", o que passou a ser conhecida como a "Lei Federal Russa de Propaganda Gay".

Desde então, é crime divulgar, em qualquer mídia, qualquer informação positiva sobre a comunidade LGBTQIA+.4 Por óbvio, nenhuma pessoa que se identifique como tal - o que na Rússia já seria crime em si! - poderia participar de anúncios, propagandas ou programas de televisão, rádio ou qualquer matéria na internet propagandas que minimamente poderiam ser acessadas por menores. A "Lei Federal Russa de Propaganda Gay" busca atingir, em relação à comunidade LGBTQIA+, a aspiração de invisibilidade de minorias ou de maiorias minorizadas, sob a clássica premissa, tão consagrada em relação ao racismo, de que "quem não é visto não existe".

Diante da inação dos tribunais russos na contenção das múltiplas ilegalidades da "Lei Federal Russa de Propaganda Gay" o assunto foi levado à Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Um dos principais argumentos apresentados pelos apelantes foi que a proibição de expressar sua sexualidade perto de crianças era efetivamente uma proibição de expressar sua identidade em público, já que eles sempre precisariam estar atentos para saber se as crianças podiam ou não vê-los ou ouvi-los. Além disso, que fazer campanha pelos direitos da comunidade LGBTQIA+ é um discurso político e de interesse público, que não pode ser limitado para aceder com os valores tradicionais do governo federal.

Em resposta, o governo russo argumentou que:

(a) os integrantes da comunidade LGBTQIA+ atuavam para "corromper a percepção das crianças sobre o conceito de família tradicional";

(b) havia paralelos claros entre homossexualidade e pedofilia;

(d) os casais do mesmo sexo eram mais propensos a contrair o HIV; e

(d) "as relações do mesmo sexo impediam o crescimento populacional, assim afetando o próprio crescimento e perpetuação do estado russo".

Em 2017, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos decidiu contra o governo russo e seu parlamento, assim entendendo que:5

(a) na Europa os indivíduos LGBTQIA+ devem sempre poder se identificar abertamente e lutar por seus direitos em público;

(b) eram absolutamente falsas as alegações de que "a liberdade de expressão em questões LGBTQIA+ poderia adversamente afetar as chamadas famílias tradicionais", até mesmo porque tal conceito fechado, de "família tradicional", não mais encontrava amparo em qualquer legislação vigente na Comunidade Europeia;

(c) eram absolutamente falsas as alegações de que "as crianças poderiam ser induzidas a um estilo de vida homossexual";

(d) não seria admissível endossar qualquer política "que incorporasse preconceito claro de grupos conservadores contra uma minoria", no caso os indivíduos LGBTQIA+;

(e) eram absolutamente condenáveis as tentativas da Rússia de traçar paralelos entre homossexualidade e pedofilia;

(f) apresentação de informações objetivas sobre sexo e identidade de gênero deve ser considerada parte indispensável da política de saúde pública dos países integrantes da Comunidade Europeia;

(g) "Lei Federal Russa de Propaganda Gay" tão somente agia para reforçar o estigma e o preconceito contra indivíduos LGBTQIA+; e

(h) a Rússia violou o direito dos requerentes à liberdade de expressão e seu direito de não serem discriminado.

III. A desconsideração - até o momento - dos argumentos apresentados pela sociedade civil

As Comissões de Constituição, Justiça e Redação, Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais e Finanças, Orçamento e Planejamento não recepcionaram as recomendações da deputada estadual Erica Malunguinho sobre o tema, muito menos as múltiplas e reiteradas manifestações da sociedade civil.

A Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap) assim se manifestou:

"A Associação Brasileira de Agências de Publicidade (ABAP) manifesta o seu repúdio ao PL 504/2020, em análise na Assembleia Legislativa, pelo qual pretende se impor discriminação à liberdade de expressão comercial e ao direito de orientação sexual. A Constituição Federal estabelece a exclusividade da União em legislar sobre publicidade comercial, como veda qualquer afronta à inviolabilidade do direito à liberdade, à igualdade e à censura de natureza ideológica e social. Veda a Constituição Federal, ainda, qualquer forma de censura à manifestação do pensamento, de criação, de expressão e de informação, sob qualquer forma, processo ou veículo. É importante destacar que a publicidade reflete a sociedade em que está inserida, e a vedação proposta pelo PL caracteriza-se por censura de conteúdo, abrindo um precedente perigosíssimo para a liberdade de expressão e aos direitos de minorias."

O Comitê Jurídico do Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+ repudiou o PL ALESP 504/2020, apontando o seu caráter preconceituoso e discriminatório, e suas inconstitucionalidades formais e materiais, eis que "viola a competência privativa da União Federal para legislar sobre a matéria, bem como fere direitos fundamentais e humanos assegurados pela Constituição Federal".6

Também o Instituto Alana, voltado para a defesa da infância, por meio de seu coordenador jurídico, Pedro Hartung, condenou PL ALESP 504/2020, pelo seu caráter "infundado e antidemocrático":

"O projeto busca restringir uma representatividade de cidadãos, de pessoas que possuem direitos fundamentais de sentirem e serem representados na comunicação social. ... Temos que aproveitar esse debate e de uma vez por todas rechaçar todo e qualquer uso instrumental dos direitos da criança e essa ideia de proteção integral para atitudes antidemocráticas e atitudes autoritárias como essa do projeto de lei. ... É muito importante que possamos entender que sim, temos que proteger os direitos de crianças e adolescentes com absoluta prioridade no Brasil, mas dentro dos limites e dentro do espaço democrático estabelecido pela própria Constituição Federal de 1988."

Ainda, muitas manifestações foram juntadas aos autos do procedimento de tramitação do PL ALESP 504/2020. Faço destaque de alguns de seus trechos abaixo, mas as íntegras de tais notas poderão ser acessadas no próprio site da ALESP:

(a) Nota de Repúdio do Consulado das Famílias LGBT+:

"Tal projeto não apenas é imoral e antidemocrático, como também uma ação inconstitucional, além de prejudicar e muito, e as empresas de publicidade que após ela ser aprovada, terão que criar campanhas duplas, uma para o Estado de São Paulo, outra para o restante do país, e isso pode fazer com que grandes marcas, caso não deixem o Estado, mudem todo seu apoio a visibilidade sexual, o que se tornará um grande retrocesso inclusive em políticas públicas voltada a população LGBT!"

(b) Nota das Promotoras Legais Populares de Araraquara:

"Esse PL é inconstitucional, pois fere diversos artigos da Constituição Federal, representa uma tentativa de institucionalizar a censura, estigmatiza as pessoas LGBTQIA+ associando essa população à promiscuidade, à escassez de caráter e moralidade, além de ferir o princípio de dignidade e dos direitos humanos desta comunidade."

(c) Parecer da Sociedade de Advogados Araujo Recchia Santos, a pedido da Deputada Erica Malunguinho:

"Além dos princípios e normativas constitucionais, é importante sopesar que o projeto de lei ataca a Tratados Internacionais que versam sobre a dignidade da pessoa humana em todos os seus aspectos. Trata-se, smj, de verdadeiro golpe em uma parcela da população que ainda luta para sobreviver já que os índices de crimes de ódio contra LGBTQIA+ são assustadores. Como se não bastasse, a luta destas pessoas na conquista por direitos básicos ainda se encontra em franco desenvolvimento, uma vez que faz pouquíssimo tempo que conquistaram o direito à união civil, ao uso do nome social, à equiparação ao racismo de práticas discriminatórias e se consagraram eleitos(as) em um país que lidera o ranking de crimes motivados por LGBTfobia. Portanto, não é crível que a maior Assembleia Legislativa do país, campo que deveria ser de pluralidade de ideias, seja palco de condutas que podem ensejar, smj, práticas racistas, homofóbicas e transfobicas."

(d) Nota de Repúdio do Movimento Negro Unificado SP:

"O projeto de lei, além de criminalizar a população LGBTQIA+, fere os direitos e a existência de crianças e adolescentes LGBTs; afeta a liberdade de expressão, prevista na Constituição; abre margem para questionamentos com relação às famílias homoafetivas; e incita ainda mais LGBTfobia. ... Estamos atentas e atentos para barrar esse retrocesso! ... Não aceitaremos que a ALESP, um espaço de construção de políticas públicas, aprove um projeto inconstitucional que serve apenas para motivar o ódio e preconceito com uma parcela da população que é marginalizada e vive excluída da sociedade."

(e) Nota conjunta de repúdio assinada por representes do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE); do Conselho Municipal LGBT da Cidade de São Paulo; da Coordenadoria Municipal de Guarulhos da Aliança Nacional LGBTI; do Núcleo Transmasculidades da Família Stronger; da Coordenadoria da Rede Periférica Família Stronger de Osasco; da Coordenadoria da Rede Periférica Família Stronger do Itaim Paulista; da Coordenadoria de Comunicação da Rede Periférica Família Stronger:

"É válido destacar a discussão realizada pela turma de colegiados do Supremo Tribunal Federal, em que através da ADO26 (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão), os ministros entenderam e concluíram o enquadramento da homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989) até que o Congresso Nacional edite lei sobre a matéria, transformando assim a LGBTFOBIA em crime em nosso país. ... Apresentamos tais provocações jurídicas com o intuito de alertar e ressaltar que tal projeto viola os direitos de pessoas LGBTI+, viola os preceitos básicos da democracia, viola o direito da criança e do adolescente em conviver com a pluralidade humana, além de diversos outros direitos que deveriam ser mais apreciados e valorizados."

(g) Moção de repúdio da vereadora Filipa Brunelli (PT), de Araraquara, SP:

"Associar a violação dos direitos das crianças e adolescentes às diversidades sexuais e de gênero é desumanizador, cruel e acima de tudo criminoso."

(f) Moção de repúdio do Mandato Coletivo DiverCidade, da Câmara Municipal de Valinhos, SP:

"As justificativas do projeto acentuam o conservadorismo e a ignorância deste ao apontar como argumento o 'desconforto emocional' que uma propaganda poderia causar às famílias, a intenção de 'impedir desconfortos sociais' e, por fim, a 'inadequada influência na formação de jovens e crianças."

(g) Ofício da Bancada Feminista do PSOL na Câmara Municipal de São Paulo:

"A população LGBTQIA+ já é constantemente criminalizada, jogada à margem da sociedade, simplesmente por não se conformar com um padrão cisheteronormavo. Esse PL nada mais faz do que colocar a população LGBTQIA+ em uma situação vexatória e discriminatória, ferindo a Lei Andiscriminação Estadual e Federal. A matéria é, portanto, inconstucional. Que a ALESP vote pela proteção das crianças, que lute por melhorias na vida da população, e que não se volte contra a pluralidade tão posiva e construva da nossa sociedade."

(h) Nota Técnica da Associação Psicossocial Cultural e de Empreendedorismo para Pessoas Transvestigeneres Casa Chama, com diversos apontamentos sobre os regramentos nacionais e internacionais violados pelo projeto:

"O PL fere a Convenção Americana sobre Direitos Humanos4 (Pacto de São José da Costa Rica), ... o PL afronta a Convenção sobre os Direitos da Criança, ...  o PL aflige o Art. 1, 2, 8, 9, 22 da Declaração Universal dos Direitos Humanos; Art. 2, 3, 17, 26 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e Art. II e V da Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial ... o PL afronta inúmeros dispositivos da Constituição Federal, e.g.: Art. 1º, III; Art. 3º, I e IV; Art. 4º, II e VIII; Art. 5º, caput, IX, X, XLI, XLII; Art. 6º e Art. 227 ... o PL ainda fere o artigo 278, VIII, da Constituição do Estado de São Paulo ... o PL ainda confronta a Lei nº 10.948, de 05 de novembro de 2001 e a Lei nº 14.187, de 19 de julho de 2010, e a Lei nº 7.716/1989 ... Por fim, o PL viola diplomas internacionais elaborados por entidades como a Organização dos Estados Americanos (OEA), a União Europeia (UE) e a Organização das Nações Unidas (ONU). ... O PL estabelece uma conduta extremamente abstrata e se utiliza de conceitos abertos e inadequados, sugerindo verdadeira censura prévia a afetar principalmente a atividade publicitária, que reduz a sua possibilidade de atuação e expressão; os direitos da população LGBTQIAP+, em se verem representadas, e os direitos de crianças e adolescentes, que são ceifadas da informação."

IV.  A esperança de que o plenário da ALESP possa evitar esse erro histórico

Diante das múltiplas e complementares manifestações da sociedade civil, acima mencionadas - além das importantes manifestações de entidades aqui não listadas -, espera-se que, em plenário, os deputados e deputadas da ALESP evitem um erro histórico, e rejeitem o PL ALESP 504/2020. Nesse aspecto, imperioso o alerta do minudente acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos sobre o tema, aqui mencionado.

O PL ALESP 504/2020 navega em mares de iniciativas conservadoras, de interesses profundos e ultrapassados, que não merecem sequer serem aventados no ambiente atual, quando os valores da diversidade e da inclusão devem ser cada vez mais propagadados e estimulados.

A sua rejeição, portanto, deve ocorrer não só pelas inequívocas ilegalidades e inconstitucionalidades, formais e materiais, apresentadas mas, especialmente, pela sua evidente injustiça, o seu preconceito explícito e a sua discriminação veemente contra a comunidade LGBTQIA+. A busca inconstitucional e antidemocrática de invisibilização da comunidade LGBTQIA+ não deve prosperar.

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1 Emenda da Erica Malunguinho (PSOL): "Artigo 1º - Fica vedada, em todo território do Estado de São Paulo, a publicidade, por intermédio de qualquer veículo de comunicação e mídia, de material que contenha alusão a drogas, sexo e violências explícitas, relacionados a crianças."
2 Emenda da Janaina Paschoal(PSL): "Artigo 1º - É vedada, em todo o território do Estado de São Paulo, a publicidade, por intermédio de qualquer veículo de comunicação e mídia, que contenha alusão a gênero e orientação sexual, ou a movimentos sobre diversidade sexual relacionados a crianças e adolescentes."
3 Também a deputada estadual Marina Helou (Rede), apesar de não ter apresentado emenda ao projeto, assim se manifestou, contrariamente a ele: "Este projeto mostra uma clara inversão de valores: precisamos, sim, proteger as nossas crianças, pois esse é nosso dever enquanto mães, pais, educadores e parlamentares, mas precisamos protegê-los da violência, dos abusos, das desigualdades e da falta de condições. Precisamos também protegê-las dos preconceitos e da exclusão".
4 A sigla LGBTQIA+ destina-se a identificar lésbicas, gays, bissexuais. transexuais, queer, intersexo, assexual. Ainda, o sinal de "+" serve para incluir outros grupos e variações de sexualidade e gênero não destacadas anteriormente.
5 Bayev and others v. Russia. European Court of Human Rights, Third Section. Application nº 67667/09. Judges Helena Jäderblom, President; Luis López Guerra; Helen Keller; Dmitry Dedov; Alena Polácková; Georgios A. Serghides; Jolien Schukking. Judgment (merits and just satisfaction), Strasbourg, France, 23 May 2017 (decision) and 20 June 2017 (publication).
6 Assinaram o manifesto os escritórios já são integrantes do Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+, a saber, por ordem alfabética: BMA, Daniel, Demarest, Lefosse, Machado Meyer, Mattos Filho, Serur, Stoche Forbes, Tauil Chequer, TozziniFreire, Trench Rossi Watanabe e Veirano.

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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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Júlio César Bueno

VIP Júlio César Bueno

Sócio de Pinheiro Neto Advogados. Doutor (FDUSP) e mestre (University of Cambridge). Atua em litígios judiciais e arbitrais; direito da construção e contratos de engenharia; gerenciamento de crises.

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