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O SUS, o STF e os medicamentos não registrados

O fornecimento do medicamento a base de canabidiol havia sido determinado pelo TJ/SP diante da inexistência, na rede pública, de alternativa a atender, de maneira satisfatória, a necessidade do paciente.

sexta-feira, 2 de julho de 2021

Atualizado às 09:25

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Finalizado no dia 18/6/2021, pelo Supremo Tribunal Federal, o julgamento do RE 1165959, que reconheceu o dever de o Estado fornecer a paciente com crises epiléticas um medicamento que, embora sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa, já teve sua importação autorizada.

O fornecimento do medicamento a base de canabidiol havia sido determinado pelo E. TJ/SP diante da inexistência, na rede pública, de alternativa a atender, de maneira satisfatória, a necessidade do paciente.

O entendimento confirmado pelo STF é de que a falta de registro na Anvisa não afasta a obrigatoriedade do fornecimento se a agência autoriza sua importação, em caráter de excepcionalidade, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde. As condições para o fornecimento do medicamento pelo SUS nessa situação são: i) comprovada a incapacidade econômica do paciente; ii) a imprescindibilidade clínica do tratamento; e iii) a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS.

Por proposição do min. Alexandre de Moraes, a Corte Suprema fixou a seguinte tese: "Cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS."

Até então, a orientação do STF, firmada no julgamento com repercussão geral do RE 657718, em 2019, era de que, como regra geral, "o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) por decisão judicial", pois "o registro na Anvisa constitui proteção à saúde pública, atestando a eficácia, segurança e qualidade dos fármacos comercializados no país, além de garantir o devido controle de preços." No caso de medicamentos com eficácia e segurança comprovadas e testes concluídos, mas ainda sem registro na ANVISA, o seu fornecimento por decisão judicial assumiria "caráter absolutamente excepcional e somente poderá ocorrer em uma hipótese: a de mora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na lei 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil."

A posição do Supremo Tribunal Federal com o julgamento pelo tribunal pleno do RE 1165959 esclarece, portanto, outras situações excepcionais nas quais se poderá demandar medicamentos não registrados pelo órgão regulador. A posição da Corte atende ao anseio pela efetividade do direito e garantia constitucional de acesso à saúde.

Laís Gomes Bergstein

Laís Gomes Bergstein

Sócia e integrante do Núcleo de Direito Civil do Escritório Professor René Dotti e secretária-adjunta da Comissão Especial de Direito do Consumidor do Conselho Federal da OAB.

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