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SEC 14.930: Anatomia de um falso precedente

A verdade é que o STJ não mudou de posição; alguns é que, gostando muito que ele tivesse mudado, passaram a propagar o desejo como se fosse realidade.

quarta-feira, 14 de julho de 2021

Atualizado às 09:03

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Nos últimos tempos, a propósito de seguro, sub-rogação e ressarcimento, poucas decisões tem criado tanta confusão na jurisprudência nacional quanto a SEC 14.930. E não exatamente pelo que afirma, mas pelo que afirmam a seu respeito. Depois e por causa dela, surgiram alguns poucos julgados admitindo que por esse precedente o Superior Tribunal de Justiça afirmara, em prejuízo do segurador sub-rogado, a eficácia da cláusula compromissória de arbitragem firmada pelo segurado. Em tese, seria de estranhar, porque vai contra a tradição inteira do Direito Brasileiro e do próprio STJ, dos quais a regra desde sempre considerou intransmissíveis ao segurador esse tipo de disposição. E por várias razões; a principal delas está ligada à natureza mesma da sub-rogação legal, que, como sempre se compreendeu muito bem, transmite só os direitos materiais. A verdade é que o STJ não mudou de posição; alguns é que, gostando muito que ele tivesse mudado, passaram a propagar o desejo como se fosse realidade.

De certa forma, o problema é um tanto localizado; fica adstrito às fronteiras do Direito do Seguro e do Direito Marítimo, sobretudo em avaria ou extravio de carga durante o transporte. A maior parte dos litígios de responsabilidade civil no direito marítimo é, como uma consulta breve pode garantir, deflagrada por seguradoras sub-rogadas nos direitos dos segurados, quer sejam embarcadores ou consignatários de carga. E nesses casos não é raro que, para se verem livres da jurisdição brasileira, armadores invoquem em contestação, diante do segurador que não participou nem anuiu com o contrato original, a existência de cláusula compromissória ou de eleição de foro, presente no contrato de transporte ou até mesmo no contrato de afretamento ("cessão de uso de navio"). Até pouco tempo atrás havia apenas uma simples maneira de resolver isso: pronunciar a ineficácia da cláusula. 

No fundo as circunstâncias continuam iguais, mas, pela nebulosidade que se criou no seu entorno, exigem que se comente um pouco das peculiaridades da sub-rogação, a fim de reestabelecer a integridade desse instituto tão importante.

De fato, os arts. 786 e 346, inciso III do Código Civil garantem ao segurador que, ao pagar a indenização securitária, ele passa a ter o direito de reaver os prejuízos que indenizou daqueles que os tiverem causado. O mesmo consta na Súmula 188/STF. Eis a sub-rogação, efeito do simples pagamento em nome de terceiro que passa a lhe garantir, dentre outras coisas, a titularidade da ação reparatória. No caso de um transporte marítimo mal executado, por exemplo, o segurador indeniza o dono da carga e, sub-rogado nos direitos do segurado, passa a poder postular contra o transportador.

Arcando com um prejuízo gerado por ato de terceiro, o segurador em certa medida substitui o segurado. Coloca-se em posição semelhante, mas não idêntica à dele, para demandar a reparação que, sem isso, ficaria esquecida. Na hipótese de que, paga a indenização pelo segurador, a situação toda ficasse por isso mesmo, seria como perdoar o ato ilícito só porque a vítima contratou seguro. O que fere a ordem jurídica e os princípios basilares da responsabilidade civil - daí a necessidade da ação de regresso.

  • Confira aqui a íntegra do artigo.
Leonardo Reis Quintanilha

Leonardo Reis Quintanilha

Membro do escritório Machado, Cremoneze, Lima e Gotas - Advogados Associados.

Paulo Henrique Cremoneze

Paulo Henrique Cremoneze

Advogado com atuação em Direito do Seguro e Direito dos Transportes. Sócio do escritório Machado, Cremoneze, Lima e Gotas - Advogados Associados. Mestre em Direito Internacional Privado. Especialista em Direito do Seguro.

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