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O novo entendimento da RF do Brasil sobre o momento para oferecimento à tributação do indébito tributário

A discussão decorre da constatação de que a maior parte das decisões obtidas pelos contribuintes é ilíquida, pois não definem o montante do indébito a ser recuperado.

terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Atualizado às 08:45

(Imagem: Arte Migalhas)

Há muito se discute o momento em que o indébito tributário reconhecido por decisão judicial transitada em julgado deve ser oferecido à tributação do Imposto de Renda (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Lembrando que a tributação do indébito pelo IRPJ e pela CSLL tem por premissa que tais valores foram, no passado, tratados como despesas dedutíveis na determinação do Lucro Real, à luz do artigo 41 da lei 8.981/95.

O tema ganhou relevância com o entendimento (já não tão recente) firmado pelo STF no julgamento do Tema 69 da repercussão geral, quando foi fixada a tese de que "o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins" (RE 574.706/PR).

Muitos contribuintes tiveram ganho de causa, com valores expressivos a recuperar perante a Receita Federal. Porém se viram diante de um impasse, sem saber exatamente quando deveriam oferecer os valores à tributação.

A discussão decorre da constatação de que a maior parte das decisões obtidas pelos contribuintes é ilíquida, pois não definem o montante do indébito a ser recuperado.

Nesses casos, se o contribuinte optar pela execução judicial do indébito, pela via do precatório, a Receita Federal já havia externado entendimento de que os valores devem ser tributados apenas no momento da expedição do precatório ou do trânsito em julgado dos embargos à execução do título judicial.

No entanto, a dúvida permanecia para a grande maioria dos casos em que o contribuinte opta pela recuperação do indébito pela via da compensação administrativa, mediante o encontro de contas entre crédito e débitos próprios devidos ao governo, após a prévia habilitação do crédito junto à Receita Federal.

Para esses casos, o entendimento externado pela Receita Federal na Solução de Divergência COSIT 19/2003 era no sentido de que "é na data do trânsito em julgado da sentença declaratória do direito à compensação que os créditos compensáveis passam a ser receitas tributáveis do IRPJ e da CSLL".

Ou seja, a Receita Federal acabava fazendo uma injustificada distinção sobre o momento em que o indébito deveria ser oferecido à tributação, com base na via eleita pelo contribuinte para recuperação do indébito, se judicial ou administrativa.

Essa distinção era altamente questionável, pois sempre que a decisão judicial é ilíquida, não há que se falar em tributação no momento do trânsito em julgado, sendo irrelevante se o contribuinte optou pela recuperação do crédito pela via do precatório judicial ou pela compensação administrativa, pois essa escolha não altera a falta de certeza e liquidez do crédito no momento do trânsito em julgado.

Fato é que a ausência de uma posição mais assertiva da autoridade fiscal acabou levando os contribuintes a eleger diferentes marcos temporais para tributação do indébito, a saber: (i) a data do trânsito em julgado, (ii) a data em que houve o julgamento dos Embargos de Declaração da União no leading case pelo STF (maio de 2021), quando foi reafirmada a inconstitucionalidade da cobrança e esclarecido o critério para apuração do indébito (ICMS destacado) (iii) a data da habilitação do crédito na esfera administrativa, (iv) a data da transmissão das compensações, ou, ainda, (v) a data da homologação das compensações. Muitos buscaram o amparo do Poder Judiciário para validar o seu entendimento.

A novidade vem agora com a recém publicada Solução de Consulta 183, de 7 de dezembro de 2021, por meio da qual a Receita Federal alterou o seu entendimento e reconheceu que "na hipótese de compensação de indébito decorrente de decisões judiciais transitadas em julgado nas quais em nenhuma fase do processo foram definidos pelo juízo os valores a serem restituídos, é na entrega da primeira Declaração de Compensação, na qual se declara sob condição resolutória o valor integral a ser compensado, que o indébito e os juros de mora sobre ele incidentes até essa data devem ser oferecidos à tributação pelo IRPJ."

Embora ainda passível de questionamento, andou bem a Receita Federal ao rever o seu posicionamento para reconhecer que o indébito deve ser oferecido à tributação do IRPJ e da CSLL no momento da entrega da primeira declaração de compensação, pois é ali que o contribuinte exterioriza o valor integral a ser compensado.

A discussão que remanesce é se a tributação não deveria ocorrer apenas no ato da entrega das respectivas declarações de compensação pelo contribuinte, quando o indébito judicial é efetivamente utilizado para extinguir débitos próprios. Isso porque, o mais comum é que na primeira declaração de compensação a totalidade do crédito não seja consumida, remanescendo saldo a ser utilizado em períodos seguintes.

Afinal, a efetiva disponibilidade econômica ou jurídica da renda - fato gerador do IRPJ e da CSLL - somente se verifica quando o contribuinte transmite a compensação do indébito, momento em que o valor a ser recuperado se torna líquido e disponível, equivalendo à fase de "execução" de sentença na esfera administrativa.

Essa já foi antiga posição adotada pela Superintendência Regional da Receita Federal da 6ª Região Fiscal na Solução de Consulta 206 de 24 de novembro de 2003, quando entendeu que "no caso em que o exercício do direito de crédito se faça pela compensação dos valores, essa disponibilidade ocorre no momento em que surgirem os débitos a serem compensados".

O mesmo entendimento também já foi compartilhado pela Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) do CARF, quando entendeu que "havendo sentença condenatória ilíquida, (...) a sua disponibilidade jurídica para efeito de contagem do prazo decadencial se dá no momento da compensação, adaptando-se a aplicação do regime de competência ao caso concreto, para que as receitas sejam reconhecidas à medida em que o sujeito passivo contabiliza essas compensações" (Acórdão 9101-003.141).

A ponderação que fica aos contribuintes é se ainda há interesse no questionamento judicial do tema após essa nova orientação, mais razoável, externada pela Receita Federal na Solução de Consulta 183/2021, já que estamos lidando apenas com um aspecto temporal sobre o momento em que os valores devem ser oferecidos à tributação.

Rodrigo Bevilaqua

Rodrigo Bevilaqua

Sócio do escritório Cescon Barrieu.

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