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O valor e a responsabilidade do voto

Apesar de consumir uma a cada três horas do nosso trabalho, esta carga tributária não tem sido bem aplicada.

quinta-feira, 14 de abril de 2022

Atualizado às 10:38

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Em um verdadeiro regime democrático, todos os assuntos importantes são decididos pelo voto, isto é, pela escolha livre dos eleitores. Em outubro de 2022 vamos eleger 513 parlamentares Federais, outros 503 deputados Estaduais, 27 governadores além de 27 senadores e a presidência da república.

Para esta eleição estes deputados Federais por nós escolhidos na eleição passada, aprovaram em seu favor um recurso de R$ 4,9 bilhões de reais. Eles foram por nós eleitos, e aprovaram a favor este fundo eleitoral para os partidos políticos distribuírem entre si. Este dinheiro tem a finalidade de custear a campanha eleitoral deste ano, em outras palavras pagando a eles para que possam nos convencer a elegê-los novamente.

Todo dinheiro provém de algum lugar, onde alguém teve que trabalhar obtê-lo.  No caso dos 4,9 bilhões do fundo eleitoral, a origem é o orçamento que é mantido pela arrecadação de impostos, e pagos por você, ao ir fazer compras no supermercado ou ao abastecer o seu carro, onde metade é gasolina e a outra metade é formada por impostos.

A carga tributária brasileira é na ordem aproximada R$ 3.000.000.000.000,00 trilhões anuais, como nos informa o IBPT em parceria com a Associação Comercial de São Paulo.   

Ao elegermos os mandatários pelo voto, estamos ao mesmo tempo, lhes autorizando a gerenciar este orçamento de R$ 3 trilhões, o que equivale a 34% do PIB.  Em outras palavras estamos os autorizando a gastar o equivalente a quatro meses do nosso trabalho, ou uma a cada três horas nossas trabalhadas.

Isto porque, temos um PIB representado pela soma em moda de tudo aquilo que produzimos de bens e serviços em 2021, na casa de 9 trilhões.

Nossa carga tributária representa 1/3 do PIB, ou sejam 3 trilhões.  Desta arrecadação, R$ 1,8 trilhão, 60%, vai para remunerar o Estado e R$ 1,2 trilhão, 40%, vai para retornar, ao menos em tese, para o povo que paga estes impostos.

Apesar de consumir uma a cada três horas do nosso trabalho, esta carga tributária não tem sido bem aplicada. A prova disto é que a União Federal tem déficit orçamentário. A maioria dos Estados também está no vermelho, ou seja, gastam mais do que se arrecadam, a conta não fecha, falta dinheiro no orçamento.  Na maioria dos mais de cinco mil municípios cujas eleições serão daqui a dois anos, a situação não é diferente, gasta-se mais do que se arrecada.

De um lado, trabalhamos uma a cada três horas para pagar impostos, 34% do PIB.  De outro em todas as esferas, municipais, estaduais e federais, o orçamento, gasto maior que a despesa, está negativo. Já os serviços públicos prestados, ou seja, a contrapartida dos impostos que pagamos com nosso trabalho não nos atende satisfatoriamente.

De acordo com os dados oficiais, divulgados pelo ministério da Economia de tudo o que é arrecadado no país 60% vão para pagar a máquina pública.  O Ministério divulga os gastos da máquina pública como sendo 20% do PIB, o que tem o mesmo efeito, apenas soa melhor. Assim como divulga também em seu site uma carga tributária de 33,9% do PIB em 2021.

A expressão máquina pública ou máquina estatal é utilizada para definir o custo do funcionalismo público nas esferas federais, estaduais e municipais. A máquina pública é composta de prédios, funcionários, veículos oficiais, mobiliário, maquinário, equipamentos, insumos, combustível, comunicação, assessores, secretarias, Secretarias, titulares, adjuntos, chefes de gabinete, cargos de confiança., etc... 

Precisamos do serviço público. Todos precisamos de bons policiais, juízes, professores, médicos, e queremos que eles sejam bem pagos e remunerados.   Como cidadãos e pagadores de impostos nos sentimos indignados e ultrajados quando vemos um professor, policial, médico ou qualquer outro servidor público ser mal remunerado.  E estes heróis muitas vezes trabalham mais pelo dever, honestidade e amor a profissão do que a própria remuneração que recebem. Verdadeiros heróis.

Por outro lado, todos nós brasileiros, independente de gênero, orientação, raça ou classe social, temos um anseio em comum: A prestação de serviços públicos minimamente decentes. Seja o acesso ao saneamento básico, a uma vaga em creche para seus filhos enquanto estiverem trabalhando, ou seja, um atendimento digno nos hospitais e postos de saúde, além da segurança pública.  

Mas vejam, quando estamos falando em máquina estatal não estamos falando em nada disto. Estamos falando basicamente da folha de pagamento e da estrutura, que consome 60% da arrecadação. 

Os 40% restantes é que em tese devem ser destinados a construção e duplicação de estradas, asfaltamento, iluminação pública, serviços de esgoto.  Nossas estradas estão via em sua maioria sucateadas. Nos parece que o governo atual tem conseguido terminar algumas obras que estavam em andamento já há algumas décadas, mas ainda não é o suficiente.

Destes 40% restantes, além de estradas, esperamos hospitais, escolas, universidades, metrôs, a maioria das capitais brasileiras, não possui metrô. Necessitamos também de iluminação pública, serviços de esgoto, consultas, medicamentos.

Muito se fala em reforma tributária. É consenso que não existe mais espaço para aumento de impostos. A reforma tributária falada, visa então meramente simplificar a cobrança e arrecadação. Pois nem União, nem Estados, nem município, podem renunciar à arrecadação, vez que em sua maioria gastam com a máquina pública mais do que arrecadam, pouco ou quase nada sobrando para fazer investimentos.

Se a máquina pública custa caro, gasta mais do que arrecada e não consegue entre entregar os serviços e obras que a população que a sustenta necessita, um bom começo seria um olhar sobre os gastos desta mesma máquina pública.

Vamos tentar contribuir para este debate refletindo sobre o fato de que um parlamentar no Brasil custa cinco vezes mais do que em um país como Alemanha ou Canadá por exemplo.

Sendo estes países desenvolvidos, até se admitiria um parlamentar de lá custar mais do que um parlamentar aqui, mas não o contrário. Talvez justamente esta seja a explicação para serem países desenvolvidos, gastam menos por ano com um parlamentar do que nós.

O jornal O Estado de São Paulo, do dia 27/3/22, nos mostra que cada um dos 513 deputados Federais que iremos eleger em outubro nos custa R$ 24 milhões por ano, ou R$ 2 milhões por mês, entre salário, verba de gabinete, auxílio moradia, auxílio saúde, auxílio passagem aérea, assessores etc.

A matéria nos mostra que o custo de um parlamentar no Brasil é superior a soma do custo somado de países como Japão, Alemanha, França e Reino Unido. Vamos repetir para que não fiquem dúvidas: Somando o custo anual de um parlamentar destes quatro países, ainda não se atinge o custo anual de um parlamentar no Brasil.

A maioria da população brasileira, que recebe em torno de três salários-mínimos mensais, totaliza uma renda bruta anual em torno de 40 mil reais. Para atingir o que um parlamentar brasileiro consome mensalmente, 24 mil reais, este cidadão que percebe 40 mil reais ano teria de trabalhar 50 anos.

Ao elegermos alguém devem os ter consciência do cheque em branco por nós assinado que a ele estamos entregando para apenas preencher e gastar. Se o Brasil não está da forma que gostaríamos, precisamos refletir sobre o fato de que fomos nós que elegemos os deputados e senadores que aí estão.  Pois tanto aqui como nos EUA, o presidente, sem apoio do congresso não consegue governar.  Em outras palavras o Congresso Nacional, deputados e senadores, acaba tendo um poder de decisão maior do que o executivo, presidente e governadores.

A verdadeira mudança começa quando assumimos a responsabilidade por aquilo que fazemos, em outubro de 2022 teremos novamente esta oportunidade no Brasil, afinal de contas vamos eleger pessoas e dar a elas um cheque em branco, representada pela arrecadação tributária que consome uma a cada três horas por nós trabalhadas.

Ivo Ricardo Lozekam

Ivo Ricardo Lozekam

Tributarista. Diretor do Grupo Lz Fiscal. Articulista da IOB, Thomson Reuters entre outras. Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários e do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário.

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