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Metatag e o direito à indenização pelo uso não autorizado de marca e nome empresarial

A utilização de metag em websites se apresenta como importante ferramenta para atividade empresarial na internet, mas a utilização inadequada de tal ferramenta técnica pode justificar pedido indenizatório.

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Atualizado em 26 de maio de 2022 11:34

No mundo moderno, ao longo do tempo, a internet passou a ter papel determinante na atividade empresarial. No atual cenário econômico e social, tal afirmação nunca foi tão presente.

De fato, na contramão do comércio regular, o mercado eletrônico vem se consolidando como grande diferencial no faturamento de empresas, possibilitando grande fluxo de negócios e valores.

Isso somente é possível em razão de inúmeros endereços eletrônicos ("sites") nos quais fornecedores disponibilizam seus produtos aos consumidores. Estes, por sua vez, se utilizam de sistemas de buscas a fim de localizar determinado bem de consumo ou serviços.

Em linhas gerais, os sistemas de busca eletrônico analisam as páginas existentes na internet, armazenam os resultados obtidos em uma base de dados e fornecem determinado resultado ao usuário.

A fim de realizar tais atividades, os sistemas de busca se utilizam de computadores, base de dados e algoritmos específicos denominados de robôs. Estes são responsáveis pela varredura na internet, coletando as informações e registrando o conteúdo no banco de dados da plataforma de busca, como bem explica Regina Meyer Branski1:

Os robôs percorrem a rede coletando informações. Iniciam seu caminho a partir de um conjunto de páginas selecionadas por seus administradores que são escolhidas por serem populares, de alta qualidade e por conterem grande quantidade de links. Os robôs visitam os sites, lendo seu conteúdo, armazenando cada uma das palavras encontradas e seguindo os links para outras páginas. Seguem os links para encontrar outros links e ir, sucessivamente, adicionando os endereços ao banco de dados. Diferentemente dos catálogos, os sites são incluídos no banco de dados sem nenhuma classificação ou descrição de seu conteúdo.

Ocorre que, em razão da grande quantidade de dados existentes e para otimizar a coleta de dados, os desenvolvedores dos programas de busca geralmente programam seus robôs para captarem dados específicos em cada site visitado. Com isso, partes consideradas como relevantes pelos desenvolvedores dos sistemas de busca são analisadas pelos robôs e armazenadas no banco de dados, como é o caso das metatags.

Metatags nada mais são do que linhas de programação existentes nos sites, utilizadas para classificar e indicar, de forma mais concisa, o conteúdo existente em determinado link de internet2. Com efeito, as metatags são utilizadas pelos programas de busca como instrumentos para localizar determinado conteúdo no ambiente da internet.

Há diversos tipos de metatags, dentre as quais podemos destacar a metatag name, com a utilização dos atributos de Author, Description e Keywords, pois em tais comandos é possível inserir expressões que façam referência a nomes empresariais e marcas registradas.

Assim abre-se a discussão: a utilização por terceiros de nome empresarial e marcas, sem a concordância dos titulares, no âmbito dessa metatag, acarreta no direito de indenização? Em caso positivo, em que medida o dano necessita efetivamente ser comprovado, ou ele decorre do próprio fato (in re ipsa)?

As respostas para tais indagações não estão consolidada perante o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Há aqueles que entendem que a utilização de expressões na metatag que remetam a marcas e nomes empresariais não acarretam por si só o dever de indenizar, sendo necessário a comprovação de danos. Assim, seria necessária a demonstração tanto do dano moral efetivo, quanto a existência de concorrência desleal a fim de conferir direito à indenização pelo dano material:

RESPONSABILIDADE CIVIL. Danos materiais. Utilização da marca "Zetaflex" como metatag no código fonte do endereço eletrônico da ré. Violação ao direito de proteção à marca. Inexistência de prova, porém, de que no endereço eletrônico da havia informação capaz de induzir a erro o consumidor. Hipótese em que produto semelhante ao fabricado pela autora ("Zetaflex") é comercializado sob a marca "Aero Poli". Concorrência desleal não configurada. Improcedência do pedido de condenação ao pagamento de lucros cessantes. Apelação improvida. DANO MORAL. Violação do direito de exclusividade da marca. Insuficiência, por si, para caracterizar o dano moral. Desvalorização da marca não demonstrada pela autora. Abalo da imagem e reputação da autora no mercado não comprovada. Indenizatória improcedente. Apelação improvida. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. Marca. Utilização da marca "Zetaflex" como metatag no código fonte do endereço eletrônico da ré. Violação ao direito de proteção à marca. Improcedência do pedido de condenação da ré à publicação de contrapropaganda. Desproporcionalidade com a utilização do verbete no metatag. Impacto publicitário e custo bem superior a eventuais prejuízos causados à autora (estes não identificados ou provados). Hipótese, ademais, em que a ré utilizava no endereço eletrônico apenas a marca "Aero Poli" (de sua propriedade) que possui elemento comum com a marca "Aeroteto", também de titularidade da demandante, mas cuja proteção não foi pleiteada neste processo. Cominatória parcialmente procedente. Apelação improvida. Dispositivo: negam provimento. (Apelação nº 1030641-91.2013.8.26.0100, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, Desemb. Rel. Ricardo Negrão, jul. 22.09.2014, dje. 25.09.2014)

Nesse sentido, o E. desembargador relator Ricardo Negrão afirma que, muito embora a utilização da marca tenha sido erroneamente utilizada por terceiros, tal fato não acarretaria danos materiais:

"Destarte, conquanto haja utilização indevida da expressão "Zetaflex", não há como presumir que houve, de fato, desvio de clientela, como argumenta a recorrente."

Neste ponto, é importante observar que a justificativa para a concessão da tutela requerida, seria a necessidade de  que o ato do pretenso violador do direito  confunda o usuário acerca do produto a ser adquirido:

"A prova do prejuízo material deve ser pré-constituída e é estritamente documental, mas a apelante não comprovou violação do direito do consumidor, e tampouco demonstrou os benefícios que deixou de auferir com a violação do direito de exclusividade ou os benefícios auferidos pelos réus."

No que se refere ao dano moral o I. relator manteve a mesma linha argumentativa, ao afirmar que o dano moral deveria ser comprovado pela parte apelante, principalmente no que se refere à desvalorização da marca:

"Contudo, a violação do direito de exclusividade da marca não é apta, por si, para caracterizar o prejuízo extrapatrimonial. (...) No caso concreto, embora o uso da marca pela ré tenha sido indevido, não se desincumbiu a autora de demonstrar a desvalorização da marca, ônus que lhes incumbia."

Portanto, para aqueles que defendem a presente linha argumentativa, é necessário que o interessado comprove em juízo que sofreu efetivos danos decorrentes da utilização do seu nome empresarial e marca de forma indevida por terceiros quando inseriram expressões de busca no seu código de meta-tag.

Em contrapartida, há quem defenda que a mera utilização de nome empresarial e marca, sem a devida autorização do titular do direito, acarretaria o dever de indenizar, pois, como pondera Pablo Stolze Gagliano, considera-se "dano ou prejuízo como sendo a lesão a um interesse jurídico tutelado - patrimonial ou não -, causado por ação ou omissão do sujeito infrator"3

Nesse sentido, aquele que registra determinada marca visa garantir proteção a seu trabalho inovador e com ele busca satisfação patrimonial decorrente de sua exploração, nos dizeres de Rubens Requião:

"O direito sobre a marca é patrimonial e tem por objeto bens incorpóreos. O que se protege é mais do que a representação material da marca, pois vai mais a fundo, para atingir sua criação ideal. O exemplar da marca é apenas o modelo, a representação sensível. A origem do direito é a ocupação, decorrendo, portanto, do direito natural que assegura a todos o fruto do trabalho."4

No que se refere ao registro do nome empresarial, este também confere ao seu titular a utilização e exploração exclusiva do titular do direito:

"O direito à exclusividade é inerente ao nome comercial. A sua designação não deve comportar colidência com outro nome homônimo ou homófono."5

Assim, a exploração indevida de elementos de empresa que são juridicamente protegidos, poderiam gerar indenização. Neste ponto, em outro julgamento, o E. TJ do Estado de São Paulo, ao declarar o caráter parasitário da ação do terceiro - intuito de atrair consumidores- condenou a parte ao pagamento de indenização por danos morais e materiais.

"Propriedade industrial. Marca. Concorrência desleal. Uso pela ré, tanto no código fonte de sua página eletrônica quanto em seu endereço de email, de termos correspondentes a marcas nominativas de titularidade da autora (Zetaflex e Aeroteto), além da adoção de nome de domínio (www.tetoabreefecha.com.br) similar ao slogan publicitário (cobertura abre e fecha) há muito utilizado pela autora. Sentença de parcial procedência, com reconhecimento tão somente das violações marcárias e imposição de dever de abstenção quanto a tais condutas. Reprodução praticamente servil do mote publicitário da autora no endereço do website da ré, que não emprega essa expressão linguística apenas com intuito de informar eventuais atributos de seus produtos, e tampouco a usa em associação com outros sinais próprios e dotados de autonomia, mas sim como símbolo publicitário autônomo. Mera substituição do vocábulo "cobertura" pelo termo "teto" que nada altera em termos de representação simbólica. Atuação de ambas as partes no mesmo segmento econômico, relativo à produção e comercialização de tetos e toldos de proteção contra intempéries. Utilização das marcas de titularidade da autora, no código HTML da página eletrônica da ré, com o propósito atrair potenciais clientes em busca de produtos da parte contrária por meio de websites de busca. Intuito parasitário caracterizado. Emprego da expressão "teto abre e fecha" que se mostra capaz de provocar confusão por parte do público consumidor. Caráter evocativo dos elementos componentes dessa locução linguística que não autoriza sua utilização, de forma isolada, por parte de empresa concorrente. Concorrência desleal configurada. Imposição de dever de abstenção à ré, para cessação de tais práticas. Lucros cessantes. Prejuízos patrimoniais presumidos pelo legislador em hipóteses envolvendo violação a direito de propriedade industrial e concorrência desleal. Indenização por dano material devida, a ser apurada em fase de liquidação, de acordo com o critério previsto no art. 210, III, da Lei nº 9.279/96. Danos morais igualmente caracterizados, segundo orientação predominante nas C. Câmaras Reservadas de Direito Empresarial. Imposição da realização de contrapropaganda. Descabimento. Medida desproporcional e desnecessária à satisfatória reparação dos prejuízos advindos dos ilícitos praticados pela ré. Sentença de parcial procedência reformada para acolher em maior extensão o pedido inicial, apenas no tocante às pretensões inibitórias e indenizatórias. Apelação da autora parcialmente provida para tal fim." (Apelação nº 0043635-74.2013.8.26.0002, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, Desemb. Rel. Fabio Tabosa, jul. 12.04.2019)

Seguindo esse entendimento, em situação semelhante, há entendimento do E. TJ de São Paulo acerca do dano moral indenizável quando há compra do nome ou marca do concorrente como termo de pesquisa junto aos sistemas de buscas ("adwords")6. Tal dano moral seria in re ipsa:

"TUTELA ANTECIPADA - Demanda que pretende a inibição da utilização da marca "decoradornet" como adword pela ré, que atua no mesmo ramo empresarial - Ordem de eliminação do adword deferida em primeiro grau - Pertinência - Razões recursais da requerida que pretendem afastar sua responsabilidade na situação concreta - Descabimento - Plausibilidade e perigo de dano presentes - Ordem de primeiro grau bem lançada - Pedido de reforma insubsistente - Agravo não provido. DISPOSITIVO: Negaram provimento ao agravo de instrumento." (Apelação nº 2255727-28.2020.8.26.0000, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, Desemb. Rel. Ricardo Negrão, jul. 05.02.2021)

Em que pese existirem decisões proferidas no âmbito do E. STJ condenando partes ao pagamento de indenização por danos material e moral em razão de contrafação, certamente que a utilização de elementos de empresa no âmbito da codificação dos endereços eletrônicos ainda deverá ser analisada por aquela corte.

Diante do exposto, denota-se que a problemática envolvendo pedidos indenizatórios decorrentes da utilização de elementos de empresa de terceiros nas metatags ainda não está consolidada perante o poder Judiciário e é pouco abordada, sendo certo que a insegurança jurídica ainda poderá causar decisões conflitantes.

_____

BRANSKI, Regina Meyer. Recuperação de informações na Web. Disponível em: http://portaldeperiodicos.eci.ufmg.br/index.php/pci/article/viewFile/351/160.p.74. Acesso em 09.05.2022.

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BRASL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1535668/SP. Recorrente: Nike Internacional LTD e Nike do Brasil Comércio e Participações Ltda. Recorrido: Imadco Comércio de Brinquedos Eletrônicos Ltda..3ª Turma do E. Superior Tribunal de Justiça. Ministra Relatora Nancy Andrighi. jul. 15.09.2016. publ. 26.09.2016.

BRASL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1661176/MG. Recorrente: Agnaldo Luis Soares. Recorrido: Vassouras Hobynwood Ltda..3ª Turma do E. Superior Tribunal de Justiça. Ministra Relatora Nancy Andrighi. jul. 06.04.2017. publ. 10.04.2017.

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BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível nº 1030641-91.2013.8.26.0100. Recorrente: Vemax Comercial Ltda.. Recorrido: COBERMERC - Indústria e Comercio de Coberturas Ltda. - ME.2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do E. Tribunal de Justiça de São Paulo. Desembargador Relator Ricardo Negrão. jul. 22.09.2014. disponibilização 25.09.2014.

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1 BRANSKI, Regina Meyer. Recuperação de informações na Web. Disponível em: http://portaldeperiodicos.eci.ufmg.br/index.php/pci/article/viewFile/351/160.p.74. Acesso em 09.05.2022.

2 SARTI, Erika. Meta Tags - O que são e como utilizá-las. Disponível em: https://www.infowester.com/metatags.php. Acesso em 09.05.2022.

3 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de direito civil, vol. 3: responsabilidade civil/Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho.13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.p.82.

4 Op.cit.p.314.

5 Op.cit.p.303.

6 Neste caso, o interessado adquire o termo de pesquisa que é equivalente ao nome do concorrente junto ao sistema de busca, para que, como resultado da pesquisa realizada pelo consumidor, apareça o seu website.

Thiago Conrado

VIP Thiago Conrado

Sócio do escritório Cruz & Fernandes Sociedade de Advogados, especialista em Direito e Tecnologia da Informação e Proteção de Dados, com ampla atuação em processos nas áreas cível e tecnologia.

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