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A decisão do STF sobre a quebra dos efeitos da coisa julgada em matéria tributária e o 3º setor

A declaração da constitucionalidade da renovação periódica do CEBAS interrompeu automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado que asseguravam direitos aos certificados expedidos por prazo indeterminado.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Atualizado às 07:46

Esta semana, o STF, no julgamento do RE 955.227 e RE 949.297, por unanimidade há tempos não vista, fixou a seguinte tese: "1. As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo. 2. Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo."

A decisão tem efeitos importantíssimos, mas em desfavor dos contribuintes, particularmente daqueles que obtiveram, em seus processos individuais, desonerações tributárias que, mais tarde, em processos de efeito mais amplo, como as ações diretas e em sede de repercussão geral, foram revertidas, ou não reconhecidas, pelo STF.

Embora os RE 955.227 e 949.297 tivessem empresas como partes, os efeitos da decisão transcendem o mundo empresarial e afetam também as organizações da sociedade civil, que, não raro, buscam o Judiciário para garantir suas certificações, isenções e imunidades.

Uma das situações afetadas pelo julgado dessa semana é a controvérsia sobre a renovação periódica do CEBAS. Esse certificado surgiu em 1959 com a Lei 3.577, que isentou entidades filantrópicas da taxa de contribuição de previdência, exigindo, apenas, que as entidades fossem declaradas de utilidade pública federal (lei 91/1935) e que não remunerassem suas diretorias. Para saber quem era ou não filantrópica, criou-se o "Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos" (o "CEFF"), que era emitido por prazo indeterminado.

Quando a lei 3.577/59 foi revogada pelo decreto-lei 1.572/77, esta última estabeleceu que a revogação não prejudicaria as instituições que então eram reconhecidas como de utilidade pública federal e fossem portadoras de certificado de entidade de fins filantrópicos com validade por prazo indeterminado.

Mais tarde, com a regulação da imunidade constitucional pela lei 8.212/91, que exigia renovação trienal do certificado, diversas entidades obtiveram do Judiciário o reconhecimento de seu direito líquido e certo à certificação (e à desoneração), enquanto cumprissem os requisitos da lei 3.577/59. Cito, por exemplo, a decisão do STJ no MS 9.213/DF (Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 11/10/04) onde ficou assente que "a entidade reconhecida como de caráter filantrópico em data anterior ao decreto-lei 1.522/77 tem assegurada a manutenção da isenção à quota patronal da contribuição previdenciária, com direito à obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social". Com base em decisões análogas, entidades mantiveram-se à margem do processo de renovação periódica do CEBAS para gozo da isenção.

Quando o CEBAS foi apreciado pelo STF no RE 566.622, em sede de repercussão geral, ficou assentado a constitucionalidade do art. 55, II, da lei 8.212/91, na redação original e nas redações que lhe foram dadas pelo art. 5° da lei 9.429/96 e pelo art. 3° da Medida Provisória 2.187-13/01, que dispunham sobre a renovação periódica da certificação.

A decisão do STF no RE 566.622 conflitava, por exemplo, com a decisão do STJ no MS 9213.  Agora, não mais. A declaração da constitucionalidade da renovação periódica do CEBAS interrompeu automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado que asseguravam direitos aos certificados expedidos por prazo indeterminado. A renovação, agora, é para todos.

Eduardo Szazi

Eduardo Szazi

Doutor em Direito Internacional, Vice-Presidente da Comissão de Direito Internacional da OAB/PR e sócio de Szazi, Bechara, Storto, Reicher e Figueirêdo Lopes Advogados.

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