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Resolução 19/23, da secretaria de parcerias em investimentos de SP e seus impactos nos contratos de concessão

Augusto Neves Dal Pozzo e Bruno José Queiroz Ceretta

A relevância do instrumento está nas suas diretrizes técnicas. Há uma sensível importância nos pontos particulares de que trata, seja para os regulados, seja para os usuários.

quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Atualizado às 08:29

Com o objetivo de incrementar a segurança jurídica nos chamados "pleitos de mitigação de impacto em cenários de desequilíbrio econômico-financeiro", a SPI, do Estado de São Paulo, publicou a resolução 19, de 29 de maio de 2023, na edição do Diário Oficial estadual de 31 de maio.

O instrumento regulamenta parte do decreto 67.435, de 1º de janeiro de 2023.1 E estabelece orientações a SPI e as autarquias a ela vinculadas,2 tais como a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (ARSESP) e a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (ARTESP). Logo, pode ser aplicado em uma gama de contratos de delegação de serviços públicos.

No decorrer do texto, tem-se um reconhecimento implícito e expresso da complexidade encontradiça nos procedimentos dessa natureza. É o que se pode interpretar dos motivos que antecedem a norma. No mesmo sentido, ela manifesta preocupação literal com as consequências de cenários de desequilíbrios econômico-financeiros persistentes, os quais podem resultar em danos maiores, tanto para a coletividade, com a redução da qualidade dos serviços e desencorajando investimentos, quanto para as partes envolvidas, pela potencial violação à segurança jurídica dos contratos.

Para otimizar os procedimentos de mitigação do impacto de desequilíbrios econômico-financeiros, garantindo-lhes a estabilidade e a celeridade antes mencionada, formulam-se parâmetros orientadores, concretizados pela fixação de critérios objetivos.

A norma ainda aponta um rol de medidas cautelares que poderão ser adotadas, como "a antecipação, postergação ou cancelamento de investimentos programados"3; a "elevação ou redução de valores devidos ao Poder Concedente ou à autarquia responsável pela fiscalização da execução contratual"4; o "pagamento de valores à concessionária, a título de indenizações, ressarcimentos ou afins"5; a "transferência a uma das partes de custos ou encargos originalmente atribuídos à outra"6; entre outras alternativas. É importante referir que o conjunto de possibilidades é exemplificativo, sendo que outras formas não se encontram excluídas.

Na sequência, esclarecem-se os modos de suscitar a mitigação dos desequilíbrios econômico-financeiros: de ofício, pela própria SPI; por recomendação de órgãos e autarquias responsáveis pela gestão contratual; ou, ainda, por qualquer interessado.7

De forma a reforçar a sua efetividade, a Resolução fixa as oportunidades em que a avaliação de cabimento de medidas cautelares de mitigação de desequilíbrio econômico-financeiro torna-se obrigatória. São elas: "potencial comprometimento da continuidade da prestação dos serviços ou da solvência da concessionária"8; a aproximação do final do prazo de vigência da concessão, com a "subsistência de saldo regulatório ao final do contrato"9; e, ainda, nas circunstâncias em que o desequilíbrio-econômico-financeiro alcançar certos patamares.10

Sobre o último fator, cabe detalhar: basta que o desequilíbrio tenha um impacto "anual ou a título de custos adicionais ou perda de arrecadação" de mais de 5% da arrecadação bruta ou, consolidado, no caso de eventos de desequilíbrio contínuos no tempo;11 e "de mais de 5% da arrecadação bruta da concessionária" na hipótese de "eventos de desequilíbrio cujos efeitos não sejam projetados para o futuro".12 Com o objetivo de assegurar o tratamento técnico do assunto, definem-se, ainda, outros requisitos e pressupostos complementares.

Ora, diante da complexidade da situação contratual, essas normatizações fornecem critérios. Não atenuam a densidade da matéria, mas constituem roteiros que podem, de fato, dinamizar a discussão acerca do assunto. Quaisquer lentidões são inconvenientes e, portanto, evitáveis para todas as partes.

O restante da norma endossa o papel das agências na identificação dos contratos que precisam de medidas cautelares de mitigação de desequilíbrio econômico-financeiro13 e o procedimento de implementação das referidas cautelares.14 Reforce-se, é perceptível o esforço em garantir maior ordenação e consistência à matéria.

Com relevância, o Regulamento endossa o papel do Secretário de Parcerias em Investimentos na aplicação de medida cautelar de mitigação de desequilíbrios econômico-financeiros.15 Para tanto, necessariamente, utilizará os subsídios produzidos acerca do assunto.

Garante-se tramitação prioritária dos processos administrativos em que houver avaliação do impacto econômico-financeiro, com o objetivo de que o desequilíbrio seja identificado em definitivo.16 Prevê-se, ainda, relatório circunstanciado das atividades para identificação do desequilíbrio, com periodicidade trimestral, à SPI.17

Esses procedimentos afetam os players de forma direta. As cautelares, mencionadas antes, correlacionam-se ao desejo - e autêntica necessidade - de celeridade.

Enquanto resolução, não inova de modo amplo no ordenamento jurídico, evidentemente. A relevância do instrumento está nas suas diretrizes técnicas. Há uma sensível importância nos pontos particulares de que trata, seja para os regulados, seja para os usuários. O desafio é compreender como será aplicada e se haverá uma intelecção convergente de seus enunciados entre as entidades do governo central e das respectivas agências reguladoras, de modo a promover, com brevidade e eficiência, o saneamento de situações precárias que podem colocar em risco a escorreita execução dos contratos de concessão.

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1 Artigo 12. Compete ao Secretário de Parcerias em Investimentos representar o Estado, na condição de Poder Concedente, na prática dos atos a este reservados por lei, regulamento ou contrato, em relação aos seguintes serviços públicos:

I - transporte rodoviário;

II - transporte hidroviário;

III - transporte aeroviário;

IV - transporte coletivo intermunicipal não metropolitano de passageiros;

V - transporte metroferroviário;

VI - distribuição de gás;

VII - saneamento básico em regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões.

2 Conforme artigo 1º do da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

3 Conforme artigo 2º, III, 'a', da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

4 Conforme artigo 2º, III, 'd', da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

5 Conforme artigo 2º, III, 'f', da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

6 Conforme artigo 2º, III, 'h', da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

7 Conforme artigo 2º, IV, da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

8 Conforme artigo 3º, I, da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

9 Conforme artigo 3º, II da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

10 Conforme artigo 3º, III da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

11 Conforme artigo 3º, III, 'a' da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

12 Conforme artigo 3º, III, 'b' da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

13 Conforme artigo 4º da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

14 Conforme ilustra, por exemplo, o artigo 5º da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

15 Conforme artigo 6º da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

16 Conforme artigo 7º, I da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

17 Conforme artigo 7º, II da Resolução SPI n. 19, de 29 de maio de 2023.

Augusto Neves Dal Pozzo

Augusto Neves Dal Pozzo

Professor de Direito Administrativo e Fundamentos de Direito Público da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Doutor e Mestre em Direito Administrativo pela PUC-SP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura (IBEJI). Vice-Presidente da Comissão de Infraestrutura, Logística e Desenvolvimento Sustentável da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo. Advogado e Parecerista. Sócio-fundador do Dal Pozzo Advogados.

Bruno José Queiroz Ceretta

Bruno José Queiroz Ceretta

Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor em Diritto Pubblico pela Universidade de Roma I "La Sapienza". Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Advogado no Dal Pozzo Advogados.

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