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Regimes de contratação integrada e semi-integrada na nova lei de licitações

Camillo Giamundo e Leonardo Muradian Cundari

Nova lei de licitações (lei 14.133/21) combina dispositivos da lei 8.666/93 com elementos de outras normas de contratações públicas, como Pregão e RDC, visando unificar procedimentos.

quinta-feira, 28 de março de 2024

Atualizado às 07:47

A nova lei de licitações (lei 14.133/21), a despeito de conservar boa parte dos dispositivos e ritos previstos na antiga lei (lei 8.666/93), foi responsável por integrar uma série de mecanismos presentes em normas específicas de contratações públicas, como a lei do pregão (lei 10.520/02) e o Regime Diferenciado de Contratações (lei 12.462/11). 

Exemplo disso é a contratação integrada e a contratação semi-integrada, modalidades já existentes e, portanto, testadas pela Administração Pública ao longo dos últimos anos, e que foram incorporadas na norma geral de licitações com a finalidade de unificar certos aspectos do procedimento licitatório em uma mesma lei.

Inicialmente prevista nas contratações promovidas pela Petrobras, a contratação integrada passou a ser efetivamente disseminada a partir da edição da lei do regime diferenciado de Contratações, instituído especialmente para acelerar a construção e modernização de estádios e aeroportos com vistas a aprimorar a infraestrutura do país para a recepção da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016. A novidade chamou atenção pelo caráter modernizador, apesar de, na prática, o a modalidade sofreu uma série de críticas direcionadas a contratações com superfaturamento ou que não foram entregues.

Dez anos depois de sua positivação, a contratação integrada e semi-integrada foi adotada pela nova lei de licitações, tornando-se importante compreender seu conceito, funções e finalidades.

A contratação integrada é, nos termos da própria lei, um regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver os projetos básico e executivo, executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto.

Já a contratação semi-integrada se define da mesma maneira, com exceção do fato que a contratada não elabora nem desenvolve o projeto básico, e sua atuação se inicia a partir do projeto executivo. 

Essas modalidades de contratação funcionam conforme o escopo do turn-key, ou "virada de chave", na qual a contratante, no caso a Administração Pública, recebe a obra já em sua versão final, pronta para iniciar as atividades e cumprir sua finalidade.

A partir disso, percebe-se que o particular contratado fica encarregado de elaborar, desenvolver e executar a maior parte do contrato, o que se mostra uma mudança significativa com relação à antiga lei de licitações: agora, uma mesma empresa poderá ser encarregada de elaborar o projeto e executar a obra, o que até então era vedado pelo art. 9° da antiga lei.

A finalidade destas modalidades está contida no próprio nome do instituto: a integração das etapas da obra ou serviço de engenharia por meio da delegação à iniciativa privada, desde o projeto básico até a entrega em sua forma final. Essa finalidade visa a proporcionar (i) maior padronização no serviço prestado ou na obra executada, tendo em vista a presença de uma mesma empresa ao longo de quase todo o processo; e (ii) redução de custos, uma vez que a fragmentação das contratações demandaria mais de um procedimento licitatório, cada um com um objeto específico, e um maior dispêndio econômico-financeiro em consequência da lógica do "varejo e atacado", ou seja, contratar serviços de uma mesma empresa pode sair mais barato do que fragmentá-los entre diversas contratadas.

Apesar destes avanços no aspecto da inovação e da modernização de obras públicas, essas modalidades também possuem encargos relevantes às empresas. Decorre da previsão legal que, em razão da delegação do projeto e da execução, boa parte dos encargos e dos riscos ficarão sob responsabilidade do particular contratado, que responderá pelos fatos supervenientes à contratação (art. 22, §4°, nova lei de licitações). No entanto, no tocante aos demais riscos inerentes, sejam eles quais forem, a lei exige que o edital contemple uma matriz de riscos celebrada entre a Administração Pública e a empresa, alocando-os entre ambas.

A matriz de riscos, por sua vez, é uma cláusula contratual obrigatória nas modalidades de contratação aqui discriminadas, na qual deve-se definir os riscos decorrentes da contratação e distribuí-los entre as partes, além de configurar o equilíbrio econômico-financeiro inicial. A partir desta cláusula, em razão desta configuração inicial, hipóteses de reequilíbrio econômico-financeiro serão admissíveis apenas quando a causa não estiver prevista na matriz de riscos, ou seja, quando não houver demarcação prévia de responsabilidade pelo ocorrido.

Sob a ótica da iniciativa privada, deve-se notar que tais modalidades permitem uma margem relativamente maior para sua atuação, contanto que formalmente aprovada pela Administração Pública (arts. 6°, XXVII, "b", e 46, §3°). Sendo assim, cabe ao particular contratado harmonizar as partes do projeto, do fornecimento de bens, da execução, entre outras etapas delegadas a ela.

Essa categoria de contratação se enquadra na proposta modernizadora da Administração Pública de alcançar metas e resultados mais vantajosos e inovadores, da qual é possível deduzir o uso do método conhecido como performance based accountability, ou seja, a prestação de contas é voltada em maior medida ao resultado final. Ao se modelar como forma de contratação focada nas metas, a própria Lei separa obrigações de meio das obrigações de resultado, justificando-se uma maior liberdade concedida ao particular contratado para inovar.

A experiência com a modalidade de contratação integrada ou semi-integrada, até aqui, se mostrou bastante acertada e positiva no setor de infraestrutura brasileira para os objetivos aos quais foi idealizada, de modo que estando agora expressamente prevista na lei geral de licitações, espera-se que elas contribuam para um maior dinamismo nas contratações públicas, ao mesmo tempo que garantam a segurança jurídica por meio da alocação de riscos previamente estipulada entre contratante e contratada.

Camillo Giamundo

Camillo Giamundo

Sócio fundador do escritório Giamundo Neto Advogados.

Leonardo Muradian Cundari

Leonardo Muradian Cundari

Acadêmico de direito, integrante da equipe de direito público do escritório Giamundo Neto Advogados.

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