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Desistência em ação de desapropriação: Honorários pacificados pelo STJ

STJ pacifica critério para fixação de honorários de sucumbência quando há desistência da ação de desapropriação: impactos e diretrizes para a advocacia.

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Atualizado às 14:10

Contexto legal e histórico do julgamento

O art. 27, § 1º, do decreto-lei 3.365/41 prevê que os honorários advocatícios devem ser fixados entre 0,5% e 5% da diferença entre o valor ofertado pelo poder público expropriante e o valor da indenização fixada em sentença.

Todavia, o desafio surge quando o poder público expropriante desiste da ação de desapropriação, pois sem uma sentença condenatória ou proveito econômico direto não há base de cálculo dos honorários sucumbenciais, o que fez com que surgissem diversas decisões judiciais divergentes e subjetivas ao longo dos anos baseando-se nos seguintes fundamentos: (i) os percentuais do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC (critérios quando a Fazenda Pública for parte); (ii) os percentuais previstos no artigo 85, §2º (10% a 20% do valor da causa); (iii) os percentuais do art. 27, § 1º, do decreto-lei 3.365/41 (0,5% e 5%); e (iv) arbitramento por apreciação equitativa prevista no art. 85, § 8º, do CPC (subjetividade do magistrado ao caso concreto até o ano de 2022 quando houve a inclusão do § 8º-A).

O STJ reconhece que, em situações em que o valor da causa é irrisório, as alíquotas do decreto-lei 3.365/41 não se aplicam. Nesses casos, os honorários devem ser arbitrados por apreciação equitativa, conforme previsto no art. 85, § 8º, devendo observar o disposto no § 8º-A do mesmo dispositivo legal.

Verifica-se que, em diversas ocasiões, magistrados têm optado pelo arbitramento por apreciação equitativa de maneira que se desvia do entendimento consolidado pelo STJ. Há uma miríade de casos em que tal critério foi indevidamente aplicado em ações cujo valor da causa excedia a casa dos sete dígitos, ao passo que percentuais predeterminados foram usados em litígios cujo valor não ultrapassava cinco dígitos. Assim, observa-se que o arbitramento por apreciação equitativa tem sido corriqueiramente empregado em causas de elevado valor econômico, em contrariedade à orientação do STJ, que prevê tal metodologia apenas para situações em que o valor da causa é irrisório ou inestimável.

Em razão deste contexto, a questão foi levada para análise do STJ, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.231), e a decisão tem efeito vinculante para os demais tribunais do país.

Tese firmada

Nos autos do REsp 2129162 - MG, de relatoria do ministro Paulo Sérgio Domingues, discutia-se a fixação de honorários quando a Fazenda Pública desiste da ação de desapropriação, após o ajuizamento e citação válida do réu.

O STJ reafirmou que, nesta hipótese, há sucumbência da parte expropriante, nos termos do art. 90, caput, do CPC, sendo, portanto, devida a verba honorária ao patrono da parte expropriada.

A tese jurídica firmada é que os honorários devem ser calculados com base nos percentuais definidos no art. 27, § 1º, do decreto-lei 3.365/41 (entre 0,5% e 5%), considerando o valor atualizado da causa.

A tese firmada alcança todos os casos com exceção daqueles em que o valor da causa for baixo, pois subsiste o entendimento do próprio STJ que nestes casos devem ser arbitrados por apreciação equitativa, conforme previsto no art. 85, § 8º, do CPC.

A decisão tem efeito vinculante e deverá ser observada pelos demais tribunais do país.

Impactos práticos para o órgão expropriante e para a advocacia

A decisão em questão exerce impactos significativos sobre a forma como a Administração Pública deve conduzir suas estratégias ao ingressar com a ação de desapropriação. A desistência da ação, que frequentemente ocorre por razões orçamentárias, administrativas ou técnicas, passa a implicar um ônus financeiro adicional - os honorários sucumbenciais - que anteriormente eram objeto de controvérsia nos tribunais.

Para os advogados de expropriados, a tese representa maior segurança jurídica e valorização do trabalho profissional. Não são incomuns os casos em que profissionais atuaram durante anos na fase administrativa e, posteriormente, na esfera judicial com o ajuizamento da ação expropriatória,  contudo, com a desistência da ação, seus honorários sucumbenciais foram arbitrados por apreciação equitativa de forma indiscriminada, muitas vezes de maneira irrisória e incompatível com o elevado "munus publico" do advogado, defensor da justiça e dos direitos dos cidadãos.

Toma-se como exemplo o ocorrido nos autos do processo de 1015511-37.2015.8.26.0053: valor ofertado a título de indenização à propriedade imóvel de R$ 13.473.186,00. O primeiro laudo judicial avaliou o imóvel expropriado em cerca de R$ 80.000.000,00. Teve segunda perícia e o segundo laudo judicial apurou aproximadamente R$ 33.000.000,00. Após anos de tramitação processual, o Poder Público Expropriante desistiu da ação. O juiz de primeira instância fixou os honorários de sucumbência com base nos artigos 85, §§ 2º e 3º, do CPC (critérios aplicáveis quando a Fazenda Pública é parte), mas o TJ/SP reformou a condenação, arbitrando os honorários advocatícios por apreciação equitativa em R$ 60.000,00.

Conclusão

O Tema 1.231 do STJ representa um marco na fixação dos honorários sucumbenciais em ações de desapropriação ou de constituição de servidão administrativa quando há desistência da demanda. Ao reafirmar a aplicação das normas específicas do decreto lei 3.365/41, o STJ assegura uma remuneração mais justa aos advogados, respeitando a complexidade e a importância do seu trabalho.

Além disso, a decisão contribui para uma maior clareza e consistência na aplicação das normas jurídicas, beneficiando tanto os operadores do direito quanto as partes envolvidas em litígios de desapropriação. O respeito às normas específicas, combinado com a possibilidade de arbitramento equitativo em casos excepcionais, demonstra um equilíbrio adequado entre a proteção dos interesses dos advogados e a eficiência do processo judicial.

Em suma, o entendimento consolidado pelo STJ reforça a importância de uma interpretação criteriosa das normas legais, garantindo que os honorários advocatícios reflitam a justa medida do trabalho realizado e assegurem a dignidade do advogado que atua em ações de desapropriação.

O desafio da advocacia agora é fazer com que os tribunais e juízes de primeiro grau sigam a decisão vinculante do STJ.

Flávio Yunes Elias Fraiha

VIP Flávio Yunes Elias Fraiha

Ex-Presidente da Comissão de Estudos de Desapropriação do IASP. Especialista em Direito Civil pelo Mackenzie e Processo Civil pela EPM. Palestrante no IASP, IPABE e o Instituto de Engenharia.

Cesar Chaim

Cesar Chaim

Advogado. Pós-Graduado em Direito Civil e Empresarial pelo Damásio. Especialista em desapropriação.

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