Isenção do IPTU para beneficiários do BPC-LOAS
Interpretação hermenêutica e a justiça social na garantia do princípio da isonomia sob a ótica da lei municipal 4.158/1992, de Guarulhos/SP.
domingo, 22 de junho de 2025
Atualizado em 20 de junho de 2025 13:28
A isenção do IPTU para beneficiários do BPC-LOAS - Benefício de Prestação Continuada é um tema que exige uma análise aprofundada sob a perspectiva da justiça social, da capacidade contributiva e da hermenêutica jurídica, representando uma importante medida de justiça social e igualdade tributária, garantindo que idosos em situação de vulnerabilidade possam manter sua moradia sem o ônus de uma tributação incompatível com sua capacidade contributiva.
A interpretação literal sob a ótica da lei municipal 4.158/1992 do município de Guarulhos/SP, gera desigualdades ao estabelecer critérios que, inicialmente, favorecem apenas aposentados e pensionistas na concessão do benefício, pois, ao conceder a isenção apenas a aposentados e pensionistas, exclui expressamente aqueles que recebem benefícios assistenciais, como o BPC-LOAS.
Ao privilegiar um grupo em detrimento de outro com a mesma vulnerabilidade social, a norma se revela discriminatória e incompatível com princípios constitucionais fundamentais, como o da isonomia, da dignidade da pessoa humana e da proteção aos idosos.
A tributação deve respeitar a capacidade econômica do contribuinte, conforme determina o art. 145, §1º, da Constituição Federal, sendo irrazoável conceder a isenção a aposentados e pensionistas que recebem até cinco salários-mínimos e negá-la a beneficiários do BPC-LOAS, que muitas vezes se encontram em situação ainda mais precária, recebendo apenas um salário-mínimo para sua subsistência.
O benefício da isenção do IPTU tem como principal fundamento a proteção da moradia do idoso de baixa renda, garantindo-lhe segurança habitacional e um mínimo existencial digno, conforme preconiza o Estatuto do Idoso (lei 10.741/2003). Assim, ao vedar a isenção aos beneficiários do BPC-LOAS, a interpretação restritiva da norma desconsidera que o intuito do legislador sempre foi proteger os contribuintes financeiramente vulneráveis.
O TJ/SP, ao julgar a apelação cível 1013865-80.2023.8.26.0224, consolidou o entendimento de que a isenção deveria ser estendida aos beneficiários do BPC-LOAS, pois o legislador municipal teve como objetivo proteger os contribuintes financeiramente vulneráveis, independentemente da natureza do benefício recebido. A decisão destacou a necessidade de uma interpretação baseada nos princípios da igualdade e da justiça social, afastando uma aplicação meramente literal da norma, que resultaria em uma desigualdade injustificável entre grupos em idêntica situação de necessidade.
No mesmo entendimento, a 2ª vara da Fazenda Pública da Comarca de Guarulhos, ao julgar caso similar, destacou a necessidade de se afastar uma interpretação literal da legislação, sob pena de gerar tratamento desigual entre idosos que se encontram em idêntica condição de vulnerabilidade econômica, destacamos o trecho abaixo:
"(...) O art. 1º da lei 4.158/1992 dispõe que: Os contribuintes do IPTU - Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana aposentados ou pensionistas e que percebam, mensalmente, a título de proventos, até cinco salários-mínimos, independente de receberem proventos de fontes de renda, ficam isentos do pagamento dos citados tributos.
(...) Literalmente a legislação tributária que disponha sobre a isenção de crédito tributário. Assim, a interpretação literal é de que para ter direito à isenção de IPTU o contribuinte, dentre outros requisitos, tem que ser aposentado ou pensionista.
(...) Assim, a mens legis é no sentido aos vulneráveis pela idade ou incapacidade que percebam até cinco salários-mínimos devem ser beneficiados pela isenção pelas peculiaridades do seu estado e condições. O autor é idoso com 75 anos de idade na propositura da ação e que percebe um salário-mínimo. A lei disse menos do que queria, cabendo uma interpretação extensiva, sob pena de iniquidade e trauma no sistema jurídico, pois pessoas que recebem mais e não são vulneráveis têm isenção e o autor idoso com um salário-mínimo não. Em outras palavras, tal distinção configuraria subversão à finalidade estabelecida na norma somente pelo fato do benefício do autor ser assistencial e não previdenciário, quando ambos os benefícios têm o intuito de proporcionar uma vida digna ao idoso. Ademais, em relação ao aposentado e pensionista admite-se a percepção de diversas fontes de rendas de até 5 salários-mínimos para que haja a isenção tributária. Preenchido o requisito relativo ao imóvel, o legislador pretendeu conceder isenção do IPTU somente aos idosos, aposentados ou pensionistas, com renda total até 5 salários-mínimos, bem como conceder a mesma isenção ao contribuinte idoso que percebe valor inferior, no caso do autor, um salário-mínimo. Caso contrário, ferido estaria o princípio da isonomia. (1013865-80.2023.8.26.0224)"
Nesse cenário, a hermenêutica jurídica desempenha um papel essencial nesse contexto, permitindo que a norma seja interpretada de maneira a atender aos princípios da justiça social e da razoabilidade. Assim, a interpretação teleológica, que busca compreender o verdadeiro propósito da lei, leva em conta valores fundamentais como a exigência do bem comum, a ética e a igualdade, reforçando que a isenção do IPTU não pode ser concedida com base em uma distinção artificial entre benefícios previdenciários e assistenciais.
Foi nesse sentido que o município de Guarulhos editou a lei municipal 8.285/2024, a fim de incluir expressamente os beneficiários do BPC-LOAS no rol de isentos, consolidando um entendimento que já se mostrava juridicamente correto, evidenciando a necessidade de garantir a esses contribuintes a mesma proteção conferida aos aposentados e pensionistas de baixa renda, in verbis:
"A ementa e o caput do art. 1º da lei 4.158, de 8/9/1992, passam a vigorar com as seguintes alterações:
"Institui benefícios fiscais a contribuintes aposentados, pensionistas e beneficiários da LOAS, na forma que especifica." (NR)
"Art. 1º Ficam isentos do pagamento do IPTU os contribuintes aposentados, pensionistas e beneficiários da LOAS - lei orgânica da assistência social, consoante lei Federal 8.742, de 7/12/1993, os quais percebam, mensalmente, a título de proventos, até cinco salários-mínimos, independente de receberem proventos de diversas fontes de renda.
... (NR)"
Contudo, diversos municípios ainda permanecem com a legislação inalterada, beneficiando apenas os aposentados e pensionistas. Diante desse cenário, é imperativo que as decisões administrativas e judiciais sigam a linha de raciocínio que privilegie a justiça social e a igualdade material.
A recusa em conceder a isenção do IPTU a beneficiários do BPC-LOAS com base unicamente na natureza assistencial do benefício representa não apenas uma interpretação restritiva e ultrapassada, mas também uma afronta aos princípios constitucionais que norteiam a tributação justa.
A legislação não pode ser utilizada como um instrumento de exclusão social, devendo sempre se alinhar aos objetivos fundamentais da República, entre os quais se destacam a erradicação da pobreza, a redução das desigualdades sociais e a promoção do bem-estar de todos, especialmente dos grupos mais vulneráveis.
A ampliação do benefício da isenção do IPTU para beneficiários do BPC-LOAS, portanto, não é apenas uma questão de legalidade, mas de justiça e respeito à dignidade da pessoa humana.
Em caso de dúvidas sobre a aplicação da isenção do IPTU para beneficiários do BPC-LOAS, consulte um advogado especialista.



