MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. A constitucionalidade das cotas raciais em concursos públicos: Novo marco legal com a lei 15.142/25

A constitucionalidade das cotas raciais em concursos públicos: Novo marco legal com a lei 15.142/25

A lei 15.142/25 eleva a reserva de cotas raciais nos concursos federais e reafirma o compromisso constitucional com a igualdade, a justiça social e a inclusão.

quinta-feira, 24 de julho de 2025

Atualizado em 23 de julho de 2025 12:09

O avanço legislativo e a reafirmação de princípios constitucionais

A sanção da lei 15.142/25 representa mais que uma ampliação numérica nas cotas raciais dos concursos públicos federais. Trata-se de uma reafirmação do compromisso do Estado brasileiro com os fundamentos constitucionais da igualdade material, da justiça social e do combate à discriminação racial. O novo diploma legal, ao elevar de 20% para 30% a reserva de vagas para negros, indígenas e quilombolas, resgata o sentido prático do art. 3º, incisos III e IV da Constituição Federal: erradicar as desigualdades e promover o bem de todos, sem preconceitos.

A constitucionalidade das políticas de ação afirmativa, especialmente das cotas raciais, já foi consagrada pelo STF desde o julgamento da ADPF 186/DF, em 2012. Ali se reconheceu que ações afirmativas não violam o princípio da isonomia, mas o concretizam na forma de igualdade material.

A jurisprudência do STF: Cotas são constitucionais

No leading case da ADPF 186, o STF entendeu que o critério racial é legítimo para fins de inclusão social. Destacou-se que, no Brasil, desigualdades raciais são históricas, estruturais e refletem em todas as esferas - inclusive no acesso ao serviço público. Por isso, políticas específicas são necessárias para corrigir esse desequilíbrio.

A Corte entendeu ainda que as ações afirmativas possuem natureza transitória e devem ser periodicamente avaliadas quanto à sua eficácia. Isso se reflete na própria lei 15.142/25, que prevê vigência por 10 anos, até 2035, com revisão ao final do período.

Heteroidentificação e segurança jurídica

Outro ponto polêmico das cotas raciais - a verificação da autodeclaração por comissões de heteroidentificação - também já foi enfrentado pelo STF e pelo STJ. O entendimento majoritário é que a adoção de bancas avaliadoras é legítima, desde que respeitados o contraditório, a ampla defesa e critérios objetivos.

A nova lei se alinha a esse entendimento. Estabelece que os procedimentos de heteroidentificação devem ser padronizados, conduzidos por especialistas e com previsão de recurso. Isso garante segurança jurídica ao processo seletivo e evita fraudes sem comprometer direitos legítimos.

Igualdade formal x igualdade material: O fundamento das ações afirmativas

A crítica mais comum às cotas raciais - de que violariam a igualdade formal - ignora o conceito de igualdade material. Enquanto a igualdade formal trata todos de forma idêntica, a igualdade material reconhece desigualdades históricas e oferece mecanismos compensatórios para corrigi-las.

O art. 5º da Constituição assegura que todos são iguais perante a lei, mas o art. 3º impõe ao Estado o dever de erradicar as desigualdades sociais e regionais. As cotas são instrumentos que operam justamente nesse campo: o da igualdade de fato, não apenas de direito.

A lei 15.142/25 como novo paradigma normativo

A ampliação do percentual de reserva e a inclusão expressa de indígenas e quilombolas fortalecem o alcance das ações afirmativas. O texto legal vai além da mera replicação de percentuais: ele qualifica o procedimento, exige transparência nas bancas de heteroidentificação e reconhece o pluralismo étnico-racial do país.

Mais que uma política pública, a nova lei é a materialização de um projeto constitucional: construir uma sociedade justa, plural e inclusiva. Trata-se de uma afirmação do Estado Democrático de Direito em sua dimensão substantiva.

Conclusão: Cotas raciais são constitucionais, necessárias e estratégicas

A lei 15.142/25 reafirma o entendimento do STF e fortalece a legitimidade das cotas como instrumentos de transformação. As críticas genéricas à sua constitucionalidade não se sustentam diante da jurisprudência consolidada e da realidade social que clama por equidade.

O debate sobre inclusão no serviço público deve ser travado com responsabilidade, base jurídica e compromisso social. A nova legislação não é o fim da caminhada, mas um novo patamar de compromisso estatal com a justiça racial. Cabe à sociedade, aos juristas e aos candidatos zelarem por sua fiel execução até que o mérito possa, de fato, competir em pé de igualdade

Ricardo Fernandes

Ricardo Fernandes

Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial Miltiar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca