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O futuro das cotas nos concursos públicos: Perspectivas até 2035 com a lei 15.142/25

A lei 15.142/25 amplia cotas raciais no serviço público federal, mas sua vigência de 10 anos exige mobilização desde já para garantir avanços até 2035.

sexta-feira, 25 de julho de 2025

Atualizado em 24 de julho de 2025 13:58

Uma política temporária com efeitos duradouros?

A lei 15.142/2025 representa uma evolução nas ações afirmativas no Brasil, ao ampliar para 30% a reserva de vagas para negros, indígenas e quilombolas em concursos e processos seletivos da administração pública federal. No entanto, diferentemente de muitas leis de caráter permanente, esta legislação carrega um componente que exige atenção: sua vigência limitada a 10 anos, com revisão prevista para 2035.

Essa característica impõe uma reflexão estratégica para candidatos, juristas, gestores públicos e toda a sociedade: o que esperar para o futuro das cotas raciais nos concursos públicos federais? Estaremos em 2035 diante de uma consolidação definitiva ou de um possível retrocesso?

A importância da avaliação periódica e os riscos do silêncio social

A previsão de revisão decenal foi inspirada na ideia de que políticas públicas devem ser avaliadas por seus efeitos. No entanto, há um risco: a ausência de participação social ativa nesse processo pode abrir caminho para pressões ideológicas que ignorem os avanços proporcionados pelas ações afirmativas.

A experiência de uma década da lei 12.990/14, substituída agora pela nova legislação, demonstrou que as cotas raciais aumentaram o acesso de pessoas negras ao serviço público, mas não foram suficientes para reverter o quadro de sub-representação estrutural. O acréscimo de 10% nas cotas e o reconhecimento expresso de indígenas e quilombolas são respostas a esse diagnóstico.

O papel das instituições públicas na consolidação da política

A implementação eficaz da lei 15.142/25 exigirá mais do que boas intenções. Será necessário que:

  • Comissões de heteroidentificação sejam qualificadas e atuem com transparência;
  • Relatórios periódicos de impacto racial sejam elaborados pelos órgãos públicos;
  • Órgãos de controle e tribunais de contas fiscalizem a aplicação das cotas;
  • A sociedade civil organizada participe da construção do relatório de revisão da lei em 2035.

Sem esses mecanismos, corre-se o risco de a política de cotas tornar-se letra morta - ou de sua revisão ser feita sob critérios políticos arbitrários, alheios às evidências.

As perspectivas para além de 2035: universalização ou retrocesso?

Do ponto de vista técnico, existem três cenários possíveis para 2035:

  1. Prorrogação com manutenção do modelo atual - Caso os indicadores sociais e funcionais permaneçam desiguais.
  2. Ampliação das cotas ou incorporação de outros grupos vulneráveis - Como pessoas com deficiência, LGBTI+, ougressos do sistema prisional ou alunos de escolas públicas.
  3. Extinção gradual da política de cotas - Defendida por setores que compreendem que a ação afirmativa deve ter prazo de validade.

Entre essas possibilidades, o fator decisivo será o grau de mobilização social, produção de dados, atuação institucional e articulação jurídica em defesa da continuidade da equidade no serviço público.

Conclusão: 2035 começa agora

A lei 15.142/25 trouxe um avanço inegável para a justiça racial nos concursos públicos. No entanto, seu caráter temporário exige que a sociedade comece desde já a construir as bases para sua continuidade ou evolução. A ausência de acompanhamento e de pressão democrática pode custar caro.

Se queremos uma administração pública verdadeiramente plural e representativa, o debate sobre as cotas não pode ser postergado até o fim da vigência da lei. Ele deve acontecer desde já, com dados, responsabilidade e protagonismo social. O futuro das cotas em 2035 dependerá das escolhas políticas, técnicas e sociais que fizermos no presente.

Ricardo Fernandes

Ricardo Fernandes

Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial Miltiar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo

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