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Contrato de obra pública: Empreitada ou concessão? É necessário diferenciar

Empreitada ou concessão? O artigo desvenda as diferenças cruciais entre os contratos e mostra por que confundi-los pode custar caro, tanto para o licitante quanto para a Administração Pública.

terça-feira, 29 de julho de 2025

Atualizado às 08:55

Quem atua na área do Direito Administrativo não pode confundir as espécies de contratos, pois a confusão entre um contrato de obra (empreitada) e o instrumento contratual de concessão, por exemplo, pode gerar variados prejuízos ao órgão e grandes perdas ao licitante.

A contratação por concessão administrativa de construção hospitalar não é um contrato de obra pública, e por assim ser, a forma de apresentação das propostas, o fluxo de execução do serviço, e principalmente a metodologia de reestabelecimento do equilíbrio financeiro do contrato, devem ser avaliados com brutal diferença.

O primeiro passo da distinção entre um contrato administrativo e um contrato de concessão é entender o que eu sempre falo para meus alunos: a lei tem uma razão de ser. E em primeiro plano, a razão de ser de uma lei deve passar necessariamente por uma previsão da Constituição Federal. 

O contrato administrativo encontra previsão no arT. 37, XXI, da Constituição Federal, dispositivo em que o constituinte originário determina que "as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes".

Em relação ao contrato de concessão, o dispositivo é outro, e se encontra no título que trata da Ordem Econômica e Financeira. É o art. 175, da Constituição Federal, que autoriza o regime de concessão ou permissão para a prestação de serviços públicos.

Uma característica comum neste ponto se apresenta: ambos os contratos devem ser precedidos de licitação.

Por serem precedidos de licitação, fica a pergunta: a lei 14.133/21 se aplica a ambas espécies contratuais, indistintamente?

A resposta exige cautela. Observe que a lei geral de licitações (14.133/21) regulamenta o art. 37, XXI, da Carta Magna, enquanto que a lei de concessões e permissões (8.987/1995) regulamenta o art. 175, da Constituição. Ambas são leis gerais, e portanto, não se complementariam.

Ocorre que o art. 186, da lei geral de licitações, permite sua aplicação subsidiária nos processos que implementem a concessão, e neste ponto é bom alertar que apenas se aplica esta lei no caso de ausência de norma específica, ou quando a norma principal não é suficiente para regulamentar a questão apresentada.

Mas muito embora ambos atos administrativos negociais possuam prerrogativas extraordinárias próprias da administração pública, como os exemplos da unilateralidade de alteração, equilíbrio econômico-financeiro, etc., a existência de lei geral voltada ao regulamento exclusivo das concessões tem uma segunda e importante razão de ser, que são cláusulas estruturais, sobretudo orçamentárias e financeiras.

As diferenças destas avenças se apresentam desde a forma de avaliação das propostas no certame, passa pelas fontes de financiamento, e chegam até a forma e o modo de execução do projeto.

No contrato de obra, por exemplo, deve o órgão elaborar anteprojeto, o projeto básico e/ou o projeto executivo, onde irá apresentar o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado para definir e dimensionar a obra ou o serviço, ou o complexo de obras ou de serviços que o particular irá executar.

E a depender da escolha do administrador e de suas condições, a elaboração do projeto básico e do projeto executivo poderão ser elaborados pelo particular, que é o caso da contratação integrada ou semi-integrada, todavia, é ainda a administração quem dá as diretrizes no anteprojeto, prevê os orçamentos, e quem aprova os projetos.

No caso da concessão, não cabe ao órgão assim definir, porque é exclusivamente o particular quem irá apresentar o projeto com os custos, encargos, fluxos de execução, ou mesmo a sub-rogação de suas atividades. Há uma delegação para o concessionário, que é quem projeta.

Estes fluxos de execução têm uma importante missão, pois é a partir daí que se estabelecem a forma com que a execução do serviço se protrairá no tempo, o que envolverá nuances que podem onerar o concessionário, projetando-se basicamente em um fluxo de caixa que considera a TIR - taxa interna de retorno.

  • Enquanto no contrato de obra pública por empreitada a Administração Pública define o projeto e/ou a forma de execução, na concessão o concessionário apresenta a forma de execução por sua ótica;
  • Enquanto no contrato de obra pública por empreitada a Administração Pública pré-define o orçamento e paga o contratado, na concessão o concessionário têm gastos próprios e ganhos proporcionais à performance;
  • Enquanto o contrato de obra pública por empreitada elenca os custos a partir de numerosas planilhas, ao concessionário vige a modelagem de receita e a taxa de retorno apresentada em seu plano a partir das condições da Administração.

No tocante ao equilíbrio econômico e financeiro, a premissa também é verdadeira. Para a obra pública por empreitada, a manutenção do equilíbrio está vinculado aos custos dos projetos - aqueles previstos e os supervenientes, extraordinários ou não -, e servem sobretudo para que os custos e índices mantenham a equação original do contrato, sob viés sobretudo econômico, portanto. 

Nas concessões, por outro lado, o acento é no equilíbrio precipuamente financeiro, porque trata de investimentos privados, alocados e geridos por agente privado, e cuja remuneração se performa no tempo, envolvendo variáveis de alocação e gestão financeira distintas do contrato administrativo por empreitada.

Não se pretende esgotar o tema neste insípido artigo, mas alertar que a distinção entre as duas espécies contratuais é imprescindível para que o contratado apresente corretamente o seu projeto e tenha maiores chances de êxito em seus pedidos de reequilíbrio, enquanto que a Administração Pública passa a saber a forma e modo de análise do pedido, e tem mais facilidade em motivar sua decisão.

Israel Evangelista da Silva

Israel Evangelista da Silva

Advogado administrativista, professor universitário de graduação e pós-graduação, servidor público, ex-Diretor Executivo de Compra Pública (2020) e o 7º Superintendente de Licitações do Governo do Estado de Rondônia (2021-2025).

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