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Vendeu a empresa: Holding no Brasil ou Trust no exterior?

Depois de vender a empresa, escolher entre holding (Brasil) e Trust (exterior) define proteção, sucessão, governança e tributos. Diferenças e lista de verificação para decidir com segurança.

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Atualizado às 10:45

Concluir a venda da empresa é só metade do caminho. No dia seguinte à entrada do valor, começam as decisões que realmente preservam - ou corroem - o patrimônio: onde estruturar, quem decide, como distribuir e quanto pagar de impostos. No Brasil, a holding é o instrumento clássico; em países de direito anglo-saxão (common law), o trust cumpre funções parecidas. Objetivo semelhante; natureza jurídica diferente.

O que eles têm em comum (e por que isso importa)

Ambos:

  • Centralizam ativos e reduzem atrito sucessório;
  • Permitem regras de uso e distribuição;
  • Podem dificultar ataques de terceiros quando bem desenhados;
  • Organizam a governança familiar e ajudam a evitar inventários demorados.

A diferença que muda tudo (sem juridiquês)

Holding (Brasil) = "empresa-cofre" com CNPJ.

É pessoa jurídica que passa a titular os bens (imóveis, participações, aplicações). Você permanece no controle como sócio/administrador. As regras de família e sucessão ficam no contrato/estatuto e no acordo de sócios.

Trust (exterior) = acordo de confiança; não é empresa.

Não tem CNPJ. É uma relação fiduciária:

  • o instituidor transfere bens e escreve as regras na escritura do trust;
  • o administrador (trustee) vira titular formal e administra com dever fiduciário;
  • os beneficiários recebem renda/capital conforme condições (idade, educação, metas).
  • separação entre titularidade formal (trustee) e benefício econômico (beneficiário). Essa elasticidade é valiosa, mas exige coordenação tributária para residentes no Brasil.

Quando a holding resolve (quase) tudo

Para quem reside no Brasil e concentra o patrimônio aqui, a holding costuma entregar:

  • Organização: bens no balanço da holding;
  • Governança: acordo de sócios, voto/veto, sucessão de administradores;
  • Sucessão simplificada: transfere-se quota/ação (menos inventários);
  • Cláusulas restritivas (incomunicabilidade, inalienabilidade, impenhorabilidade) usadas com critério;
  • Integração com doações (respeitando a legítima) e testamento;
  • Tributação sob regras de pessoa jurídica no Brasil (lucro presumido/real) e política de distribuição definida.

Quando considerar um trust

Faz sentido quando há ativos relevantes no exterior, beneficiários em outros países, desejo de regras detalhadas de liberação (educação, saúde, marcos de vida) e continuidade automática sem inventário na jurisdição do trust. Entrega:

  • Separação entre quem titula e quem usufrui;
  • Condições granulares de uso/distribuição;
  • Gestão fiduciária profissional (independente da família).

Atenção para residentes no Brasil: trust não elimina obrigações fiscais no país. Sem desenho técnico, pode haver bitributação e falhas de declaração. Os custos e a conformidade regulatória seguem padrão internacional.

Tabela de bolso - efeito prático lado a lado

Aspecto

Holding (Brasil)

Trust (exterior)

Natureza

Pessoa jurídica (CNPJ)

Relação fiduciária (sem personalidade)

Quem "é dono"

A holding

Trustee (titular formal)

Quem decide

Sócios/administradores; acordo de sócios

Trustee cumpre a escritura do trust

Sucessão

Transfere-se quotas/ações

Sem inventário local; segue a escritura

Regras de uso

Contrato/acordo (usufruto, vetos, gatilhos)

Condições na escritura (idade, educação, metas)

Alterações

Quóruns societários

Depende do tipo (revogável/irrevogável; poderes reservados)

Tributos

Regime de pessoa jurídica brasileira

Lei da jurisdição do trust + deveres no Brasil

Mitos que custam caro

  • "Trust é igual a holding." Não é. Naturezas distintas, efeitos distintos.
  • "Trust garante sigilo absoluto." Depende da jurisdição e de cooperação internacional.
  • "Holding blinda tudo." Blindagem absoluta não existe; existe arquitetura lícita bem feita.
  • "Trust resolve imposto no Brasil." Sem coordenação, pode piorar a conta.

Dois cenários ilustrativos

Brasil predominante

Imóveis e investimentos em São Paulo; herdeiros no país; objetivo: regras claras de voto e distribuição.

  • Holding: bens no CNPJ, acordo de sócios, sucessão por quotas.

Mapa internacional

Ações e conta no exterior; herdeiros morando fora; liberação condicionada por idade/objetivos.

  • Trust: administrador (trustee) gere e distribui conforme a escritura, sem inventário na jurisdição do trust.

Caminho combinado muito usado após venda de empresa

  • Holding brasileira para ativos domésticos, governança familiar e sucessão por quotas/ações;
  • Empresa veículo no exterior (ex.: LLC) para participações internacionais e, quando indicado, trust para distribuição e continuidade;
  • Coordenação tributária e governança entre as camadas para evitar surpresa fiscal.

Decisão sem erro: 6 perguntas-chave

  1. Onde estão os ativos e os herdeiros (Brasil x exterior)?
  2. Quem deve decidir no dia a dia (você/família x administrador do trust)?
  3. Precisa de regras finas de uso/liberação?
  4. Qual custo e complexidade você tolera?
  5. Quais riscos fiscais em cada jurisdição?
  6. Como fica a continuidade (inventário, substituição de gestores, vetos)?

Lista de verificação para implementar

  • Mapa de ativos e fluxos (renda, risco, liquidez);
  • Governança viva (quem decide, quem substitui, como desempata);
  • Sucessão em camadas (cláusulas nas quotas/ações, testamento compatível, diretivas e procurações);
  • Conformidade (contabilidade, declarações e impostos aqui e no exterior);
  • Travas e saídas: direito de venda conjunta (tag along) e obrigação de venda conjunta (drag along), opções de compra e venda, hipóteses de descumprimento.

Conclusão

Para transformar liquidez em legado, holding e trust são ferramentas potentes - diferentes e, às vezes, complementares. A escolha certa não segue a moda: nasce do seu mapa de ativos, da configuração da família, do nível de controle desejado e de uma coordenação tributária séria entre jurisdições. Simplicidade onde possível; sofisticação onde necessário.

Luiz Gustavo de Oliveira Tosta

VIP Luiz Gustavo de Oliveira Tosta

Tosta é advogado sócio na P & T, Mediador, especialista em Trabalhista para Executivos e Planejamento Patrimonial, atua em negociações estratégicas com grandes empresas e proteção de alta gestão.

Marcia Pons

VIP Marcia Pons

Pons advogada com 25 anos em Família, Sucessões e Planejamento Patrimonial, 14 anos no Pons & Tosta, com atuação em Executivos, Mediação estratégica e proteção do patrimônio inc digital.

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