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A sociedade "Brucutu", e a crise do comércio e do Direito Comercial - A causa/efeito Trump

Da guerra primitiva ao capitalismo moderno, direito e comércio evoluíram, estruturando mercados, economia e relações globais.

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Atualizado em 20 de outubro de 2025 11:32

Os mais longevos como eu se lembram dos quadrinhos que contavam histórias do herói Brucutu, do reino pré-histórico de Mu. Morava em uma caverna, montava em um dragão e tinha como arma um forte porrete de guerra com a ponta feita de pedra. Muito eficiente, como se vê.

Na sociedade desse herói o direito estava na ponta do porrete, que massacrava os inimigos, quando as mulheres dos vencidos eram tomadas como despojos da guerra. Muito, muito tempo mais tarde, o rapto das Sabinas, por meio da qual Rômulo angariou mulheres para o início de Roma, no fundo seguiu o mesmo modelo do passado remoto.

Podemos perceber que na sociedade primitiva o comércio poderia ser considerado uma exceção, utilizada a força para a apropriação dos bens dos vencidos, ao mesmo tempo em que os sobreviventes se tornavam escravos dos vencedores.

Em um dado momento da civilização, ao invés da guerra destruidora e que fazia vítimas dos dois lados - que jamais deixaram de existir -, passou-se para um regime de trocas, por meio das quais as tribos permutavam os seus excedentes agrícolas e de animais, em um tipo de negócio que podia ser classificado como ganha/ganha, utilizando-se algum bem intermediário como meio de troca, a exemplo do sal. Considerados diversos fatores negativos desses bens utilizados para a realização de negócios, surgiu outro, para o fim dos pagamentos recíprocos, dotado das qualidades de meio de troca, de unidade de conta e de reserva de valor, ou seja, a moeda em barras  ou outra forma de metais preciosos e mais tarde cunhada.

Havia um pressuposto para que o modelo acima pudesse funcionar com segurança e eficiência, consistente em fundamentos jurídicos aceitos pelos dois lados (e por outros circunstantes), significando dizer, como o fez bem mais tarde Natalino Irti, que era necessária a pré-existência de um direito antes de se chegar ao nascimento do mercado, dando-se certeza de que as obrigações ali assumidas seriam devidamente cumpridas. Essa qualidade foi encontrada de forma muito clara nas famosas feiras anuais, realizadas em diversas regiões da Europa1.

Assim sendo, o direito da força do Brucutu foi aos poucos sendo substituído em parte pela força do direito. Mas, como já disse, o primeiro modelo jamais foi de todo superado, tendo subsistido por milhares de anos e chegado ao presente, com grande força. Basta lembrar as guerras de conquista de territórios, como o fez Roma durante séculos, na busca da realização dos seus interesses. Esse fato nos faz lembrar, entre outros tantos, da cidade de Volubilis, situada no atual Marrocos, cujos recursos Roma aproveitou até 285 a, como fonte de fornecimento ao império de azeite, cerais e até mesmo pelo fornecimento de animais para os espetáculos de gladiadores.

No Oriente Médio, tempo da Idade Média, são contadas as invasões muçulmanas e as ditas "cristãs", a cargo das cruzadas que deu à ordem dos cavaleiros templários a condição de se tornar uma multinacional militar e mercantil, tendo crescido tanto por meio do comércio, como por valiosas doações lhe foram feitas, tendo o Rei Filipe IV da França, o Belo, dela grande devedor, a lhe por fim, confiscando os seus bens e matando seus dignatários, a começar por Tiago de Moley, queimado vivo.

Ao tempo das grandes navegações, países da Europa conquistaram pela força regiões na América, África, Oriente Médio e Extremo quando, por exemplo, a Inglaterra se tornou um império tão vasto que se dizia que sobre ele o sol jamais se punha. E esse processo continuou em grande escala no século passado, a exemplo das anexações de diversas nações pela Alemanha Nazista e depois pela Rússia, esta última mais recentemente quanto à Crimeia e atualmente em relação e na tentativa de subjugação da Ucrânia. O Japão e a China tiveram o seu tempo de invasores e esta tem abertamente feito esforços no tocante à Taiwan.

Mas o comércio tem sido importantíssima força motriz da economia mundial e local, tendo permitido o enriquecimento de muitas nações ao longo do tempo, apesar de séries distorções originadas de assimetrias econômicas, a exemplo do fato da persistência de países que quase nunca evoluíram da condição de exportadores de bens em natura, sem o adicionamento de valores agregados como resultado da utilização de processos industriais, estando o Brasil em grande parte ainda dentro desse modelo.

O ponto em que desejamos chegar está no reconhecimento de que, no cenário internacional e a partir das grandes navegações, o capitalismo ocidental sobressaiu com grande força e se desenvolveu a partir da quebra de paradigmas, a exemplo do desenvolvimento de tecnologias, tendo chegado hoje a um verdadeiro paroxismo da busca permanente e altamente custosas de novidades, perguntando-se o que poderá sobrar ao longo do tempo, sendo a moda atual a da IA - inteligência artificial2.

Essa realidade foi claramente percebida por Max Weber, nos permitindo a transcrição de um trecho do seu "A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo"3:

"À primeira vista, a forma especial do moderno capitalismo ocidental teria sido fortemente influenciada pelo desenvolvimento de possibilidades técnicas. Sua racionalidade é hoje essencialmente dependente da calculabilidade dos fatores técnicos mais importantes. Mas isso significa basicamente que é dependente da ciência moderna, especialmente das ciências naturais baseadas na matemática e em experimentações exatas e racionais. Por outro lado, o desenvolvimento de tais ciências e das técnicas que nelas se apoiam recebe, agora importante estímulo dos interesses capitalísticos quanto a suas aplicações econômicas e práticas".

Não podemos deixar de pensar em nosso país, cujas lideranças políticas ainda pensam em termos medievais, fazendo a cada momento aparecer o zumbi da usura, que fortemente assusta e afasta os processos econômicos e onde o investimento na ciência aplicada é irrisório, ainda que ilhas de excelência se mostrem operantes, como é o caso da Embrapa.

O que nos deixa embasbacados é que um país conhecido como uma das principais pátrias do comunismo - a China - tem adotado um modelo para o fim do comércio internacional essencialmente capitalista adaptado em sua essência, concorrendo vitoriosa no mercado internacional e a cada dia ganhando mais espaço, graças à política suicida do governo Trump. Na verdade, do lado de dentro de suas fronteiras, a China se apresenta com mais de uma face, mediante o controle inafastável do Partido Comunista, mas operando segundo princípios econômicos fundamentais.

Assim sendo, nos perguntamos como os agentes econômicos brasileiros deverão agir, na qualidade de vítimas de um processo econômico trumpiano agressivo, fundado em tarifas e em ameaças do uso da força? E em que sentido o Direito Comercial poderá atuar para que os agentes econômicos tenham segurança e certeza na adoção de estratégias (contratuais, societárias e outras) que envolvam o desenvolvimento de novas tecnologias, superando barreiras históricas.

1.      O setor público

Exemplos prementes são o da pejotização indiscriminada, dentro da qual estão as empresas de entregas de encomendas, cujos operadores se localizam fora do regime tradicional de trabalho, baseado na carteira assinada e que em boa parte tendem a ser substituídos por drones em curso espaço de tempo.

Em ambos os casos há uma séria questão social envolvida, qual seja a da previdência social, já altamente combalida, a ponto de se dizer que é um doente terminal. A esse respeito é necessário colher alguns elementos dessa realidade, conforme seguem4:

(i) Apenas 35,9 dos trabalhadores por conta própria contribuíram para a previdência no segundo semestre de 2025;

(ii) Dos que têm CNPJ a parcela de contribuição é de 76,9%;

(iii) A parcela é menor entre os sem CNPJ, de 18.8%;

(iv) Os trabalhadores por conta própria somam 25,2% da população ocupada;

(v) No grupo de colaboradores de plataformas digitais o percentual de contribuição da a Previdência é tão somente de 27,8%;

(vi) Mais de três entre dez trabalhadores não fazem qualquer contribuição à Previdência;

(vii) Entre os trabalhadores por conta própria cada vez mais se percebe pessoas com mais de 60 anos no mercado de trabalho, para complementação de renda, o que compromete ainda mais o sistema de previdência;

(viii) Uma significativa e insustentável situação geradora de distorção é a da contribuição previdenciária do MEI, da ordem de 5%, enquanto o trabalhador autônomo para 2º%;

(ix) O rendimento médio dos trabalhadores contribuintes da previdência é maior do que os que não contribuem: R$4.183 quanto aos primeiros de R$2.075 relativamente aos segundos;

(x) A renda do contribuinte da previdência é em média quase o dobro daquele que não contribui, porque o primeiro tem condições de melhor organizar o seu orçamento, a fim de garantir a contribuição;

(xi) Está caracterizado o fenômeno da "impaciência dos brasileiros", especialmente no tocante às novas gerações, que acreditam virem a conseguir mais felicidade trabalhando por conta própria, se esquecendo de que envelhecem e vão perdendo a capacidade laborativa, a par de ficarem mais sujeitos a doenças e a acidentes do trabalho.

(xii) Apenas 4% dos brasileiros têm previdência privada, sem realizarem um planejamento orçamentário familiar no longo prazo;

(xiii) Em 2000 havia 8,7% dos brasileiros com mais de 60 anos. Em 2070 0 percentual chegará a 37,8%, com aumento significativo da diferença quanto ao número anual de nascimentos (que caiu de 3,6 milhões em 2000 para 2,6 milhões em 2022, recuando sempre.

Observe-se que o rombo da Previdência foi de R$416,8 bilhões, equivalente a 3,35 do PIB e aumentar mais uma vez a idade mínima para a aposentadoria somente consistirá em um refresco provisório, do tipo empurrar com a barriga, incapaz de resolver o problema.

Na mesma linha, outra preocupação macroeconômica diz respeito aos trabalhadores de apps, que cresceu 25% em dois anos, caso em que carga horária maior de trabalho gera renda mais elevada, que não resulta em benefícios no longo prazo como visto acima. Vejamos a sua distribuição pelos setores da economia onde se localizam

  • 53,1% (878 mil pessoas) usavam aplicativos de transporte particular de passageiros (exceto táxi);
  • 29,3% (485 mil) atuavam com aplicativos de entrega de comida e produtos;
  • 17,8% (294 mil) usavam plataformas de serviços gerais ou profissionais;
  • 13,8% (228 mil) trabalhavam com aplicativos voltados para taxistas.

 Perfil dos trabalhadores por app:

  • Gênero: homens predominam, com 83,9% do total, enquanto as mulheres representam apenas 16,1%.
  • Idade: quase metade (47,3%) têm entre 25 e 39 anos.
  • Escolaridade: a maioria possui nível intermediário - 59,3% têm ensino médio completo ou superior incompleto.
  • Raça: 45,1% se declaram brancos, 12,7% pretos e 41,1% pardos.

Ou seja, estamos vivenciando um período ímpar na sociedade, na qual a introdução de novas tecnologias para a exploração da atividade econômica, como acontece sempre frente a inovações, tem caráter brutalmente destruidor, sem que o lado da criatividade a compense, ao menos dentro de uma parcela ponderável da mão de obra. Nesse sentido, milhões de pessoas ficarão à margem da produtividade econômica, sem poupança ou previdência que as socorra, vindo a pesar fortemente nas pessoas dos familiares, especialmente dos filhos e (poucos) netos, enchendo os hospitais públicos com as suas mazelas de saúde.

2.      O setor privado

A par das mazelas costumeiras o setor privado brasileiro lida com modernos (?) Brucutus, encarnados na pessoa do presidente Trump e na sua equipe de tresloucados e improvisados economistas, que tomaram a bandeira do tarifaço para a consecução dos seus objetivos, colocando-se ao lado o Brasil, não escapando da sina de que devemos ser o estado provedor de larga parcela da população, imaginado a custo zero para a sociedade, sustentando artificialmente empresas permanentemente perdedoras como vítimas da tecnologia moderna, a exemplo dos Correios. Como se sabe, dinheiro dá em árvores do tipo "frutex pecuniarius". O tema é complexo e extenso, tomadas aqui apenas algumas de suas facetas, procurando pensar como os empresários brasileiros podem responder a esse desafio, claro que devidamente apoiado pelo governo.

Diante do tarifaço a casuística nos mostra algumas situações diferenciadas, tomado, como se segue segundo três de múltiplas possibilidades:

(i) O estipulante é fundamentalmente o único comprador de um vendedor fundado em monocultura ou em poucos produtos sem valor agregado

Neste caso a vítima fica quase inteiramente refém do estipulante pela impossibilidade da troca do comprador por outros, cuja necessidade de tais bens é fornecida por outros produtores. O caminho dessa vítima será a de continuar vendendo para o seu atual comprador, com grande perda. É evidente que o custo das tarifas na ponta final da cadeira recairá em determinado prazo sobre os consumidores do importador, não se preocupando o seu governo com esse futuro.

(ii) O estipulante é um dos compradores desse mesmo vendedor

Neste caso a vítima terá a possibilidade de aumentar as suas vendas para outros importadores do mercado, com perda menor, situação em que o aumento das tarifas não é eficiente como mecanismo de chantagem.

(iii) O estipulante é um dos compradores dos fornecedores que têm um mix significativo de produtos em diversos mercados, com compradores globalmente espalhados

Essa é a melhor situação para os vendedores, mostrando-se muito pequeno o efeito do aumento das tarifas. E eles serão muito favorecidos se os seus produtos se mostrarem relativamente infungíveis, ou seja, sem fácil substituição por iniciativa do estipulante das tarifas, no tocante a bens resultantes da aplicação de modernas tecnologias.

Nesse cenário algumas medidas se colocam em relação ao ambiente privado.

Devem ser garantidos fundamentos macroeconômicos sólidos, com foco em recompor espaço fiscal e proteger a estabilidade financeira, sabendo-se que o endividamento público tem crescido sistematicamente ao longo do tempo e são necessárias reformas regulatórias que incentivem a inovação e o empreendedorismo

As duas medidas devem ser fundamentalmente obra do Governo em comunhão com o Congresso Nacional, ainda que pouca esperança se possa colocar nesse arranjo. Paralelamente, o setor privado poderá livremente construir instrumentos para o incentivo a essa finalidade, por meio das lideranças apropriadas.

Outro aspecto fundamental está na proteção do valor da moeda e na estabilidade do setor financeiro. No primeiro caso conhece-se muito bem a permanente quebra-de-braço entre o Banco Central do Brasil e o Governo, este sempre avesso a fechar os cofres irresponsavelmente escancarados, enquanto o primeiro citado luta como pode para realizar uma política monetária eficiente.

3.      Desafios do setor financeiro

Coloca-se em algumas vertentes, tendo em conta o seu papel fundamental de intermediário entre os depositantes/investidores e os tomadores de crédito.

A complexidade atual do SFN abrange tanto o plano operacional, cada vez mais construído em um modelo virtual, como na da quantidade e especialidades das instituições financeiras, das fintechs e dos arranjos de pagamento. A intermediação alcançou um profundo grau de especialização, na busca do atendimento de necessidades de uma clientela avida de rapidez no seu atendimento, dentro de uma cadeia delas que se estende ao longo do processo de demanda e de concessão de crédito. É claro que, navegando esses agentes em mares novos, surpresas desagradáveis podem surgir, a partir do fato de que os institutos nascentes são desconhecidos do direito que, para deles tratar precisam identificar a sua natureza jurídica, com o perigo de ficarem pendurados no espaço, sem referências que possa levá-los a um tratamento adequado.

No plano macro a segurança do sistema financeiro tem sido desafiada pela atuação de hackers, sempre na procura de brechas tecnológicas que possam lhes permitir a realização de fraudes, notando-se uma diuturna batalha do tipo gato caça rato. Para esse fim, a par da atuação prudencial e repressiva do BCB, cabe aos agentes financeiros criarem mecanismos de autorregulação, aparando as arestas existentes, para o fim de se reduzir o nível de atrito.

Entre os fatores sérios de embates está a questão da assimetria dentro do SFN, no qual dois grandes grupos se digladiam, o dos bancos incumbentes e o das demais entidades que nele atuam, estando em curso discussões a respeito, para que se possa chegar a um equilíbrio possível nos interesses envolvidos.

A outra questão é o custo altamente elevado do crédito, que envolve os conhecidos fatores da pizza do spread bancário, em relação aos quais se juntam os fatores do custo da captação dos recursos, do risco de crédito, da tributação, do custo operacional e da margem de lucro. O custo de captação está diretamente ligado à Selic, que é a base para o estabelecimento das ofertas de aplicação aos investidores e, em um modelo de moto perpétuo, ela mesma é o gatilho a partir do qual se determina a taxa de juros das operações de crédito. Assim sendo, como é óbvio, a redução dessas taxas depende de que a inflação seja reduzida, papel em que a política monetária é coadjuvante e o orçamento estourado é o ator principal.

É evidente que a tributação depende da aliança entre o Governo e o Congresso, ambos ávidos de recursos escassos. No caso das instituições financeiras ele é elevado e a briga do momento está em determinar que deve pagar mais, os bancos incumbentes ou as fintechs. No meio das duas fatias do sanduiche estão os fornecedores e os captadores de recursos financeiros.

O custo operacional é diferenciado entre os agentes que ainda têm dependências físicas (mesmo que operem também remotamente) e aqueles em que todas as operações são realizadas no ambiente virtual. Em qualquer dos casos a conta é sempre muito alta.

A margem de lucro deve ser suficiente para a remuneração dos acionistas, dela segregada a porção referente aos necessários reinvestimentos mediante reforço do capita próprio.

Finalmente, o risco de crédito, altamente elevado por motivos diversos, como a situação crítica da economia, afetando fortemente os empresários em geral e mais acentuadamente em alguns setores específicos como o agronegócio; o endividamento recorde das famílias que, conforme fontes diversas, encontra-se no patamar de 78% (setenta e oito por cento). Clientes dessa natureza não são risco de inadimplemento para o fornecedor de crédito são certeza. E tudo começa no cartão de crédito tipo bola de neve, quando a primeira fatura não é paga, total ou parcialmente. E mostra-se neste campo a enorme irresponsabilidade do Governo, ao abrir novas linhas de crédito para as famílias, quase sempre como fruto de um maldoso processo eleitoral e fundada em parâmetros artificias.

4.      Desafios jurídicos

A novela está muito longa, bastando aqui antecipar alguns gargalos.

(i) Direito contratual - precisa ser aperfeiçoado para gerar mais segurança e certeza às partes e jamais na forma do malfadado projeto de reforma do CC, um ninho de cobras venenosas. E quanto ao direito vigente, o Judiciário precisa deixar de atrapalhar, ao estender a função do CDC para fora do núcleo dos coitadinhos, dentro do qual todo brasileiro, CPF ou CNPJ que seja considerado o lado mais fraco de uma relação contratual, seja agraciado com muitas bondades jurídicas.

(ii) Direito recuperacional - conforme fontes diversas, especialmente a Serasa Experian, ferve a concessão de RJs que, a partir do laudo da verificação prévia, deveriam tê-las imediatamente negadas, não se concedendo para doentes terminais. Como se sabe, o nível de cumprimento efetivo dos planos de RJ. Neste sentido, em 2014 foram autorizadas 828 RJs. Em 2024 o total chegou a 2.273, sempre subindo, tendo chegado a 4.965 no segundo semestre deste ano. Um verdadeiro absurdo. O sucesso dos planos é tão somente da ordem de três ou quatro empresas de cada dez, situação agravada pelo fato de que somente 30% delas se mantém com vida depois da retomada de suas atividades.

Conclusões iniciais

Como se percebe, o país vive no módulo Brucutu na economia, tanto o de origem externa, quando interna, sem perspectiva de uma solução, mesmo no longo prazo, com os problemas empresariais se agravando, arrastando consigo as famílias. O que menos se precisava no momento é a travessia de um ano eleitoral prolongado por muitos apetites, em relação aos quais o que menos conta, é o bem público. Enquanto muitos fazem festas pantagruélicas, grande parte dos brasileiros continua vivendo literalmente em simbiose com os infectos dejetos de quem não tem saneamento básico.

Bom dia, senhores, membros da aliança tripartite do Governo, Legislativo e Judiciário!

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1 Veja-se a esse respeito o Vol. 1 da nossa coleção de Direito Comercial (Ed. Dialética, 2º22) e o nosso texto "Direito e mercado: quem nasceu primeiro", in Jornal Eletrônico "Migalhas" de 02.09.2015.

2 Perguntamos, por exemplo, que fim levou o então auspicioso metaverso, hoje pouco mencionado.

3 Ed. Martin Claret, São Paulo, 2001, p. 29.

4 Cf. "Novos Arranjos do Mercado de Trabalho Trazem Desafios para a Previdência", por Luciane Carneiro, Valor Econômico de 16.10.25; "Número de trabalhadores de app cresce 25% em dois anos; carga horária maior gera renda mais elevada", in jornal Folha de São Paulo de 18/10/25.

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa

Professor sênior de Direito Comercial da Faculdade de Direito da USP. Sócio do escritório Duclerc Verçosa Advogados Associados. Coordenador Geral do GIDE - Grupo Interdisciplinar de Direito Empresarial.

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