IGF - Imposto sobre Grandes Fortunas
STF determina que Congresso regule o IGF, imposto sobre grandes fortunas, mas há críticas à medida por seu efeito regressivo e impacto econômico.
terça-feira, 18 de novembro de 2025
Atualizado em 17 de novembro de 2025 15:14
O IGF, imposto mundialmente rejeitado, está previsto no art. 153, VII da CF/88, mas nunca foi regulado por lei complementar como manda a CF, porque o Congresso Nacional, eco de ressonância da vontade popular, não que cobrar esse imposto esdrúxulo.
Mas, provocado pelo P-SOL - Partido Socialismo e Liberdade que ajuizou a ADO 55, o STF, na sessão do dia 6/11/25, determinou que o Congresso Nacional regulamente o IGF, conforme decisão abaixo transcrita:
"Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, declarando estar o Congresso Nacional omisso na elaboração da lei prevista no art. 153, inciso VII, da Constituição Federal, que estabelece que compete à União instituir impostos sobre grandes fortunas nos termos de lei complementar, vencidos o Ministro Luiz Fux, que julgava improcedente a ação, e parcialmente o Ministro Flávio Dino, somente em relação à fixação de prazo. Não votou o Ministro André Mendonça, sucessor do Ministro Marco Aurélio (Relator). Redigirá o acórdão o Ministro Cristiano Zanin (art. 38, IV, b, do RI/STF). Ausentes, justificadamente, os Ministros Edson Fachin (Presidente) e Gilmar Mendes. Presidiu o julgamento o Ministro Alexandre de Moraes (Vice-Presidente). Plenário, 6.11.2025".
Ora, como assinalamos em nossa obra, competência tributária nada mais é do que a atribuição constitucional do poder de tributar às entidades políticas componentes da Federação. Abrange o poder de instituir, modificar e extinguir tributos.1
Os impostos, fontes principais de receitas derivadas, estão discriminados na CF/88 que enumera taxativamente aqueles cabentes a cada ente da Federação (art. 153, 155 e 156 da CF) como instrumento assecuratório da autonomia político-administrativa da União, dos Estados, do DF e dos municípios (art. 18 da CF).
A discriminação se impõe porque os impostos são tributos desvinculados de qualquer atuação específica do Estado, o que não acontece com a taxa, onde o titular da competência impositiva é o ente federativo que presta serviço específico e divisível.
O princípio discriminador de impostos, ao mesmo tempo que confere poder tributário privativo a cada entidade política contemplada, inibe o exercício desse poder a outra entidade política não contemplada, o que afasta a bitributação jurídica, salvo nas hipóteses expressamente ressalvadas pelo próprio texto constitucional. Já tivemos a tributação de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel tanto pelo ICMS, como pelo IVV extinto pela EC 3/1993.
É importante esclarecer que o exercício da competência tributária não é impositivo, isto é, não obriga o ente político contemplado a criar o imposto com que foi contemplado, no caso o IGF. Isso é elementar em Direito Tributário.
A criação do IGF está na dependência da política tributária adotada pela União, onde não é dado ao Poder Judiciário intervir. Não se confunde a política tributária com o Direito Tributário. Este age no campo jurídico, aquele no campo meta-filo-jurídico.
Logo, não cabe falar em omissão do Congresso Nacional em regulamentar o IGF que o Parlamento sabidamente não quer implementar. Nada há que possa obrigar o Parlamento Nacional criar esse imposto indesejado pela sociedade que ele representa.
Daí o manifesto equívoco em que incorreu o STF ao proferir a decisão retrotranscrita, como se o Parlamento Nacional estivesse se omitindo em esfoliar o contribuinte por meio do IGF.
Analisando o mérito desse IGF repelido no mundo inteiro pelo seu efeito altamente regressivo verificamos que ele teve origem na década de 1940 com a finalidade de captar recursos financeiros para a reconstrução dos países devastados pela Grande Guerra, notadamente nos países europeus.
Na França esse imposto foi instituído em 1982 por Mitterand, para cinco anos depois ser extinto, e reinstituído em 2017 pelo presidente Macron, mas com uma alíquota insignificante que não se presta para fim arrecadatório. Sua vigência até hoje está a indicar a manutenção da cultura da ruindade muito em voga no mundo contemporâneo. Foi essa legislação francesa que inspirou o nosso legislador constituinte a inserir esse IGF na competência tributária da União que até hoje não foi instituído porque incompatível com a nossa política tributária, voltada para a manutenção de forças produtivas do país. Se você for punindo pessoas ricas, pergunta-se, quem irá dar empregos e produzir bens e serviços de que tanto necessita o país? O IGF é um imposto de natureza pessoal que incide sobre o patrimônio acumulado ao longo do tempo, isto é, incide sobre tudo que já foi tributado antes por outros impostos como o IPTU, o ITCMD, o IPVA, o IR e o ITR.
E há uma dificuldade em identificar o que seja uma grande fortuna em um país cheio de desigualdades socioeconômicas entre as várias regiões em que se subdividem o nosso território. Alguém com patrimônio de R$300 mil pode ser rico no Norte/Nordeste, mas não nas regiões Sul/Sudeste.
O IGF é um imposto que afugenta os capitalistas que migram para os países onde esse malsinado imposto não existe, mas ele é mantido em outros países além da França, como Espanha, Noruega, Suíça e Argentina. Ele é desejado pelos progressistas, mas detestado pelos direitistas. É um imposto ideológico que não se coaduna com um país de regime capitalista. Durante a COP 30 o presidente Lula lançou a ideia de criar o IGF para financiar a política de preservação ambiental. Não é por acaso que Everardo Maciel escreveu um artigo estampado no Estadão intitulado "Ideias ruins são persistentes", referindo-se ao malsinado IGF. Esse artigo está inserido no site do IBEDAFT.
É lamentável que os deputados que não conseguiram adesão dos demais membros do Parlamento Nacional para instituir esse imposto nocivo à economia do país batam as portas do STF por meio do partido político que os abriga.
De fato, foram apresentados ao longo do tempo vários projetos legislativos para criar o IGF, mas nenhum deles prosperou. São eles o PLP 162/1989; o PLP 277/08; o PLP 183/19; e o PLP 50/20.
Porém, o que é mais lamentável é o fato de o plenário da Corte Suprema, por maioria de votos, ter dado guarida aos astutos deputados que não conseguiram apoio de seus pares e ajuizaram a ADO para suprir uma omissão que não existe e nunca existiu. Era o caso de rejeição liminar da ação remetendo a discussão da matéria à Casa Legislativa representativa da vontade popular.
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1 Cf. nosso Direito Financeiro e Tributário, Dialética, 2025, 34ª edição, p. 457.
Kiyoshi Harada
Sócio do escritório Harada Advogados Associados. Especialista em Direito Tributário pela USP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário - IBEDAFT.


