Prestação de serviços de internet: Instabilidade da conexão, dano moral e a visão dos tribunais
Falhas pontuais de internet não geram indenização e apenas o contratante pode recorrer à Justiça mediante comprovação de prejuízo concreto.
quarta-feira, 26 de novembro de 2025
Atualizado em 25 de novembro de 2025 15:20
A internet é serviço essencial para trabalho, estudo e comunicação, mas falhas pontuais na prestação têm gerado crescente número de demandas judiciais.
Sendo um serviço essencial no dia a dia da sociedade, utilizada para trabalho, estudo, lazer e comunicação. Naturalmente, ao contratar um plano junto à operadora, o consumidor deposita a expectativa de que a conexão seja contínua e estável. Contudo, é importante destacar que a prestação desse tipo de serviço envolve características técnicas próprias, sujeitas a fatores externos, estruturais e operacionais que, em determinadas circunstâncias, podem comprometer momentaneamente a qualidade da conexão, ainda que a prestadora adote esforços permanentes para garantir sua regularidade e estabilidade.
Crescente número de demandas judiciais por falhas na prestação do serviço: O avanço da tecnologia e a dependência cada vez maior da internet resultaram no aumento expressivo de ações judiciais envolvendo a prestação desse serviço. Muitos consumidores, diante de interrupções pontuais ou dificuldades de conexão, recorrem ao Judiciário em busca de indenizações, ainda que nem sempre haja comprovação de efetivo prejuízo. Esse cenário revela a necessidade de análise criteriosa por parte dos tribunais, a fim de diferenciar situações de falhas ocasionais - comuns em serviços de natureza complexa e sujeita a fatores externos - de casos de verdadeira falha na prestação, evitando-se a banalização das indenizações por danos morais e a criação de um passivo judicial desproporcional para as operadoras.
Eventuais instabilidades pontuais não configuram, por si sós, falha na prestação do serviço apta a ensejar responsabilização por danos morais, principalmente quando não há demonstração de prejuízo concreto que extrapole os meros aborrecimentos cotidianos. Cabe, ainda, observar que as prestadoras mantêm canais de atendimento, suporte técnico e protocolos para correção de falhas, devendo o consumidor buscar por esses meios a solução para o ocorrido.
Nos termos do art. 14 do CDC, o fornecedor de serviços responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores em razão de falhas na prestação do serviço. Contudo, essa responsabilidade objetiva não significa que toda instabilidade ou interrupção momentânea da internet gera, automaticamente, direito à indenização.
A responsabilização só é cabível quando comprovado que a falha configurou efetiva deficiência na prestação do serviço, apta a gerar prejuízo concreto que ultrapasse os meros aborrecimentos cotidianos. Interrupções pontuais ou instabilidades decorrentes de fatores técnicos externos não são suficientes para caracterizar dano moral indenizável.
Assim, a indenização por dano moral será devida quando houver demonstração de prejuízo efetivo ao consumidor - como perda de oportunidade de trabalho, impedimento de acesso a atividades essenciais, descumprimento reiterado de prazos de reparo ou omissão no atendimento. Nessas hipóteses, aplica-se a responsabilidade objetiva prevista no art. 14 do CDC, sendo desnecessária a prova de culpa da prestadora.
A jurisprudência tem firmado entendimento de que nem toda instabilidade de conexão configura, por si só, dano moral indenizável. Para a correta apreciação do pedido, os tribunais costumam observar alguns critérios objetivos, tais como:
- Duração da falha - se a interrupção do serviço foi momentânea ou perdurou por período prolongado a ponto de comprometer a utilização essencial da internet.
- Relevância do prejuízo - se houve efetivo impacto na vida do consumidor, ultrapassando meros aborrecimentos, como perda de oportunidade de trabalho, impossibilidade de realizar atividade profissional ou acadêmica, ou outros danos concretos.
- Recorrência - se os problemas ocorreram de forma isolada ou reiterada, evidenciando falha contínua na prestação do serviço.
- Conduta da empresa no atendimento - se a fornecedora demonstrou diligência em resolver o problema, disponibilizou suporte técnico adequado e buscou minimizar os transtornos, ou se, ao contrário, agiu com descaso, demora ou omissão.
- Prova produzida pelo consumidor - se foram apresentados elementos que comprovem a extensão do prejuízo alegado (protocolos de atendimento, comprovantes de interrupção, registros de duplicidade de pagamentos, entre outros).
Nas demandas que versam sobre falhas na prestação de serviços de internet, a legitimidade ativa é restrita exclusivamente ao contratante que celebrou a relação jurídica com a operadora. Essa restrição decorre do princípio de que apenas quem mantém vínculo contratual direto com o fornecedor é parte legítima para pleitear direitos decorrentes do serviço contratado.
Ainda que familiares ou terceiros residentes na mesma unidade consumam o serviço, não lhes é conferido o direito de ingressar como autores na ação, uma vez que não integram a relação contratual estabelecida com a prestadora. A utilização do serviço por terceiros não cria automaticamente legitimidade para reivindicar indenização por falhas na prestação.
O argumento de extensão da legitimidade previsto no art. 17 do CDC - que trata do consumidor por equiparação - não se aplica a esses casos. Tal dispositivo destina-se a situações de acidente de consumo, em que produtos ou serviços defeituosos causam danos a terceiros não contratantes, não abrangendo meras falhas contratuais na prestação de serviços como a internet.
A jurisprudência tem consolidado esse entendimento, afastando sistematicamente pedidos formulados por familiares ou terceiros que alegam prejuízos decorrentes da indisponibilidade do serviço, mantendo, quando cabível, a indenização restrita ao contratante que comprovadamente sofreu os danos resultantes do descumprimento contratual, garantindo coerência e segurança jurídica na aplicação do CDC.
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Fontes
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=jurisprudencia+dano+moral+em+interrup%C3%A7%C3%A3o+de+internet
Código de Defesa do Consumidor - 1990 - disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm
Geisiane Palácio Santos
Advogada formada pela Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (UNIDERP). Atua desde 2022 no escritório Mascarenhas Barbosa Advogados, com foco em demandas cíveis e de direito do consumidor.


