A necessidade de adequação pelas empresas ao nome social de colaboradores
TRT-4 condena supermercado a indenizar empregada por não usar seu nome social, reforçando dignidade, identidade e dever patronal de respeito no trabalho.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2025
Atualizado às 10:26
Em recente julgamento do TRT-4 (RS), um supermercado foi condenado ao pagamento de indenização a uma empacotadora que não era identificada pelo nome social, o que reacende discussões importantes sobre dignidade, identidade e responsabilidade patronal.
Em um país onde o Direito do Trabalho historicamente protege a personalidade e a integridade do trabalhador, não chega a surpreender que a Justiça tenha reconhecido o dano moral decorrente da recusa patronal em adotar o nome social da empregada - mas o caso, por seus contornos práticos, merece atenção cuidadosa em todos os nichos empresariais!
Segundo os autos, a trabalhadora solicitou que seu nome social (feminino) fosse utilizado nos registros internos, crachá, escalas e no cotidiano laboral. Apesar disso, permaneceu sendo tratada exclusivamente pelo nome civil (masculino) durante todo o período contratual, o que perdurou por quase três anos. A prova testemunhal confirmou que o pedido existiu e foi ignorado.
Para piorar, a realidade vivida por ela não se limitou à mera formalidade do crachá: houve relatos de restrições quanto ao uso de banheiro feminino, de negativas quanto ao uniforme correspondente à sua identidade e até de advertências sobre aparência, com ordens envolvendo cabelo e unhas - tudo sob a justificativa de que teria sido "contratada como homem".
Se a empresa buscava seguir suas práticas habituais, é válido destacar que o respeito é uma delas e deve orientar todas as relações de trabalho. É certo que a jurisprudência trabalhista nacional já reconhece há tempos que o nome social faz parte dos direitos da personalidade. Trata-se de projeção direta da dignidade da pessoa humana, fundamento constitucional que não exige qualquer malabarismo interpretativo.
O STF, ao julgar o Tema 761, também reforçou a autonomia da pessoa trans para afirmar sua identidade, inclusive no registro civil, sem condicionantes cirúrgicas ou médicas. Ainda que o caso analisado pelo TRT-4 não tratasse especificamente da alteração documental, o entendimento de fundo é semelhante: a identidade de gênero é um dado existencial que não depende da chancela administrativa para ser respeitado no ambiente de trabalho.
No plano jurídico, a conduta patronal enquadra-se no conceito de ato ilícito previsto no art. 186 do CC, porque viola direito da empregada e gera dano moral evidente. A recusa reiterada em utilizar o nome social produz constrangimento, exposição desnecessária, sensação de desamparo e menoscabo à identidade - um conjunto de prejuízos incompatíveis com aquilo que se espera das relações de trabalho.
E se o dano é certo, a obrigação de indenizar, nos termos dos arts. 186 e 927 do CC, segue o mesmo caminho. O valor fixado em R$ 30 mil levou em conta a duração do contrato e a reiterada negligência da empresa, que, mesmo ciente da situação, não tomou providências eficazes para ajustar suas práticas internas.
O caso também revela lições práticas relevantes. Para os empregadores, a adoção de políticas claras sobre o uso do nome social evita litígios e demonstra respeito à pluralidade existente no ambiente laboral.
A burocratização excessiva - exigir formulários, provas ou autorizações que não têm amparo legal - costuma servir apenas para alimentar disputas judiciais. Basta a manifestação de vontade do trabalhador. Crachás, sistemas internos e escala de trabalho devem refletir essa escolha. A falta de adequação, além de juridicamente arriscada, coloca a empresa em posição desconfortável tanto diante de seus empregados quanto perante a opinião pública.
O governo Federal sancionou recentemente a lei 15.263/24, que institui a Política Nacional de Linguagem Simples, proibindo o uso de linguagem neutra pela Administração Pública e reforçando que a comunicação oficial deve seguir a norma culta tradicional.
Ainda assim, a norma não impede que empresas privadas promovam, no seu ambiente de trabalho - tanto nas relações internas quanto na comunicação com clientes - o respeito à identidade de cada pessoa, adotando o uso do nome social, tratamento conforme a identidade de gênero e adequações necessárias em uniformes e instalações.
Em síntese, enquanto a Administração Pública se submete à formalidade linguística estatal, as relações privadas permanecem regidas pelos princípios da dignidade da pessoa humana, da não discriminação e da adequação prática efetiva, com a adoção do nome social e a promoção do tratamento verbal entre colaboradores conforme a identidade de gênero, além de uniformes, instalações em geral e banheiro/vestiários adequados.
O julgamento mencionado reafirma um ponto essencial aos empresários: o uso do nome social não é favor, nem "gentileza da casa", mas sim um direito dos colaboradores. O empregador que deixa de observá-lo não apenas se distancia das garantias constitucionais, como também se expõe a altas condenações que têm se tornado recorrentes no Judiciário.
Se há um princípio que resiste ao tempo, é o de que a dignidade não acompanha tendências: ela sustenta as relações de trabalho.



