A realidade das controvérsias
Controvérsias sustentam a democracia: Ampliam visões, estruturam o Direito e fortalecem o diálogo. O desafio é evitar a polarização que destrói o debate.
segunda-feira, 8 de dezembro de 2025
Atualizado em 5 de dezembro de 2025 14:44
As controvérsias não são apenas brigas ou desentendimentos. Elas representam a pluralidade da experiência humana. Em uma sociedade democrática, o dissenso não é apenas permitido, mas essencial. É através do confronto de ideias que as perspectivas se ampliam, os interesses se revelam e as estruturas são desafiadas. O consenso permanente, quando ocorre, pode indicar conformismo, enquanto as controvérsias são um sinal de vitalidade social.
Ainda assim, é fundamental distinguir entre controvérsias saudáveis e conflitos improdutivos. O debate que nasce da escuta atenta e da argumentação construtiva edifica. Já a polêmica vazia, alimentada por desinformação e ataques pessoais, apenas desgasta. Reconhecer a realidade das controvérsias exige maturidade para aceitar o desconforto do desacordo sem cair na hostilidade.
No campo jurídico, a controvérsia é uma parte essencial e cotidiana. Não há justiça sem a existência de conflitos. O trabalho de advogados, juízes e legisladores acontece na complexa zona cinzenta entre normas e fatos. Interpretar, ponderar e decidir são processos que surgem das controvérsias. Diferentemente do senso comum, o Direito não busca eliminar os conflitos, mas tratá-los de forma racional e institucionalizada.
Na política, o mesmo princípio se aplica. Quando o debate dá lugar à imposição e a divergência é silenciada em prol de uma suposta "unidade", há retrocesso. Democracias fortes não temem controvérsias; pelo contrário, elas as acolhem, processam e, quando possível, as transformam em avanços coletivos.
O mundo contemporâneo enfrenta um desafio que deturpa a essência das controvérsias: a polarização. Em um ambiente radicalizado, o dissenso perde sua capacidade de enriquecer e se transforma em trincheira. As redes sociais, com seus algoritmos voltados ao engajamento, intensificam esse fenômeno. Isso gera uma lógica de "nós contra eles", onde a complexidade é reduzida a slogans, e a empatia cede espaço para caricaturas do outro.
Essa cultura de antagonismo absoluto sufoca o diálogo e prejudica o pensamento crítico.
O problema não está na existência de opiniões divergentes, mas na incapacidade de reconhecer qualquer importância na perspectiva alheia. Quando todo debate assume o formato de uma guerra, todos saem perdendo.
Reconhecer a realidade das controvérsias significa aceitar que não há uma única verdade ou uma única forma de enxergar o mundo. Em muitas questões, mais importante do que "vencer" um argumento é construir pontes entre perspectivas legítimas, ainda que incompatíveis. Para isso, são imprescindíveis:
- Humildade intelectual: Admitir que podemos estar errados ou ter conhecimento incompleto;
- Disposição ao diálogo: Ouvir com atenção, argumentar com respeito;
- Compromisso com a verdade: Buscar informações confiáveis e combater a desinformação;
- Apreço pela diversidade: Compreender que a diferença é parte essencial da vida em sociedade.
A realidade das controvérsias não é um problema a ser eliminado. É uma característica inerente à liberdade, uma expressão da democracia e um motor para o progresso humano. Lidar com ela exige, acima de tudo, maturidade coletiva.
Stanley Martins Frasão
Advogado, sócio de Homero Costa Advogados Diretor Executivo do CESA Centro de Estudos das Sociedades de Advogados Membro da Comissão Nacional das Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB



