Resolução Anatel 765/23 - Novo regulamento geral de direitos do consumidor em serviços de telefonia
O novo RGC da Anatel reforça transparência, consentimento e rastreabilidade, mas cria riscos de litígios na transição, notificações, migrações e atendimento.
segunda-feira, 15 de dezembro de 2025
Atualizado em 12 de dezembro de 2025 14:26
Resolução Anatel 765/23 (novo regulamento geral de direitos do consumidor em serviços de telefonia): O que muda em relação à resolução 632/14 e onde estão os maiores riscos de litígio.
Resumo executivo (1 minuto):
A resolução 765/23 aprovou o novo RGC - Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações, revogando integralmente a resolução 632/14.
A vigência plena do novo RGC foi prorrogada para 1/9/25, mantendo-se em vigor apenas dispositivos pontuais desde 2023.
As mudanças concentram-se em suspensão por inadimplência, transparência de ofertas, migrações de planos, atendimento e rastreabilidade de protocolos - pontos que tendem a aumentar o contencioso se não houver governança e compliance regulatório.
1) Contexto e vigência
A resolução 765/23 institui o novo RGC, substituindo o marco de 2014. Embora o texto previsse entrada em vigor geral em 2/9/24, o Conselho Diretor da Anatel prorrogou a vigência integral para 1/9/25, preservando, desde 10/11/23, apenas dispositivos específicos (entre eles, regras sobre governança/implantação). Na prática, 2024-2025 foi um período de transição normativa com potencial de controvérsias sobre a lei aplicável a fatos ocorridos entre a revogação da 632/14 e a plena eficácia do novo RGC.
2) Principais diferenças e impactos esperados no contencioso
Suspensão e rescisão por inadimplência
O novo RGC detalha a notificação prévia de débito, prazo mínimo de antecedência e comunicação sobre motivos, valores e consequências.
Impacto: Risco de ações por suspensão indevida quando falharem forma e conteúdo da notificação; pedidos de restabelecimento e danos morais; debates sobre qual regime se aplica durante a transição.
Cobrança durante suspensão parcial ("serviço não utilizado")
A prestadora não pode cobrar a parcela do serviço não disponibilizada ao consumidor enquanto perdurar a suspensão por inadimplência.
Impacto: Discussões sobre base de cálculo; pedidos de restituição (inclusive em dobro, quando cabível).
Migração automática e alteração de ofertas
Reforço de transparência e consentimento na migração de ofertas/planos, com comunicação prévia e possibilidade de reversão.
Impacto: Litígios por migrações sem consentimento expresso; alegação de prática abusiva e manutenção de condições originalmente contratadas.
Extinção/alteração de planos e promoções
A lógica de comunicação prévia foi redesenhada, com maior ênfase em transparência do que em prazos rígidos.
Impacto: Insegurança sobre necessidade/forma do aviso; aumento de ações contra alterações unilaterais sem comunicação adequada.
Atendimento e canais (24h em casos urgentes, protocolos, registro de ofertas)
Exigências mais claras de rastreabilidade (protocolo desde o início do atendimento; histórico por período mínimo).
Impacto: Crescimento de demandas por ausência de protocolo, negativa de informação ou demora na solução.
Ponto físico de atendimento
O novo RGC flexibiliza a obrigatoriedade de atendimento presencial em todos os municípios.
Impacto: Contestações por desativação de pontos físicos (direito adquirido/expectativa legítima).
Transparência contratual e publicidade
Reforço de deveres de clareza sobre condições, penalidades e prazos; padronização e registro de ofertas.
Impacto: Incremento de discussões sobre cláusulas abusivas e publicidade enganosa; potencialização de ações coletivas.
Direito à informação cadastral do originador de chamadas
A regra expressa de acesso administrativo do destinatário aos dados cadastrais do originador (prevista no regime antigo, com alterações em 2020) não foi reproduzida de forma literal no novo RGC.
Impacto: Controvérsias sobre manutenção/supressão do direito; debate com o marco civil da internet e normas de privacidade.
Aplicação durante a transição
A coexistência de normas e datas escalonadas gera dúvidas de retroatividade/ultratividade.
Impacto: Decisões divergentes até consolidação jurisprudencial.
3) Questões jurídicas centrais (o que deve ir para o radar)
- Princípio da vulnerabilidade (CDC): Dúvidas interpretativas tenderão a ser resolvidas em favor do consumidor.
- Abusividade/onerosa excessiva: Migrações automáticas, suspensão indevida e cobrança em bloqueio podem ser enquadradas como práticas abusivas.
- Danos morais e ações coletivas: A ampliação de deveres de comunicação/atendimento aumenta a responsabilização civil por falhas recorrentes.
- Conflito de normas e lacunas: Disputas sobre qual regulamento regerá fatos pretéritos/contratos anteriores à vigência integral do novo RGC.
- Controle judicial da regulação: Questionamentos sobre alcance/legitimidade de exigências operacionais (registros, protocolos, padronizações).
- Direito adquirido e expectativa legítima: Preservação de condições consolidadas na vigência da 632/14 versus aplicação imediata das novas regras.
4) Como as empresas devem se preparar
- Mapeamento normativo e cronograma: Versionar contratos, políticas e jornadas de atendimento conforme o novo RGC, com trilha de auditoria.
- Notificações e suspensão por inadimplência: Revisar conteúdo, prazos e canais; garantir logs e entrega.
- Migração/alteração de ofertas: Padronizar rotinas de consentimento, comunicação e reversão; guardar evidências.
- Rastreabilidade e protocolos: Garantir geração e envio de protocolo no início do atendimento e histórico mínimo exigido.
- Treinamento e governança: Capacitar front e backoffice; criar comitê de incidentes regulatórios e plano de resposta.
- Monitor de litígios: Classificar riscos por tema (suspensão, migração, atendimento, publicidade) e ajustar a régua de acordos.
5) Conclusão
O novo RGC moderniza o regramento consumerista do setor, mas desloca o foco para transparência, consentimento e rastreabilidade. Em paralelo, a flexibilização de antigos comandos e a fase de transição criam zonas de atrito. Quem se antecipar - alinhando contratos, notificações, atendimento e registros - tende a reduzir passivo e ganhar previsibilidade na relação com consumidores e reguladores.
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Resolução Anatel nº 765/2023 (novo RGC) - página oficial da Anatel
https://informacoes.anatel.gov.br/legislacao/resolucoes/2023/1900-resolucao-765
Nota oficial: Conselho Diretor prorroga entrada em vigor do novo RGC para 1º/09/2025
https://www.gov.br/anatel/pt-br/assuntos/noticias/conselho-diretor-prorroga-a-entrada-em-vigor-do-novo-regulamento-geral-de-direitos-do-consumidor-de-servicos-de-telecomunicacoes
Resolução Anatel nº 632/2014 (revogada) - texto histórico
https://informacoes.anatel.gov.br/legislacao/resolucoes/2014/750-resolucao-632
Resolução Anatel nº 727/2020 (alterava o acesso a dados do originador de chamadas)
https://www.anatel.gov.br/legislacao/resolucoes/2020/1419-resolucao-727
Manual Operacional do RGC - Versão de junho/2025 (PDF, SEI/Anatel)
https://sei.anatel.gov.br/sei/modulos/pesquisa/md_pesq_documento_consulta_externa.php?8-74Kn1tDR89f1Q7RjX8EYU46IzCFD26Q9Xx5QNDbqYYAE6Xa7yd1eI7mIZiZw7Tj1sWlqLGCmWdeKhKxM1CTYF5Ed3OW5JrueWS5cZKHayovavsf3a3Tk7xAbPKw0UN=
Página "Conheça seus direitos" (Anatel/Consumidor) - guia ao novo RGC
https://www.gov.br/anatel/pt-br/consumidor/conheca-seus-direitos/direitos-do-consumidor-de-servicos-de-telecomunicacoes
(Opcional) Publicação no DOU da Resolução nº 765/2023
https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-anatel-n-765-de-6-de-novembro-de-2023-522171563
Paulo Henrique Bispo da Gama
Coordenador. Graduação: Direito, Universidade de Mogi das Cruzes. Pós-graduação: Processo Civil (Centro Universitário UniDomBosco)


