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O STF e os limites ao terceiro mandato

No julgamento do RE 1.355.228/PB (Tema 1.229 RG), o STF estabeleceu novos critérios para aferição do exercício de mandato para fins de reeleição.

terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Atualizado às 13:16

No dia 26/11/25, o STF julgou o RE 1.355.228/PB (Tema 1.229 RG). O recurso trata das consequências eleitorais para vice que substitui titular cassado por decisão judicial. A decisão estabelece critérios importantes para aferição do exercício de mandato para fins de reeleição, bem como abre uma exceção a jurisprudência majoritária do TSE sobre a interpretação do art. 14, § 5° da CF/88.

No julgamento do Tema 1.229, o STF fixou a seguinte tese: "o exercício da chefia do Poder Executivo, nos seis meses anteriores ao pleito, em decorrência de decisão judicial não transitada em julgado, não conta como exercício de um mandato para efeito de reeleição."

Assim, o período em que o vice ocupar a chefia do Poder Executivo, em substituição ao titular cassado por decisão judicial, não será contabilizado como exercício de mandato, ainda que a substituição tenha ocorrido nos seis meses antes das eleições. Em termos práticos, o vice poderá concorrer a eleição imediatamente posterior e, se eleito, a reeleição, que essa não será considerada terceiro mandato consecutivo na forma do art. 14, § 5° da CF/88.

O STF estabeleceu critérios para aplicação do Tema 1.229, quais sejam: (i) a substituição tem que decorrer de decisão judicial; (ii) a decisão judicial tem que determinar expressamente a substituição; (iii) a decisão judicial não pode ter transitado em julgado e; (iv) a substituição tem que se dar nos seis meses antes das eleições.

Primeiramente, a substituição tem que decorrer de decisão judicial que cassa o mandato do chefe do Poder Executivo. Logo, substituição que se dê por força de processo de impeachment, por exemplo, não está abarcada pelo Tema 1.229.

Neste sentido, o ministro Dias Toffoli afastou aplicação do Tema 1.229 ao caso do então presidente da Câmara Municipal de Itaguaí/RJ que substituiu o prefeito e o vice após dupla vacância decorrente de processo impeachment. Segundo o ministro Dias Toffoli, o caso não guarda relação com o Tema 1.229, conforme decisão monocrática proferida na PET 13.350/RJ:

"Somente após a conclusão do julgamento e delimitação da tese no âmbito desta Corte, é possível afirmar, com juízo de certeza, que as hipóteses aqui discutidas não se confundem com o objeto delimitado na tese de julgamento firmada no paradigma da repercussão geral. Isso porque Rubem Vieira de Souza ocupou a chefia do executivo municipal em 10/7/20, permanecendo no exercício do cargo até o final do mandato, em virtude da vacância nos cargos de prefeito e vice-prefeito oriunda de processo de impeachment instaurado pela Câmara Municipal no ano de 2019.

"Ante o exposto, diante da conclusão do julgamento do paradigma do Tema 1.229 da RG, forçoso reconhecer configurado fato superveniente que torna insubsistentes as alegações do requerente, porquanto este ocupou a chefia do executivo municipal nos últimos seis meses que antecederam as eleições de 2020, fora da hipótese prevista na supra mencionada tese de repercussão geral." (PET 13.350/RJ, relator ministro Dias Toffoli, j. 27/11/25, original não grifado)

Adicionalmente, a decisão judicial tem que determinar expressamente que o vice substitua o titular cassado na chefia do Poder Executivo. Assim, ficam excluídas as situações em que a substituição se da apenas por força de lei, sem menção expressa na decisão judicial.

Mais ainda, para a aplicação do Tema 1.229, a decisão judicial não pode ter transitado em julgado. A ausência de trânsito em julgado assegura o caráter precário da substituição, porque o titular pode voltar a ocupar o cargo a qualquer momento. O mesmo raciocínio vale para decisões liminares que afastem o titular.

Contudo, caso a decisão judicial transite em julgado e confirme a cassação do titular, a substituição convola-se em sucessão e o período posterior ao trânsito é contabilizado como exercício de mandato para fins de reeleição. Aqui, não importa quanto tempo o substituto tenha ficado na chefia do Poder Executivo após o trânsito em julgado, o período será contabilizado como mandato para fins de reeleição.

Dito isto, a tese fixada pelo STF no Tema 1.229 estabelece uma exceção ao entendimento majoritário do TSE sobre exercício de mandato para fins de reeleição e, consequentemente, para a aplicação da inelegibilidade art. 14, § 5°da CF/88.

A atual jurisprudência majoritária do TSE entende que o período de seis meses antes do pleito é critério "objetivo na definição do exercício de primeiro mandato na chefia do Executivo para fins de incidência das regras de inelegibilidade." (agravo regimental no REsp eleitoral 0600222-82.2020.6.15.0068 - Cachoeira dos Indios/PB, relator ministro Mauro Campbell Marques, j. 1/7/21.)

Isto significa que, se a substituição ocorrer no período de seis meses antes das eleições, o período será contabilizado como efetivo exercício de mandato para fins de reeleição, não importando a quantidade de tempo que o substituto tenha ficado no cargo ou se tenha praticado atos de gestão.

O Tema 1.229 estabelece uma exceção a este entendimento porque, ainda que ocorram nos seis meses antes das eleições, as substituições decorrentes de decisão judicial não transitada em julgado não serão consideradas como exercício de mandato para fins de aplicação da regra de inelegibilidade do art. 14, § 5° da CF/88.

Embora a decisão do STF signifique um avanço para se aferir o caráter precário das substituições decorrentes de decisão judicial, alguns aspectos do julgamento merecem maior detalhamento.

Um ponto que merece atenção é o alcance da decisão quanto aos substitutos do chefe do Poder Executivo. Ou seja, o Tema 1.229 abarca somente vices ou também abarca substitutos eventuais, como Presidentes de Casas Legislativas? A princípio, entendemos que o Tema 1.229 é direcionado apenas para os vices, porque a moldura fática do RE que deu origem ao Tema 1.229 trata apenas da substituição por vice-prefeito.

Outra situação que vai merecer atenção do TSE, e eventualmente do STF, é a definição de critérios para aferição de exercício de mandato nos casos de substituição envolvendo presidentes de Casas Legislativas nas hipóteses de dupla vacância. Neste caso, caberá a Corte Eleitoral, mais uma vez, criar critérios para se evitar a perpetuação de poder, mas sem estabelecer restrições desproporcionais aos chamados "substitutos eventuais".

Isto posto, a decisão do STF no Tema 1.229 permite aferir com maior precisão o caráter precário de substituição decorrente de decisão judicial. O Tema 1.229 afasta a aplicação desproporcional da inelegibilidade do art. 14, § 5° da CF/88 a pessoas que ocuparam a chefia do Poder Executivo de maneira precária e no cumprimento de um dever legal. A finalidade é assegurar que candidatos que assumiram a chefia do executivo em virtude decisão judicial e, sobretudo, sem o animus de exercer efetivamente mandato, possam concorrer a dois mandatos consecutivos.

Vitor Marques

VIP Vitor Marques

Advogado, mestre e doutorando em Filosofia do Direito pela PUC-SP. Sócio do escritorio Caires, Marques e Mazzaro Advogados.

Erick Beyruth de Carvalho

Erick Beyruth de Carvalho

Mestre em Direito Constitucional pela PUC-SP. Pós-Graduando em Direito Eleitoral e Processual Eleitoral pela EJEP. Advogado.

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