Migalheiros 24/1/2010 Claudia Corrêa "São Paulo... um mundo dentro de outro. Terra das oportunidades, das conquistas, dos sonhos, dos prazeres. Berço das grandes realizações profissionais. Fechamento de grandes contratos. Grandes acontecimentos, palco de grandes shows, grandes estréias, farta gastronomia. São Paulo, em suas milhares de facetas, como defini-la em uma única palavra? Estresse? Dinheiro? Consumo? Não. Muito. É a terra do muito. Muito grande, muito carro, muito trânsito, muito barulho, muito perigoso, muito consumo, muito lazer, muito entretenimento, muito restaurante, enfim... tanto no seu lado negativo, como positivo, tudo é em exagero. E onde está o equilíbrio? Deveria estar em seus habitantes, não? Impossível. Porque, afinal, quem são? Muitos também. Aliás, ainda existem paulistanos PO - puro de origem? Os poucos, que por aí devam existir, já não têm mais força para se pronunciar. São Paulo, não tem mais suas crias, não tem mais filhos biológicos, apenas adotivos e agregados em sua maioria. Portugueses, italianos, japoneses, nordestinos, e alguns outros em menos quantidade tais como: catarinenses, gaúchos, mineiros, colombianos, nigerianos, etc... Os que não são legítimos imigrantes, certamente são descendentes. Terra de ninguém? Ou terra de todos? Eis a dúvida. Portanto, eis o caos. Ninguém se responsabiliza por melhorias, por conservação, por preservação. Jogar lixo na rua? 'E daí, se o português pode jogar, por que eu, o italiano, não posso?' Conservar um telefone público? 'Pra quê? Não é só meu, é também do mineiro e do nordestino. Além do mais, tem bastante pelas ruas.' Infelizmente é assim mesmo que as pessoas pensam. Pior que isso: é assim mesmo que agem. A maioria não age pelo bem comum, não age pelo outro também, apenas para si. E é por isso, que uma cidade desse porte, teria tudo para ser o melhor lugar do mundo, se seus habitantes fossem, pelo menos, humanos. Sabia, caro leitor, que no mundo animal, as fêmeas não fazem suas necessidades fisiológicas próximo de rios e nascentes? Sim. Para não poluí-los, não contaminá-los. Puro instinto de conservação. E ainda dizem que somos racionais? Aonde, me diga? E o consumo paulistano? O que dizer sobre essa facilidade? Quer comer uma jaca em plena duas da manhã? Maravilha! São Paulo dá para você. Precisa urgentemente de um livro, de um cd as três da manhã? Ótimo! São Paulo dá para você. Quer comprar um biquíni, uma sunga, em pleno inverno? Que bom, está no lugar certo! São Paulo dá para você. Só que, infelizmente, por conta do muito, SP não nos dá somente consumo material. São Paulo também nos consome a paz, consome o equilíbrio, consome a família, consome os amigos, consome sobretudo a saúde! Por causa do muito ambicioso, por causa do muito competitivo, por causa do muito ganancioso, por causa do muito egoísta. E somos nós, os próprios culpados inocentes. Somos obrigados a dançar conforme a música. Torna-se uma questão de sobrevivência: ou matamos ou morremos. E por que há tanta solidão em um lugar com tantas pessoas? Porque, talvez por medo, acabamos também nos isolando. Muitos de nós, sobreviventes paulistanos, vivemos completamente sozinhos, na maior cidade do país. Muitas vezes, sequer conhecemos nosso vizinho de parede. Somos solidários com pessoas que estão a quilômetros de distância de nós, muitas vezes vítimas de desmoronamentos, enchentes ou desastres naturais. Mas sequer percebemos se nosso vizinho precisa ao menos de um simples 'bom dia'. Nos relacionamos o tempo inteiro, desde da hora que acordamos até o hora de dormir, e no entanto não sabemos quem são as pessoas com as quais convivemos. Bem como, as mesmas, também não nos conhecem. E nesse vai e vem desordenado de pessoas e de relacionamentos evasivos, vamos fazendo nossa vida, vamos criando nossas raízes. Vamos parindo mais filhos para SP: nossos filhos, que certamente, gerarão nossos netos e por aí vai...Não tem jeito, São Paulo, nos enfeitiça, nos hipnotiza, nos prende em sua teia. Exerce poder sobre nós. E que poder é esse? É a esperança, claro. Esperança de, pelo menos, conseguirmos no presente, mantermos nossa família, e no futuro - quem sabe - envelhecer com um pouco de dignidade. Por isso estamos aqui na terra do muito, por isso trabalhamos muito, por isso corremos muito, por isso nos dedicamos muito, por isso tentamos muito, por isso recomeçamos muito. E o clima? O que dizer sobre ele? São Paulo é ainda a 'terra da garoa'? Não mais. São Paulo hoje é a terra da tempestade, do ciclone. Não por causa do clima propriamente dito, mas sim por causa de seus habitantes. São Paulo recebe e acolhe calorosamente seus filhos adotivos. Proporciona à eles, quase tudo que almejam. Mas, como quase todo filho adotivo, os mesmos, se revoltam contra quem os acolhe, e não percebem que são eles próprios os causadores de tanta intempérie." Envie sua Migalha