Operação Têmis

1/10/2010
Glaucus Alves da Silva - OAB/SP 282.449

"Em apenas dois dias notícias tão intrigantes, e profundas na matéria jurídica, de um lado o poder persecutório de outro o cidadão, o peso deste último parece ainda dar margem ao adágio que somente pobre é que vai preso (Migalhas 2.481 - 29/9/10 - "Operação Têmis"). Com a máxima vênia, me atrevo a discordar dos nobres ministros do STF, visto que a lei não contém palavras inúteis. Assim, quando prevê que na falta de perito, duas pessoas com curso superior poderão ser designadas como perito, não o diz a toa (CPP, art.159, § 1º). Por outro lado, o artigo 157 do CPP, com redação atual traduz o que é uma prova ilícita nos seguintes termos : 'São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais'. Considerando a letra da lei, e sua definição sobre prova ilícita, é forçoso admitir que o ministro que divergiu do relator e os que o acompanharam, deixaram de atuar segundo o comando legal, não podemos punir a qualquer preço, se o Estado-juiz avoca para si o poder de punir, deve estar aparelhado para tanto, e mais ainda, deve ser o fiel cumpridor das regras que apresenta a sociedade. Também não se diga que o CPP, art. 3º autoriza a interpretação extensiva ou analógica, pois, no caso a regra é clara. Não olvidamos da competência dos milicianos em afirmar o potencial ou não de lesividade de uma arma de fogo, a questão é a legitimidade de tal afirmação. A lei determina que o laudo deva ser realizado por perito, e não por qualquer pessoa que saiba usar bem uma arma de fogo, e na falta deste, autoriza que não peritos possam elaborar o laudo, mas, impõe certificações que neste caso não estavam presentes. À guisa de exemplo, uma pessoa presa por conduzir seu veículo em elevado estado de embriaguez, ainda que seja formado em curso superior, se não o provar, não terá o direito de cela especial, não se dá crédito a sua palavra, entretanto, neste caso a falta de um diploma (requisito legal e de validade), mereceu credibilidade de nossa corte maior, isso em dissonância da regra legal, validando a prova e a condenação. Agora vejamos o caso da Operação Têmis. Questão Constitucional, digo isso quanto ao previsto no artigo 5º, inciso XII, quanto ao tripé que mantém o Estado, Legislativo, Executivo e Judiciário, e a função deste último. Pois bem, a lei 9.296/96, artigo 2º afirma as situações onde não será autorizada a interceptação das comunicações telefônicas, e aqui se sutentou parte das razões da douta juíza em negar as provas, notem que aqui a situação é diversa da descrita anteriormente, pois existe a lei autorizando a prova, e a decisão afastou tal prova. A douta juíza fundamentou no fato que as provas seriam ilícitas por não ter havido uma prévia investigação por parte da Polícia Federal, no entanto, houve uma notícia sobre a prática de delito, ante o caso, houve um pedido de interceptação, um juiz analisou a situação e autorizou tal interceptação, e uma investigação prévia em gabinetes de juízes com certeza não produziria as provas necessárias adesmantelar uma vergonha ao 'Poder Judiciário'. Deixou de atuar com o costumeiro acerto a nobre julgadora, o mérito da investigação não lhe cabe, desacreditou o colega juiz que autorizou, ignorou seus fundamentos. Temos ainda o segundo fundamento, ou seja, faltou fundamentação jurídica a prorrogações. Se houve prorrogações, houve pedido, não conhecemos as razões de tais pedidos, porém, coube ao juiz do caso analisar se havia ou não razão para a prorrogação, e se autorizou, não creio que o tenha feito sem analisar com detalhe a questão, mesmo por que se trata de cortar na carne, assim, não seria tal magistrado imprudente, de forma que tudo leva a crer que mais uma vez a douta magistrada deixou de atuar com o costumeiro acerto, equivocou-se na análise das provas carreadas e seus objetivos. Douta Magistrada, ainda que a questão envolva colegas de toga, essa é mais profunda, o judiciário tem o condão de pacificar a sociedade, levar a resposta justa ao jurisdicionado, mormente que este se afastou da autotutela acreditando no Estado-juiz, assim, a sociedade exige que questões como essa sejam cabalmente esclarecidas, as investigações por meio da interceptação telefônica foram respaldadas em lei, não sendo segundo a definição legal (art. 157 do CPP) provas ilícitas, ainda que uma ou mais prorrogação estivesse desprovida de fundamentação, seria caso de se aproveitar aquela que não o estivesse, ainda mais se nesta estivesse à prova de venda de sentenças por parte de membros do Judiciário, que nesse caso são criminosos. Apresentada as questões tupiniquins, vejamos a matéria do ilustre professor Luiz Flávio Gomes, embora se trate de direito alienígena, o direito Italiano/Romano deita raízes em nosso ordenamento jurídico desde nosso descobrimento. Em cotejo com nosso ordenamento, e o sentimento social de impunidade, temos que a decisão italiana merece ser tida como correta, embora o senso comum possa afirmar que foi mais um caso de impunidade, foi aplicação do devido processo legal, e as garantias que nele se contemplam. No Brasil, são inúmeros os casos onde mediante interceptação telefônica, autoridades e políticos vêm a serem tidos como delinquentes, por prerrogativa de foro, as provas são encaminhadas a autoridade competente para que autorize a continuação da interceptação, e casos de crimes descobertos, do tipo que não autoriza a interceptação, no entanto, estão umbilicalmente ligados ao crime que os autorizou, nesse caso temos que é legítima a prova e sua apuração. No caso Italiano, não existe a conexão, assim, não podemos vislumbrar que em tal situação a investigação houvesse de continuar no mesmo contexto, havendo a necessidade de procedimento próprio. Sempre fica uma questão, se na investigação de um crime específico, autorizada a interceptação telefônica, apura-se a autoria de um outro delito, a guisa de exemplo : um sequestro em andamento, a localização do cativeiro, como agir ? Parece claro que se deve imediatamente buscar a liberdade do cativo, embora a prova possa ser considerada ilícita, sobrepõe-se o dever com o cidadão, sua liberdade, integridade física e seu bem estar. Em breve conclusão, o poder persecutório do Estado não é ilimitado e não pode ser limitado onde a lei não previu barreira, sempre deve prevalecer o interesse social sobre o interesse de parcela da economia, grupos ainda que no poder, a sociedade para que aceite o Estado-juiz deve acreditar que ao levar suas questões a este, obterá justa e comedida decisão, sob pena de se perder o controle das instituições e dos anseios sociais. 'De tanto ver triunfar as NULIDADES, de tanto ver prosperar a DESONRA, de tanto ver crescer a INJUSTIÇA, de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos DOS MAUS, o homem chega a RIR-SE da honra, DESANIMAR-SE da justiça, e TER VERGONHA de ser honesto !' (Rui Barbosa, 1917)."

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