Faculdade para presidentes

14/7/2005
Marcos José do Nascimento

"Acerca do tema de Cleanto Farina, Faculdade para Presidentes, ocorre que, em síntese, nessas crises descobertas e nas veladas, que não vêm a público, temos, acima de tudo, uma crise de ordem moral, não a moral convencional, mas a mais profunda, em que o ser humano defronta-se com o seu livre arbítrio (para os que ainda pensam em fazer algo certo) entre optar pelo mais correto, em prol da coletividade e dos interesses públicos, ou defender interesses particulares escusos. A ética, como proposta de conduta, é sempre deixada de lado. Acontece que nós, como povo, fomos educados, ao longo do tempo, para termos duas morais, uma de uso público, outra de uso privado, uma defendida em nossos templos de fé, e outra usada na nossa vida de relação, nos mais variados setores dela. O que é o perdão buscado nos templos de fé, senão a sanção do erro, com uma prática de cunho de exterior? Esse valor tem permeado toda a nossa sociedade, ao longo de sua formação e daí surgem os mais variados desvios, em todos níveis e de todos os tipos. Assim também ocorre com a ética, prega-se uma ética em público, usando-se outra no particular. Os políticos, alguns deles, senão a maioria, têm feito isso ao longo de muitas campanhas, pregam uma verdade nas praças e no horário de televisão, mas nos gabinetes e nos corredores, usam uma verdade bem diferente da veiculada para os seus eleitores, crédulos de que estavam fazendo a melhor escolha. É interessante notar, em alguns momentos, os canais de televisão do legislativo federal, tanto o da Câmara dos Deputados quanto o do Senado, temos visto, em alguns momentos, de passagem, comportamentos estranhos e curiosos, quando não contraditórios. Um senador defende que não defende interesse do Banco Opportunity, que viu seu presidente umas três ou quatro vezes, mas que no entanto possui uma amizade de vinte anos com um de seus diretores, ora, esse fato, por si só, já caracteriza ser suspeita a opinião do parlamentar. Uma deputada federal, com a autoridade de ter exercido a magistratura, afirma que não devemos olhar para trás, todavia, não há como entender esse tipo de argumento, posto que não há fato isolado no tempo, e os fatos sociais, assim como os históricos, são conseqüência de causas anteriores, algumas até talvez bem mais distantes. Talvez ela com isso quisesse proteger seu ex-partido, o PSDB. Um exemplo claro dessa situação é que, já no Segundo Império, os dois partidos então existentes, o Conservador e o Liberal, alternavam-se no poder, vivendo, ambos, de verbas e cargos públicos. A ética deveria ser disciplina obrigatória do currículo escolar, em todos os níveis, assim como se deveria ensinar, desde as primeiras letras, noções de cidadania, de forma a que surja, nas novas gerações, uma nova mentalidade, posto que várias das que hoje estão aí não têm mais conserto. Na faculdade de Direito, já percebíamos o quão anti-ético tinha na conduta de certos colegas, no relacionamento entre estudantes e com professores, não obstante a carga de informação ética que foi oferecida, mas desprezada por alguns. Esses colegas, tornados profissionais, dificilmente serão operadores do Direito que se comportarão de forma ética nas suas relações. Daí advirão ou não os escândalos e os desvios de conduta. Somente com muito senso crítico e auto-crítico forja-se no ser uma vontade de agir com ética, de outra maneira, não passaremos de criaturas envernizadas, tendo nas belas palavras e no conhecimento científico um verniz social, sem conteúdo de profundidade, o que percebemos na sociedade em que hoje vivemos e, quiçá, não será na de amanhã, a que os nossos descendentes herdarão."

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