Garis

11/3/2014
Francisco Antonio Fabiano Mendes

"Até quando este abuso? Já vi centenas de vezes, na cidade do Rio de Janeiro, mas a cena sempre me choca e por vezes deprime: os garis viajando em pé, na parte traseira do caminhão da coleta do lixo, sendo forçados a inalar os fortes odores oriundos dos restos coletados e compactados no caminhão. Todos sabem que esse caminhão não cheira a rosas, muito pelo contrário. Mas os trabalhadores da limpeza são obrigados a respirar esses odores e, ademais, a viajar 'pendurados' na parte de trás do caminhão, correndo grave risco de queda (o motorista está pouco ligando para a segurança dos colegas de trabalho: acelera e salve-se quem puder). Como todos já sentiram, o cheiro que exala do caminhão é nauseante, impossível de aturar. Mas os desafortunados garis passam toda a sua jornada de trabalho a se intoxicar com esse odor pestilento. E ninguém, ao que eu saiba, se lembrou de reivindicar que os caminhões de coleta tenham uma cabine, na parte fronteira, ao lado e atrás do motorista, para acomodar (sentados) os garis. Não: dia após dia, lá seguem eles sua absurda rotina, que obviamente lhes causa grandes males à saúde. Daí pergunto, quando vai surgir uma liderança; quando vai haver uma mobilização da sociedade, para por fim ao desrespeito à saúde, à segurança e, mais ainda, à dignidade desses seres humanos? Ao ver esses garis pendurados nessa lixeira ambulante, que é o caminhão de coleta, vem-me aos olhos a imagem dos antigos escravos, coletores de lixo, do tempo dos vice-reis, que percorriam a cidade com os tonéis de detritos (dos seus patrões e deles) sobre a cabeça, para irem despejá-los longe das residências. Estaria eu em erro, ao dizer que a situação dos atuais garis tem forte similitude com a desses escravos? Por que toleramos - todos nós, que já vimos o caminhão de lixo passar à nossa frente centenas de vezes - esse estado de coisas? Previno que não sou candidato a cargo político nem sindical, mas quero compartilhar com vocês esse meu inconformismo. Aliás, por onde andam as autoridades públicas fiscalizadoras do trabalho? E as lideranças dos garis?"

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