Artigo - Greve: direito ou violência?

10/6/2014
Renato Neves

"O eminente jurista, em seu brilhante texto, deixou de comentar um outro aspecto da realidade brasileira, muito relevante a meu ver (Migalhas de peso - 10/6/14 - clique aqui). Trata-se da constatação de que, mesmo sendo o Brasil a sexta maior economia do mundo, o nível salarial em nosso país é muito baixo, os governos e empregadores do setor privado não costumam negociar salários e demais direitos, muito menos fazer qualquer concessão. Ainda, os direitos trabalhistas, que são ainda os da época de Getúlio Vargas, estão sob constante ameaça, e reiteradas vezes são desrespeitados, sem falar na perseguição que sofrem os funcionários públicos, com perda constante de direitos e falta de reajuste salarial. Não podemos esquecer também da constante perda de direitos previdenciários que sofre o trabalhador brasileiro. Não é de se estranhar que estejamos entre os 10 últimos países do mundo em distribuição de renda, uma vez que uma efetiva política de distribuição de renda não pode deixar de se apoiar em três pilares: melhoria do nível salarial, manutenção e ampliação dos direitos trabalhistas e manutenção e ampliação dos direitos previdenciários. O que se vê nas atuais medidas governamentais e decisões da Justiça do Trabalho em dissídios coletivos, em regra, são tentativas de impedir, na prática, o exercício do direito de greve. Acontece que a greve sempre foi, é, e sempre será, um estado de fato e não de direito. Penso que nossa sociedade não tem uma cultura grevista, não se organiza para exigir seus direitos sociais, o que é muito prejudicial ao conjunto dos trabalhadores. Isso se deve ao baixo nível de informação, politização e escolarização do povo. Enquanto a sociedade brasileira e seus governantes não se convencerem de que é necessário distribuir renda, por meio dos três pilares ressaltados anteriormente, não seremos um país verdadeiramente desenvolvido. As nações europeias que hoje são modelos de respeito aos direitos sociais, distribuição efetiva de renda e consequente desenvolvimento econômico e social, chegaram a esse ponto após uma história repleta de greves e de muitas outras lutas. Não vejo futuro para o Brasil enquanto não houver efetiva distribuição de renda. Para tanto seria necessário melhorar muito a educação e politização do povo e, aí, talvez, após muito tempo e muita luta, poderíamos chegar perto do nível de organização social de nações como Suécia, Noruega, França, Alemanha, etc. Portanto, penso que o nosso problema aqui no Brasil não são as greves, mas sim a ganância e a intransigência dos empregadores e a truculência e o alto nível de corrupção dos governantes, além do fato de sermos uma sociedade composta em regra por trabalhadores muito mal remunerados, e que não têm a cultura da reivindicação coletiva de direitos e de melhores condições de vida. Não existe conciência de classe no Brasil, principalmente entre os trabalhadores das mais baixas classes. Os trabalhadores ficam, em regra, uns contra os outros e não percebem que, quando uma categoria profissional perde uma disputa com seus empregadores ou com o governo, no fim, todos perdem, a sociedade perde."

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