Ministro Nelson Jobim

6/2/2006
Pedro Luís de Campos Vergueiro - Procurador do Estado de São Paulo aposentado e advogado

"Jobim despe sua toga. Finalmente! Quem chegou lá, para o exercício das atribuições do cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, lá está por suas reconhecidas qualidades de jurista. Não outras. Esta realidade inequívoca é exigência da Constituição vigente, cujo artigo 101 preceitua que, para ser nomeado, o indicado deve ter 'notável saber jurídico'. Não obstante, é requisito indissociável desse o notório reconhecimento do candidato ter 'reputação ilibada', abrangendo tanto a vida pública como a vida privada, é claro. Nem poderiam deixar de ser instituídas essas exigências, visto que a missão da Corte é 'precipuamente, a guarda da Constituição' (artigo 102). 'Guardar' a Constituição, no significado de defendê-la, protegê-la, preservá-la e, sobretudo, expurgar do ordenamento Jurídico tudo quanto afronta o Estado de Direito e os direitos da cidadania, garantidos em seus dispositivos. Quem aceita assumir o posto, dada a missão que esse ato de vontade envolve, não pode ter pretensões outras na organização e na vida da Nação Brasileira, sobretudo na vida política. Empossado, sua missão é única e deve ser desenvolvida com a mais absoluta exclusividade. Quanto às outras pretensões, se as tinha, deverá esquecê-las para que possa exercer com dignidade o seu atual mister que é a jurisdição constitucional. O Supremo Tribunal Federal não é, nem pode ser, pois, trampolim para uma futura disputa por um cargo público de outra natureza, ou retorno às origens políticas. São inúmeros os exemplos de políticos que começaram como funcionários públicos do primeiro escalão e que ambicionaram uma carreira política, postulando os cargos de Vereador, Deputado Estadual, Deputado Federal, Senador, Prefeito, Governador, carreirismo que tem por ápice a Presidência da República. Há exceções, é claro. Dessa progressão, em nenhum momento e em nenhuma circunstância, num Estado de Direito como o brasileiro, a Magistratura faz parte. Como o Ministro Marco Aurélio Mello também estamos perplexos. A Constituição que muito custou para os cidadãos brasileiros, pois foram muitos anos de um regime autoritário antes de seu advento e pelo que muito se lutou em todas as frentes possíveis para que viesse a lume, a atual Constituição, como tal e por ser tal, paira acima de tudo e de todos, e todos e tudo a ela devem se conformar. Não é outra a sua finalidade senão instituir a ordem, organizando as linhas mestras da sociedade, tanto a civil como a política, com muito zelo pelos direitos fundamentais do ser humano. Na medida em que o Estado de Direito brasileiro tem por fundamento, dentre outros, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, e o pluralismo político, não deixou espaço para que um estilo de governo se afaste da observância desses preceitos e princípios. Isso posto, decorre daí ainda mais a perplexidade. Na abertura do ano Judiciário, o político Nelson Jobim fez uma confissão. Declarou para quem quisesse entendê-lo que em seu posto não vinha fazendo outra coisa senão preconizar que a Constituição deve se curvar à governabilidade do momento. Deflui de suas palavras: qualquer governabilidade, mesmo, portanto, se espúria. Sob certo aspecto, o político Nelson Jobim, quem diria, fez a apologia da desordem. Diante do que foi dito pelo político Nelson Jobim, todo advogado não deve adotar outra decisão senão esta: em todo processo que lhe for distribuído deverá ser requerida formalmente a sua suspeição. Pessoalmente, não me agrada vê-lo apreciar e julgar um processo meu em que participasse do conflito a Fazenda Pública Federal: embora a discussão gire em torno da aplicação de uma ou mais normas constitucionais, agora sabemos que o político Nelson Jobim não judiciará com a isenção de ânimo e a imparcialidade necessárias para a prolação do seu voto. Sua ótica será a do interesse governamental pela decisão, interesse esse que ditará os termos da sua decisão, a sua apenas, é claro. Isto é, a governabilidade acima da Constituição. Aliás, a bem da verdade, diante dos levantamentos efetuados, apurou-se que o político Nelson Jobim coloca em pauta para julgamento de seus colegas Ministros apenas o que lhe interessa, em nome da governabilidade, apresentar e expor a julgamento. Nas gavetas do esquecimento de seu gabinete, aqueles processos de grande importância para a sociedade, com especial destaque aos processos nos quais é discutida a lisura, a validade dos atos governamentais, questões que são o objeto das ações de inconstitucionalidade. O político Nelson Jobim exibiu um comportamento errado e, a bem da verdade, ele sempre esteve no local errado. Como não há mal que sempre dure, ele está de saída, pois é o que vem declarando. Que bons ventos o empurrem para bater em retirada. Ao ensejo do fim veio de revelar aos cidadãos brasileiros a que veio e por que veio. E sendo uma pessoa que tem a soberbia como êmulo da conduta, no ocaso, não poderia deixar outra imagem senão a de alguém que insultou a cidadania brasileira e a comunidade jurídica."

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