Prisão em 2ª instância - Entrevista Maria Cláudia de Seixas

22/2/2016
Fabio Malagoli Panico

"Nos sensibilizamos com o relato do caso em que houve aparente fragilidade de provas conduzindo à prisão de um suposto inocente (Migalhas 3.805 - 22/2/16 - "Patrona da causa" - clique aqui). Mas não devemos deixar que as peculiaridades do caso em tela ofusquem as questões e princípios envolvidos. É verdade que o sistema carcerário é falido, assim como o sistema educacional e o de saúde. Com o devido respeito ao entendimento exposto, entendo que o julgamento não feriu a CF/88, que em nenhum momento condiciona o cumprimento da sentença ao seu trânsito em julgado. O inciso LVII trata apenas da presunção de inocência 'até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória', inexistindo no sistema jurídico dispositivo que relacione a presunção de inocência à impossibilidade de cumprimento de sentença penal condenatória confirmada em segunda instância. Assim, parece-me absolutamente válido e conforme a CF/88 o julgamento feito pelo STF, que certamente interpretou a norma jurídica de forma razoável - ainda que influenciado pelo anseio de Justiça buscado pela população -, não podendo se falar em julgamento 'contra legem'. Nosso país, com passos lentos, vai melhorando e assistiu no ano passado - atônito mas alegre - o início de uma grande batalha contra a famigerada impunidade que assola e dilapida nossa nação, encorajando desvios, premiando ladrões, ceifando, assim, o futuro de milhares de brasileiros. A mudança de paradigmas sempre importa traumas e natural que os criminalistas se indignem contra a posição atual do STF, mas a discussão da norma pela norma é estéril, há que se discutir valores. Se hoje deixarmos de prender porque o sistema carcerário é falido, amanhã os cidadãos poderão deixar de pagar impostos porque a escola e os hospitais também não prestam os serviços esperados. O pacto social no qual se funda nossa sociedade, diversamente dos contratos bilaterais, não admite a 'exceptio non adimpleti contractus'. Assim, embora os juízes não devam ser indiferentes à realidade, as correções sociais devem ser feitas de forma independente, sob pena de - de tanto aguardarem solução conjunta - nunca serem realizadas. A discussão sobre o momento adequado da prisão é saudável e deve ser feita pela sociedade, mesmo porque, como visto, inexiste óbice constitucional a tanto, mas se são valores fundamentais que estão em discussão, acredito que com princípios fundamentais deva ser feito o debate. Tragam-nos exemplos de outros países, falem-nos do inevitável dilema existente entre a liberdade individual (e a presunção de inocência) e a dignidade da pessoa humana no cumprimento da pena criminal em outros sistemas. É importante que avancemos como sociedade e isso passa necessariamente pela revisão de alguns paradigmas. A Constituição Federal deve ser respeitada - aliás, como está sendo -, mas para que os avanços que buscamos sejam concretizados, necessário que as instituições, dentre as quais o Poder Judiciário, dêem tratamento adequado às situações díspares com as quais são diariamente confrontadas, incentivando comportamentos desejados e penalizando aqueles contrários ao interesse comum."

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