Impeachment, cassação de mandato, renúncia, nomeação, manifestações...

1/4/2016
Leonardo Augusto Andrade

"Caro diretor, prezo muito a leitura diária de Migalhas, sempre recheado de informações de grande relevância para o mundo jurídico, sem prejuízo do bom humor e da citação de fatos curiosos e interessantes dos pontos de vista histórico e cultural. Noto, por outro lado, que os ânimos entre as diversas correntes de opinião vêm se extremando nos últimos dias, diante dos graves fatos da política e da polícia, contribuindo para a dificuldade de aceitação das opiniões contrárias às nossas. Tenho lido muitas opiniões das quais discordo nos últimos dias, vinda de pessoas que eu admiro, ou admirava a depender do teor. Dito isso, exponho respeitosamente as minhas reservas quanto às ironias que tenho lido nas últimas notas sobre Lava Jato e impeachment em Migalhas, que, na minha humilde opinião, não prestam homenagem à qualidade que caracteriza esse informativo. É compreensível que artistas, supostos intelectuais de esquerda e pessoas de outras profissões simpáticas ou não ao governo, façam afirmações imprecisas sobre fatos e institutos jurídicos. Não é compreensível, com todo o respeito, porém, que um informativo feito por pessoas da área jurídica para a área jurídica contenha tais imprecisões, que acabam mais por desinformar do que o contrário. Um exemplo claro é dizer que o STF manteve a investigação contra o ex-presidente Lula naquela Corte, quando se sabe que tal questão será apreciada apenas quando do julgamento de mérito da reclamação. O que houve até agora, sabem bem os senhores, foi o mero referendo à decisão liminar do ministro Teori, que se limitou a manter o processo na Corte Suprema até a decisão final sobre a competência para o seu julgamento. Mas, se não bastasse, o informativo ainda extrai do mero referendo de uma liminar o prejuízo a outra ação em trâmite na Corte, fazendo uma correlação canhestra entre duas questões que, com a devida vênia, não se misturam. A uma porque a reclamação ainda não foi julgada em seu mérito e, a prevalecer a postura que vem sendo adotada pelo STF (vide caso Cunha), lá deverão permanecer somente as pessoas com prerrogativa de foro, retornando as demais, inclusive o ex-presidente, à 13ª vara Federal de Curitiba. A outra, porque no MS em que funciona como relator o ministro Gilmar Mendes está em jogo o desvio de finalidade do ato de nomeação do ex-presidente como ministro, independentemente de considerações posteriores sobre a transferência de competência, a ser deliberada na reclamação em razão não da condição de ministro do ex-presidente, mas sim do envolvimento de outras pessoas com foro privilegiado. Por outro lado, lamento profundamente a adesão bovina dos setores simpáticos ao governo à tese de que ruim com eles pior sem eles. Não seria melhor defender que todos os agentes políticos envolvidos em crimes e quebras de decoro sejam igualmente punidos, cada um a seu tempo? Finalmente, não me conformo com quem afirma que Eduardo Cunha coordena o processo de impeachment. Confundir a figura institucional do presidente da Câmara dos Deputados, com as suas atribuições inerentes, com a figura de seu ocupante ocasional é uma tentativa vil de defender a manutenção do status quo, em detrimento da Constituição e das leis. Até porque, os deputados e senadores, ao participar do processo de impeachment, não agem em nome próprio, mas sim representando os seus eleitores que, em sua maioria, apoiam o processo. Por outro lado, se até pouco tempo o governo detinha a maioria no parlamento, foi só agora que perdeu essa condição que se deu conta de que estava em má-companhia? Enfim, essa é a minha humilde discordância quanto às últimas migalhas apresentadas, ciente de que, eu próprio, posso ter meu juízo turvado pelas fortes comoções do momento."

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