Piero Calamandrei

3/5/2006
Eduardo Trigueiros - escritório Newton Silveira, Wilson Silveira e Associados - Advogados

"Piero Calamandrei, grande crítico da judicância em geral e advogado perturbado com o avanço do Processo Civil, literalmente perderia o juízo se vivenciasse o momentum do sistema jurídico brasileiro. Ele, preocupado, alertava, já nas décadas de 40 e 50, que a profusão processualística não era o sinal do progresso, mas do fracasso do sistema judiciário italiano. Argumentava que os entraves de natureza processual como que engessavam o desenvolvimento natural das causas e funcionavam como armadilhas da falta de objetividade e, em especial, da sinceridade e do dever de lealdade das partes. Esta ausência de comprometimento das partes com a verdade objetiva, expondo, desde logo, os argumentos e provas, preferindo a primazia da escrita à oralidade, efetivamente encontra eco nas trincheiras da ciência processualista, que dá azo, em mãos hábeis de intenções duvidosas, à construção de verdadeiros castelos de areia jurídicos, onde tudo se debate e é submetido ao crivo do contraditório, menos o direito das partes. Não é sem tempo relembrar Calamandrei, em tempos de tão grave crise institucional por aqui, onde o Supremo faz as vezes do Legislativo e vice-versa, numa grotesca dança de interpretações processuais, tudo em privilégio da retórica, do argumento pelo argumento, da regra pela regra, tristemente dissociada do fato jurídico a que se devia destinar. Assim, grasna a confusão, a incerteza e a claudicância da prestação jurisdicional. Mas o norte segue a prumo firme: continua-se a aumentar e a remodelar o castelo de regras processuais, infelizmente em detrimento de interesses maiores, como a efetiva solução em tempo hábil das causas submetidas a julgamento. A idéia não é nova, mas quer parecer que a regra processual, no quotidiano da prática jurídica, ganhou igual ou maior importância da regra de direito a que devia regular, subsidiariamente. Ente quase que completamente autônomo, tem-se verdadeiro novo Direito, positivíssimo, não subordinado, que esqueceu suas origens e que sufoca, alimentado às custas das relações jurídicas, o andamento da vida nacional. Quer parecer que a solução não reside na pluralidade de normas, ou na sua redação, ou na sua perfeição, mas na plena ciência de que se deve relembrar que o processo cuida para que o direito seja posto e aforado, mas que não deve se contrapor a ele, sob pena de perder seu propósito."

Envie sua Migalha