PCC

17/7/2006
João Pedro Cilli David

"Convido o leitor a levantar de sua confortável poltrona, deixar a segurança do lar ou do escritório, para visitarmos um presídio. Não lhe vai exigir muito, somente umas linhas. Dê-me o braço; vamos. O lugar tem muita coisa ruim, não será positivo, argumenta o leitor reticente. Tens razão; pois poupemos a prosa e fiquemos no meio termo: imaginemos; garantimos assim a pureza do mundo do leitor e as minhas palavras, que já vão gastas... Pois cá estamos, imaginando, só imaginando... Posso avançar um pouquinho, leitor amigo? Obrigado, serei gentil. Veja, em um presídio estão todos privados da liberdade, o que é uma exceção, não? Não. Sempre digo que quem inventou as exceções, bradou, talvez com alguma arma em mãos, 'Toda regra tem exceção!', como se servisse de inspiração ao nosso showman do Ipiranga, e assim inverteu as coisas. O que não esperava o criador das exceções é que eu e o caro leitor nos debruçássemos tão profundamente naquelas palavras. Pois é o que faremos agora. Mas agora? Estremece? Não, creio que não, vamos ao profundo. Opa! Escuro, não? Toma cá, uma para o leitor, outra para mim; prossigamos. O caminho é curto, e nem é tão profundo, vire aqui, isso, pronto; vê? Pois sim, aquele criador esqueceu-se de notar um grande erro na regra que criara, talvez em virtude de alguma pressa, um namorico, um serviço de um cliente, que não pagava mal, e estaria exigindo-lhe urgência. Provavelmente, vamos de boa-fé, não conhecesse, ou soubesse mal, a nossa língua portuguesa. Criando sua regra, na verdade ele acabou criando uma exceção. Sua ruína? A trivial regra da acentuação das proparoxítonas. Não foi tão duro, foi? Expliquemos. Se a regra estivesse correta, seria a exceção de si mesma. Deixa, assim, de ser regra e passa a exceção. Sim, mas e daí? O leitor é apressado; obedeço-o. Sabemos, então, que aquela regra não merece confiança e, ademais, exagera na imodéstia. Agora veja o leitor como, por esforço de obediência, trago-o de volta ao seu mundo iluminado pelas letras jurídicas, e de lambuja chegamos a uma conclusão. Se a regra das exceções é uma exceção então, facilmente, uma exceção pode ser regra, quanto mais estejam no nosso amado país. Leitor companheiro, há outros que não nos fiam, vamos a eles. A privação de liberdade deveria ser uma exceção e nisso, além do leitor, creio que me acompanham os presos, as mães dos presos, assim como toda a família dos presos. Mas ainda somos minoria e isso, portanto, confirma a existência daquela regra? Calma lá, que lá chegaremos. Vamos, em uma só leva provaremos a nossa conclusão. Lembra o leitor quando não havia embargos infringentes? Ah, venham cá as testemunhas da criação da infringência nos até então declaratórios, dê-nos as mãos. Vamos. Opa, quem são vocês aí? Veja só o leitor, gente antiga, quando os colégios particulares eram coisa de poucos... Sejam bem-vindos. Mas veja só a multidão que nos espera para nos levar aos braços da redenção: os pagadores da CPMF! Ufa, chegamos. Enfim, regra. E os presídios? Ah, sim, o senhor leitor está confortável em casa. É melhor que fiquemos assim, não é mesmo?"

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