Lula

24/4/2019
Luiz Augusto Módolo de Paula

"Quem estuda um pouco de Direito Constitucional logo aprende as competências do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) (Migalhas 4.588 – 24/4/19 – Lula - Pena). O STJ é Corte mais voltada para a uniformização e padronização da aplicação da legislação Federal e o STF dá a última palavra sobre a aplicação da Constituição. Tirando algumas exceções é basicamente isto, como pode ser conferido nos artigos 102 (STF) e 105 (STJ) da Constituição Federal de 1988. Ou deveria ser assim. Lendo notícia da revisão da pena de Lula no STJ, ocorrida dentro de um recurso especial, eu vejo que não houve mera discussão sobre a aplicação de normas Federais nesta Corte, uma discussão sobre o Direito. Houve discussão do mérito da condenação e fatos, o que poderia ser considerada uma usurpação (com o perdão do termo) de competências constitucionais. O STJ terminou por manter a condenação de Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, mas reduziu a pena imposta pelo Tribunal Regional Federal da 4° região em apelação (TRF-4) para oito anos, dez meses e 20 dias de prisão e reduziu bastante o valor da multa e da condenação a título de reparação de danos imposta originalmente. Sim, continuo satisfeito com o desfecho de um recurso que confirma que Lula é um corrupto e lavador de dinheiro e vejo que sua situação se estreita cada vez mais. Resta a ele apenas o STF para recorrer. Mas vendo o que foi feito no STJ eu me preocupo com o desfecho do caso no STF. Isto porque, segundo tão somente o comunicado à imprensa, em diversos trechos da decisão o STJ entrou sem pestanejar no mérito e nos fatos da condenação original contida na sentença do então juiz Sérgio Moro. Vejam este trecho do comunicado: 'Em relação ao crime de lavagem de dinheiro, Felix Fischer entendeu que merecia modulação a fundamentação do TRF4 para valorar negativamente as circunstâncias e as consequências do delito. No caso das circunstâncias do crime, o ministro apontou que as manobras ilícitas descritas na ação penal são próprias do delito de lavagem de dinheiro, não sendo possível, no caso dos autos, concluir sobre a existência de sofisticação superior que justifique, nesse ponto, a elevação da pena'. Ora, não estamos falando apenas da aplicação da legislação Federal. O STJ simplesmente analisou fatos sobre a condenação de primeira instância e deu o seu entendimento sobre qual o tamanho da pena que deveria ser aplicada, analisando fatos e a fundamentação da sentença. O próprio STJ veda isto segundo uma de suas súmulas mais conhecidas, a de número 7: 'A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial'. (O STF possui súmula similar, a de n° 279, mas falando do recurso extraordinário.) Não quero cansar os amigos mas isto aparentemente se repetiu na decisão toda do STJ Ou seja, um tribunal situado em Brasília, que deveria apenas cuidar de questões de Direito sobre a legislação Federal, se debruçou sobre os fatos de uma única condenação criminal, das mais de milhares de condenações que são proferidas todo ano no Brasil. E o mesmo poderá ocorrer em breve no STF, que em tese deveria ser nossa Corte Constitucional, cuidando apenas da aplicação da Constituição. Será que uma mera condenação criminal deveria ser revista pelo STF? Veremos Lula ter sua pena ainda mais reduzida no STF ou mesmo sua absolvição, com mais análise de fatos e fundamentação de uma única sentença criminal? Eu não creio que o constituinte de 1988 tenha pretendido que o STJ e STF, que possuem pela Constituição relevantes atribuições, deveriam ser o destino final de todas as condenações criminais do país, com ministros se debruçando sobre tamanhos de penas de prisão e multa fora das competências constitucionais. Não é um poder que eles tem ou deveriam ter. Obs: minha opinião é calcada apenas com base no texto constitucional. Reputo que qualquer tentativa de ampliar competências constitucionais com base em leis ou regimentos internos de tribunais é de fato algo temerário. Serve para o caso de Lula e serve inclusive para o notório 'inquérito das Fake News' no STF."

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