Voar – Pearl S. Buck

20/11/2006
Pedro Luís de Campos Vergueiro

"O grande prazer da leitura é encontrar textos que revelam a realidade íntima que cala fundo, no bom sentido é claro, na alma de quem lê. Uma observadora arguta foi a escritora Pearl S. Buck, sobretudo no momento em que procurou transmitir sua sensação de voar num avião a jato. Assim, no seu livro ‘A Grande Travessia’, com um humor nervoso, descreveu sua sensação de ter de ir ao Japão num jato, a partir de Nova York. A breve exposição que faz sobre sua sensação de voar é um primor e, também, literalmente, uma pérola: 'Quando o jato me ergueu da terra para o céu, naquela manhã de maio em Nova York, confesso, porém, que senti um júbilo talvez único. O enorme pássaro preparou-se para levantar vôo, seus motores roncaram, o bicho estremeceu com a sua força interior. Parte desse júbilo talvez se devesse a me sentir completamente impotente à medida em que subíamos nos ares. Entregara-me à máquina. Não podia fugir, não podia descer. Não se me deparava qualquer decisão, pois não havia remédio senão subir, subir cada vez mais. Um velho provérbio chinês diz que, das trinta e seis maneiras de fugir, a melhor é correr. Não sei quais são as outras trinta e cinco – por mais estranho que possa parecer, nunca tive a idéia de perguntar, em todos os anos que vivi na China, talvez porque a resposta óbvia teria sido que as outras maneiras eram desnecessárias, de vez que a pessoa sempre pode correr. Isso, no entanto, já não é verdade, nos tempos modernos. Quando a pessoa entra num avião e a porta se fecha, não pode fugir, nem mesmo correndo. O resultado é um curioso sentimento de paz – desesperada, talvez, mas paz, não obstante'."

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